Desejo de ser mãe supera limitação física

Teutônia

Desejo de ser mãe supera limitação física

Paraplégica desde criança, Patrícia Azevedo é um exemplo de superação. Com esforço, se profissionalizou e entrou no mercado de trabalho. Mas a maior conquista, de ser mãe, ela comemora todos os dias.

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Desejo de ser mãe supera limitação física
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Um trecho da canção de Humberto Gessinger fala que “a medida de amar, é amar sem medida”. Embora a frase esteja atrelada a outro sentido na música, pode ser relacionada ao sentimento de ser mãe.

No caso da teutoniense Patrícia Azevedo, 30, é o resumo da realização de um sonho que muitos julgaram impossível. Paraplégica, desafiou a medicina como a primeira gestante em cadeira de rodas da cidade e a cada dia comemora o maior presente que a vida lhe deu. A filha Vytória nasceu sem deficiências, completou 4 anos em fevereiro.

Patrícia, quando tinha 4 anos, sofreu um acidente enquanto brincava na frente de casa. Os médicos identificaram lesão na medula. Entre olhares de pena e de indiferença, estabeleceu metas e se desafiou. Ignorou as pechas colocadas sobre ela, e buscou sentido na vida.

Na escola, contou com a atenção de professores e amigos. Concluiu o Ensino Médio na escola Reynaldo Affonso Augustin e em seguida ingressou no curso técnico em Administração. Os diplomas funcionaram como estímulo para ir além.

Contra o preconceito e a negatividade daqueles que lhe tratavam como vítima, arrumou um emprego em um posto de saúde. Independente, sentia a falta de algo. No caminho para o trabalho, pensava. Enquanto passava pelas ruas esburacadas, percebeu que chegara a hora de uma nova conquista: ter uma família.

Sobre o ex-noivo, evita comentar. Sente gratidão por ele ter lhe dado a Vytória. Nos meses em que estiveram juntos, reforçava o desejo de ser mãe, de ter a sensação de carregar um bebê na barriga. Procurou informações no hospital, pesquisou na internet sobre gravidez de mulheres em uma condição semelhante à dela.

Tudo com o máximo de discrição. Mantinha a história como segredo. Aos 27 anos, sentiu-se mal e foi encaminhada ao Hospital Ouro Branco. A irmã suspeitava que fosse gravidez. O médico plantonista solicitou o exame e ficou pasmo com o resultado: positivo.

Quando a notícia chegou aos familiares, as dúvidas e medos surgiram como uma tempestade. Patrícia ouviu todos, mas a felicidade era maior. O primeiro médico obstetra que ela procurou se negou a acompanhar o caso. Ele sugeriu que ela procurasse um colega de Porto Alegre. Na consulta, o alívio. O profissional alertou sobre os riscos para ela e para o bebê, mas apostou no sonho de Patrícia e disse que o pré-natal poderia ser feito em Teutônia.

Com o acompanhamento concomitante entre Teutônia e Porto Alegre, teve um gravidez sem sobressaltos. O feto crescia conforme o esperado. Os desconfortos, como enjoos e dores, eram o preço a ser pago. Sentir a filha se mexendo no útero fazia esquecer as incertezas.

Emoção sem tamanho

Faltando uma semana para completar nove meses de gestação, no dia 28 de fevereiro de 2012, por meio de cesárea, nasceu Vytória. Depois do parto, a primeira pergunta da mãe era se a filha estava bem.

No âmago, temia que a criança tivesse algum problema. Com alegria, o médico contou que a menina nasceu chutando. A emoção de ter uma filha sem qualquer deficiência transbordou. Foi impossível conter as lágrimas.

Em casa, os primeiros meses mudaram a rotina da família. Amamentar, trocar fraldas e dar banho exigiram tempo e adequações. A mãe de Patrícia ensinava e contribuía com a experiência adquirida ao criar três meninas.

