Futuro do clima depende das ações de agora

MEIO AMBIENTE

Futuro do clima depende das ações de agora

Inundações, vendavais, ondas de calor e secas prolongadas são reflexos da intensificação de eventos meteorológicos provocados pelas mudanças climáticas.

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Futuro do clima depende das ações de agora
Foto: Divulgação
Lajeado

Inundações, vendavais, ondas de calor e secas prolongadas são reflexos da intensificação de eventos meteorológicos provocados pelas mudanças climáticas. As previsões meteorológicas, especialmente no Rio Grande do Sul, estado com grande variação de temperaturas e estações mais definidas, fazem parte do cotidiano das pessoas. Seja consumindo notícias sobre o tema ou nas rodas de conversa onde o calor, o frio, a chuva são pautas permanentes. A tendência é estar cada vez mais em evidência, especialmente porque fenômenos meteorológicos tendem a acontecer com mais frequência e intensidade.

Conforme a meteorologista Maria Angélica Ferreira, análises das últimas décadas apontam que nas próximas a temperatura da superfície da terra e dos oceanos deve aumentar, além de haver derretimento das calotas polares. Os reflexos serão inundações de áreas costeiras e cidades litorâneas, alteração na frequência e intensidade de chuvas, impactando a agricultura, e eventos meteorológicos mais severos, como tempestades, vendavais, ondas de calor e secas prolongadas. Num cenário mais avançado, migração de espécies animais e vegetais em razão das condições ambientais adversas.

“Embora algumas pessoas queiram negar e não acreditar que isso vá afetá-las”, complementa. Ela destaca que as evidências são claras, comprovadas pela comunidade científica internacional. “Servem de base para o planejamento, ações e decisões que os líderes precisam tomar para salvar o clima do planeta, sem esquecer as necessidades das populações.” Muitos países já estão com ações implementadas de redução das emissões dos gases de efeito estufa, com mudanças nos sistemas de energia de combustíveis fósseis para renováveis, como solar ou eólica. “Outros estão atrasados e existem alguns que vivem um retrocesso.”

Para Maria Angélica, os governos têm de trabalhar para eliminar os combustíveis fósseis e proteger as comunidades vulneráveis e assim bater as metas propostas no Acordo de Paris. Maria Angélica destaca que o assunto é muito importante, porque impacta o dia a dia das pessoas. “Como a Terra é um sistema, onde tudo está conectado, mudanças em uma área influenciam em todas as outras. A mudança climática pode afetar nossa saúde, nossa capacidade de cultivar alimentos, habitação, segurança e trabalho.” Ela alerta que, embora o tema seja pauta de programas em rádios, televisão, jornais e até de filmes, às vezes parece que está longe da realidade. “Mas ao contrário, as mudanças climáticas e o aquecimento global já causam efeitos em diversos lugares do mundo, inclusive no Rio Grande do Sul.”

Entrevista com Maria Angélica Ferreira – meteorologista

Foto: Maria Angélica Ferreira

O que é aquecimento global?

Maria Angélica Ferreira – O aquecimento global se refere ao aumento da temperatura média do sistema terrestre que ocorre em função do aumento da concentração de gases do efeito estufa na atmosfera, que pode ser consequência de causas naturais e atividades humanas.

Qual a definição de mudanças climáticas?

Maria – O termo refere-se às mudanças de longo prazo que vem sendo observadas (ao longo das últimas décadas) e projetadas (em décadas futuras) em diversas variáveis climáticas, tais como padrões de precipitação, temperatura e vento. Estas mudanças decorrem tanto de fatores antropogênicos – causados pelo homem – quanto naturais, como variabilidade climática interna na Terra. O termo mudança climática tem um significado mais amplo, enquanto aquecimento global refere-se mais especificamente ao aumento médio da temperatura na superfície do planeta.

Quais são as principais causas da mudança climática?

Maria – As mudanças climáticas antropogênicas, ou seja, aquelas causadas pelo homem, estão associadas ao aumento da emissão de gases de efeito estufa por queima de combustíveis fósseis (dos automóveis, das indústrias, usinas termoelétricas), queimadas, desmatamento, decomposição de lixo etc.

O que é o efeito estufa?

Maria – O efeito estufa é um fenômeno natural que faz com que a temperatura da superfície da Terra seja favorável à existência de vida no planeta. Se ele não existisse, a temperatura média da superfície da Terra seria -18°C, ao em vez dos 15°C que temos hoje, ou seja, 33°C menor. Para entender o efeito estufa, pense em um ônibus parado sob a luz do sol. Os raios chegam como radiação solar visível, passam pelos vidros e aquecem o interior (calor). Esse calor (radiação infravermelha) procura sair pelos vidros, mas tem dificuldade de passar por eles. Ou seja, uma parte fica presa dentro do ônibus, aquecendo-o. O mesmo ocorre com a atmosfera da Terra. Alguns gases, como vapor d’água e gás carbônico (CO2), funcionam como o vidro do ônibus,deixando entrar a radiação ultravioleta, mas dificultando o retorno do calor para o espaço. Quando aumenta a concentração de gases na atmosfera (por exemplo, do gás carbônico), o efeito estufa fica mais intenso e, portanto, fica mais difícil o calor ir para o espaço. Essa diferença causa o aquecimento da baixa atmosfera, elevando a temperatura média da Terra e causando mudanças climáticas.

Quais continentes ou países estão à frente no combate ao aquecimento global? Por que?

Maria – Países europeus dominam uma lista, segundo o Good Country Index (Índice dos Bons Países, em tradução livre), que mede o impacto de cada país no mundo, como uma marca ecológica em relação à economia e às porcentagens de energia reutilizável utilizada. Felizmente, em todos os continentes medidas vêm sendo desempenhadas para salvar o planeta. Os três primeiros da lista são: Finlândia,Suécia e Suíça. O Uruguai é o primeiro da América do Sul na posição 25, e o Brasil está da 41ª posição.