“Quando você vai poder caminhar?”

Certo dia, ao retornar da escola, Patrícia notou que a filha estava triste. O semblante abatido estava carregado de dúvidas que trouxe da escola, depois de conversar com colegas. “Perguntei o que havia acontecido e ela me respondeu: “Quando você vai sair dessa cadeira? Queria que você pudesse sair”. A pergunta inocente, porém certeira, atingiu a mãe. A resposta pairou entre a razão e a emoção: “A mãe ficará pra sempre nesta cadeira, mas sou feliz assim. Não precisa ficar triste. Você me faz feliz todos os dias.”

Como explicar a diferença

Com a filha, Patrícia optou sempre pelo diálogo. Desde os primeiros anos, explicava o porquê de não poder caminhar. Quando Vytória começou a andar, a relação foi se estreitando cada vez mais. “Quando ela queria ir longe, eu chamava e ela já retornava. Quando ela começou a correr, foi um pouco mais difícil, mas sempre lembro que não posso fazer o mesmo.”

A segunda-feira é o único dia em que Patrícia busca a filha na escola. No retorno, param em uma praça. “Hoje ela entende muito mais e obedece. Quando saímos na rua, ela vai cuidando onde tem rampa e onde não tem. Acaba me ajudando.” A relação entre as duas se fortalece a cada dia. Vytória esbanja alegria. Dançar e fazer fotografias com a mão é o que mais gosta.

Acompanhamento na saúde pública

O Ministério da Saúde lembra que, apesar dos mitos e preconceitos sobre o assunto, mulheres com deficiência física, visual, auditiva ou intelectual também podem engravidar. Como toda mulher, os cuidados devem começar logo após a notícia da gravidez, durante o pré-natal. É nessa fase que o médico definirá os procedimentos mais adequados a cada caso, respeitando as peculiaridades de cada paciente.

O SUS está preparado para acompanhar todo o processo de gestação dessas mães. Do acolhimento e orientação ao casal até o momento do parto. Durante a gestação, também são realizados exames de avaliação do desenvolvimento do feto e da saúde materna.

O acompanhamento do bebê e da mãe não termina no nascimento. Ele segue durante os primeiros meses de vida da criança, incluindo o acompanhamento à saúde da mãe.

O procedimento durante a gestação de uma grávida com deficiência segue o mesmo fluxo de qualquer gestação, sendo eles: pré-natal de risco habitual ou de alto risco. Em cada um dos casos, o médico que acompanha a gestação é quem define os procedimentos a serem seguidos.

As orientações são particulares a cada gestação independente da deficiência, que neste caso, é considerado apenas como uma condição a mais a ser observada, mas que não significa obrigatoriamente gravidez de risco.

No caso de mulheres com deficiência de ordem genética, são recomendados exames complementares. Já para mulheres que fazem uso de cadeiras de rodas a orientação é que durante a gravidez possa ser acompanhada por outros profissionais como fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais que a auxiliem na realização de exercícios terapêuticos e reordenação das atividades cotidianas, visando atenuar, por exemplo, problemas circulatórios.
A realização do parto cesariana só é recomendada quando representar maior proteção à saúde da mãe e do bebê.

Família de bebê abandonado quer a criança de volta

Moradora do bairro Sete de Setembro deixou filho em uma lixeira horas depois do parto em casa

A Polícia Civil encontrou a mulher que largou o filho recém-nascido em uma lixeira no centro. O fato ocorreu no dia 27 de abril e comoveu a comunidade do Vale do Taquari. A criança estava enrolada em um cobertor e foi encontrada por uma vizinha da mãe. O delegado aguarda por parecer médico para avaliar as condições psicológicas da mulher de 41 anos, que tem outros cinco filhos.

João Alberto Selig, da PC de Roca Sales, conta que a polícia verificou listagens de mães grávidas. Todas foram visitadas. “Foi assim que chegamos até a mãe do menino. Ela aparentava problemas psicológicos. Parecia em choque. Não demonstrou arrependimento. Ao contrário do companheiro dela, que pediu o filho de volta”, comenta.

Ele conta como teria ocorrido o abandono. “Ela teve o filho durante a madrugada, sozinha, dentro do banheiro de casa. Cortou o cordão umbilical com uma tesoura. Depois, ficou com o bebê no sofá, até amanhecer.” O companheiro dela, e provável pai da criança – os outros cinco filhos são frutos de outro relacionamento –, saiu por volta das 5h daquela quarta-feira para trabalhar. Aos policiais, disse que não sabia do nascimento e tampouco percebeu a criança com a mulher.

Logo após a saída do companheiro, ela também saiu de casa. “Caminhando a esmo com a criança no colo”, conta o delegado. Passou em frente ao Conselho Tutelar, mas não entrou. “Ela nos disse ter ouvido uma voz, que mandava abandonar o bebê.” Foi o que ela fez, escolhendo uma lixeira próxima a uma creche, pois “achava que ele logo seria encontrado.”

A caixa onde a criança foi deixada junto de um cobertor foi adquirida pela mãe em uma farmácia, enquanto ela caminhava com o filho no colo pelas ruas. Selig informa ainda que ela teria voltado, cerca de 15 minutos depois, até a lixeira. “Mas disse que já havia uma pessoa com o menino no colo, e então decidiu ir embora.”

A mulher, que está afastada por licençasaúde, mas já atuou como agente de saúde e também em uma creche municipal, foi encaminhada pela PC para uma perícia médica. Se ficar provado que tem qualquer tipo de doença ou distúrbio, poderá ser inocentada de qualquer crime contra o próprio filho. “Mas se isso não se comprovar, ela será enquadrada por abandono de incapaz”, garante o delegado.

Em alguns segundos, o arrependimento

A mãe está em acompanhamento psiquiátrico. Com os olhos marejados e a voz trêmula, a avó materna da criança expressa tristeza. Conta que a filha se arrependeu logo que largou a criança. “Disse que não tinha completado a quadra e voltou correndo, arrependida, mas uma mulher já estava levando o bebê.”

O fato abalou a família. Segundo a avó, os xingamentos sofridos em redes sociais só aumentam a dor. “Minha filha criou e educou os cinco filhos sem nunca deixar faltar nada. Quem são eles para falar?”

Em defesa da filha, afirma que há um grave problema psiquiátrico. “Sofro porque ela sempre foi uma pessoa boa, honesta e trabalhadeira (sic)”, diz. Conta que passaram dificuldades para criar os filhos e nunca receberam ajuda. “Nem um quilo de comida. Ao contrário, ela ajudava as famílias, lidava com os problemas deles e ajudou muita gente em seu trabalho. Ela está fora de si.”

Fala sobre os boatos criados e que isso atingiu as crianças da família. “Não sabemos como agir com elas. Temo por elas no colégio.” Segundo a avó, é preciso acompanhar as crianças na rua, pois temem ser agredidas e já sofreram xingamentos.

Estão com medo e tristes. Diz que os menores perguntam porque os vizinhos estão bravos com eles. “A menina de nove anos sabe ler o que escreveram da mãe dela no Facebook. Minha filha é uma pessoa justa e o que o povo esta fazendo com ela é injusto. Sabe lá quantas vezes eu julguei também, mas tem que se colocar no lugar da família.”

A avó diz que quer o neto de volta. Conta que a família já estava reunindo roupas e utensílios que a criança precisa. “Queremos o bebê e estamos fazendo de tudo para tê-lo. Aqui em casa não vai ter Dia das Mães. Vai ser a data mais terrível.”

Avós maternos podem ter a guarda

Advogado de defesa da mulher que abandonou a criança, Márcio Arcari afirma que a sua cliente “não pode, nem deve” prestar depoimento. Arcari ingressou na Justiça pela Comarca de Encantado para pleitear a guarda do bebê para os avós maternos.