O que os três primeiros países melhor colocados estão fazendo?

Maria – Esses países se destacam por utilizarem e incentivarem a utilização de carros elétricos, incentivo aos seus cidadãos a instalarem painéis solares e energia renovável com preços mais baixos, as sacolas e canudos plásticos foram banidos dos supermercados e bares. E quase todos os países têm compromissos governamentais de serem neutro ou chegar muito próximo em emissão de carbono até 2030 – 2050.

Por que o Uruguai tem destaque?

Maria – O Uruguai se tornou um líder global de energia sustentável. O Uruguai não possui reservas de petróleo e tinha altos gastos financeiros na importação. Em razão disso, começou a substituir combustíveis com base de petróleo pelos de energia limpa, o que foi conquistado em menos de uma década. Hoje, cerca de 95% da eletricidade vêm de fontes renováveis, a maioria de hidroelétricas, mas também de energia solar, eólica e bicombustíveis. O transporte público (a maior parte dele mantido por eletricidade) pode ser encontrado nas grandes cidades. O Aeroporto Internacional de Carrasco, na capital de Montevidéu, também está próximo de ser totalmente sustentável com uma instalação de energia solar fotovoltaica — será o primeiro país da América Latina a ter essa estrutura.

No Brasil, o tema é uma prioridade?

Maria – O tema é uma das prioridades do atual governo, tanto que anunciou uma ampliação da meta de redução de emissão de gases de efeito estufa. A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, falou que amplia de 37% para 48% a meta brasileira de redução de emissões até 2025 e de 50% para 53% até 2030. Segundo ela, não basta zerar o desmatamento para resolver a questão da mudança do clima. O mundo requer uma transição energética mais ampla. Além disso, em 2021, o Brasil ainda se comprometeu a alcançar emissões líquidas neutras até 2050, ou seja, tudo que o país emitir deverá ser compensado com fontes de captura de carbono, como plantio de florestas, recuperação de biomas ou outras tecnologias.

Quais seriam as ações necessárias nas esferas nacional, estadual e municipal?

Maria – Algumas ações governamentais são necessárias para diminuir a emissão de gás carbônico, como: políticas governamentais mais rígidas para o controle da emissão de gás carbônico; implantação de energia renovável; incentivo a alternativas de transporte e a veículos menos poluentes; incentivo ao reflorestamento; redução do desmatamento e queima das florestas; incentivo à agricultura sustentável e à diminuição do uso de agrotóxicos.

Qual o maior desafio brasileiro?

Maria – Frente a essas possíveis ações do governo para diminuir a emissão de CO2, um dos grandes desafios para o Brasil é conter o aumento das queimadas. Um dos maiores desafios do MMA, e que interfere diretamente na questão das mudanças climáticas, é o desmatamento. Quando olhamos para os biomas, especialmente para a Amazônia, o desmatamento tem um papel preponderante nas emissões brasileiras. A Amazônia sozinha representa 77% das nossas emissões no setor de mudança de uso da terra. Essas emissões, 92% estão diretamente associadas a alterações de uso da terra, que transformam a floresta em agropecuária. Então, de fato, combater o desmatamento é a maneira mais barata e eficiente de reduzirmos as emissões brasileiras de gases de efeito estufa. No setor industrial, algumas empresas estão se adequando as normas mais “amigas do meio ambiente” com programas de tecnologias limpas, mas ainda temos um longo caminho a percorrer.

CIDADÃO PODE COLABORAR

A solução para as alterações climáticas não depende apenas de grandes pactos internacionais ou dos governos de cada país, é preciso mudar os hábitos e costumes no dia a dia. “É claro que uma pessoa só não faz a diferença, mas o conjunto faz. Pequenas mudanças no nosso cotidiano podem ajudar”, afirma Maria Angélica.

• Evite o uso do plástico.

• Busque formas alternativas aos combustíveis fósseis.

• Mude o meio de transporte – deixe o carro em casa e caminhe ou pedale sempre que possível.

• Se a distância for muito grande, opte pelo transporte público.

• Controle do consumo de água e energia – apagar a luz quando sair do quarto, fechar a torneira enquanto escova os dentes.

• Consuma produtos sustentáveis e de origem local – além de estimular a economia local, o consumo de produtos locais reduz as emissões de carbono gastas no transporte dos produtos.

• Plante árvores e ajude a restaurar áreas degradadas. As árvores ajudam a sequestrar o carbono emitido pelas indústrias. As áreas verdes são muito importantes para reduzir as temperaturas máximas. As árvores trazem sombra e frescor ao ambiente próximo a elas, sem gasto de energia (como ocorre com um ventilador ou ar condicionado).

• Reduza a geração de resíduos e estimule medidas de reciclagem. Estas ações diminuem a poluição e a emissão de gás metano, muito comum em áreas de aterros sanitários.

• Faça compostagem do lixo orgânico, separe o lixo reciclável e dê destino correto a pilhas, remédios, eletrônicos, etc.

SAIBA MAIS

• O Brasil é o único país que fabrica automóveis flex, ou seja, que funcionam com álcool ou gasolina. O álcool é menos poluente do que a gasolina, dê preferência a esse combustível.

• No Brasil, 58% das emissões de gases de efeito estufa são provenientes de queimadas e desmatamento.

• Desde 1950 vimos que os El Niño e os La Niña mantiveram a frequência, mas aumentaram intensidades e efeitos. É uma combinação preocupante, porque a mudança climática mais essas variabilidades naturais se combinam e podemos ter eventos extremos.

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