“O pai também quer a guarda, mas não será possível agora, porque está morando com a mãe.” O advogado afirma que o vínculo biológico da mãe pesa muito em uma decisão judicial e, devido ao calor dos fatos, tudo é muito recente para que ela queira a guarda neste momento.

Arcari diz que nos próximos 20 dias o juiz deve marcar audiência com os avós para julgar. “Aguardamos a decisão da aguarda para os avós, ao invés de deixar a criança em um orfanato.”

“A depressão atinge a todos. Indiferente da posição social”

A psicóloga Márcia Werner, natural de Roca Sales, avalia os motivos que levam uma mãe a ter aversão ao filho recém-nascido. Para ela, é impossível determinar um motivo central. Na opinião de Márcia, diversos aspectos podem levar uma mulher a abandonar o filho.

A Hora – Qual tipo de transtorno pode fazer uma mãe ter aversão ao filho?

Márcia Werner – O mais comum é a depressão pós-parto. É um processo de depressão, tal qual outros tipos, que pode ocorrer depois do nascimento. Há casos em que esse transtorno aparece antes mesmo do parto. Porém, nem sempre perceptível e que pode resultar no abandono, na aversão ao bebê, e, em situações mais graves, com o homicídio da criança. Nesses casos, fica mais evidente que se trata de um surto psicótico.

A Hora – Quais os motivos que podem levar a mãe a abandonar ou matar o filho?

Márcia – São diversos fatores. A depressão atinge a todos. Indiferente da posição social. Entendemos que uma doença mental, que qualquer pessoa tenha, independente ser mãe ou não, consideramos como multifatoriais. Têm fatores genéticos associados, ambientais, de educação, de aprendizado, de vivências, perdas, lutos anteriores.

A Hora – E para os outros filhos, isso pode causar sofrimento?

Márcia – Sim. Elas tendem a ser afetadas por esse fato. De que forma vão ser afetados, não temos como definir. Mas o que se sabe em estudos do trauma na psicologia é que por mais que as crianças que vivenciam situações, a forma com que cada uma vai lidar com essas experiências é muito diferente. Elas podem desenvolver um problema psicológico, assim como outra pode passar pela mesma vivência e não sofrer.
O ideal nesse caso é que a família tenha um acompanhamento das instituições públicas. Com o Conselho Tutelar, os serviços de Saúde e Assistência Social, que acompanhem as crianças, o desenvolvimento delas e, em especial, essa mãe.

A Hora – Do ponto de vista da reação da sociedade, vimos que desde a primeira matéria publicada sobre o abandono do bebê, a maioria dos comentários criticava a mulher. Esse julgamento interfere de que forma nesta família?

Márcia – Na nossa sociedade, a gente tem muito forte a ideia de que existe um instinto materno. E não é isso. Autores já demonstram que a mulher aprende a ser mãe. Inclusive algumas optam por não ser, e ainda hoje vemos o julgamento de outros que apontam que há algo errado com essa mulher. Quando não tem nada de errado, é simplesmente uma escolha.  A maternidade é um processo difícil. Não é algo tão natural, tão instintivo, tão belo quanto nos mostram. Evidente que é maravilhoso, evidente que tem esse lado. A gente percebe que muitas mães se realizam, que 0famílias se completam. Só que tem mulheres que não. Quando se fala da maternidade só se fala o que tem de bom. Não se fala sobre as dificuldades. Amamentar não é tão simples, causa dor. Por outro lado, felizmente, temos cada vez mais espaços para que as mulheres possam trocar experiências e falar disso. Outra situação, o peso que recaí sobre a mulher. Qual a participação do pai? Que convivência existe nesse lar? Isso é algo que é preciso problematizar. Na sociedade atual, se exige mais participação do pai.

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