Aprovadas em concurso reagem contra terceirização no ensino

POLÊMICA EM LAJEADO

Aprovadas em concurso reagem contra terceirização no ensino

Classificadas para ocupar vagas prometem ingressar na Justiça para garantir chamamento por parte do Executivo de Lajeado. Contrato com empresa privada estipula até 350 vagas para assistentes educacionais e investimento de até R$ 20 milhões por ano. Município afirma que tem previsão para nomear novas servidoras e que serviço adicional fora do quadro efetivo tem caráter urgente para atender crianças com necessidades especiais

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Atualizado sexta-feira,
10 de Março de 2023 às 12:26

Aprovadas em concurso reagem contra terceirização no ensino
Governo afirma que estão previstas nomeações para monitoras de ensino. Como ano letivo começou faz menos de um mês, momento é de ajustes nas turmas. Crédito: Filipe Faleiro
Lajeado
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O contrato com a empresa Arki Serviços para oferta de assistentes educacionais à rede municipal de Lajeado provoca reação de aprovadas no concurso público para os cargos de monitoras. Tanto que um grupo delas esteve na câmara de vereadores nessa terça-feira para alertar os parlamentares sobre a contratação de terceirizadas.

A seleção para servidoras ocorreu no segundo semestre do ano passado e a homologação dos resultados ocorreu em 20 de outubro. O edital previa duas vagas para monitoria de ensino e formação de cadastro reserva com duração de dois anos, prorrogável por igual período. Ao todo, são 156 pessoas aprovadas no concurso.

Menos de um mês antes do resultado, em 22 de setembro, o Executivo assinou o contrato de prestação de serviço das assistentes educacionais após licitação. O acordo prevê até 350 contratações por esse formato, com seleção feita pela Arki, em que o custo máximo ultrapassa os R$ 20 milhões por ano. O contrato tem validade de 60 meses.

“Estamos na expectativa de sermos chamadas. Essas nomeações costumam iniciar em janeiro e fevereiro, para se ter o quadro fechado de monitoras. Passou o tempo, e percebemos que havia pessoas reprovadas no concurso que estavam começando nas escolas”, diz uma educadora que pediu para não ser identificada.

De acordo com ela, na crença de que seria uma das convocadas, inclusive fez os exames adicionais, como o pré-câncer, laboratoriais, eletrocardiograma, exigidos para começar na função pública. “É muito corrido, quando a administração chama, temos 15 dias para apresentar tudo. Assim como eu, muitas se anteciparam para deixar tudo pronto. Só que esses exames têm seis meses de validade.”

Desde o reinício do ano letivo, em fevereiro, a Secretaria de Educação (SED) solicitou a contratação de 270 profissionais para atuar tanto no Ensino Infantil quanto no Fundamental por meio da terceirização.

Quanto às nomeações das aprovadas no concurso, a Secretaria de Educação chamou nestes primeiros meses cinco monitoras. Três aceitaram a função e estão no quadro. De acordo com a secretária, Adriana Vetorello, haverá mais chamamentos. Os trâmites estão em curso e o número total de uso do Cadastro Reserva está em análise.

Custo de R$ 1,3 milhão por mês

O pagamento unitário por cada contrato pela Arki alcança R$ 4,8 mil por mês para um expediente de 30 horas semanais. Neste montante, estão a contribuição de 20% para o FGTS, férias, 13º salário e contribuição à Previdência. Na folha de pagamento de fevereiro, as profissionais terceirizadas receberam o valor líquido em torno de R$ 1,6 mil. Ao somar os 270 contratos, o valor pago pelo município alcança R$ 1,3 milhão por mês.

Conforme o Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Lajeado, o custo mensal de uma monitora de ensino concursada (também 30 horas semanais) para os cofres públicos é de quase R$ 2,7 mil. Contabilizados o regime de previdência, 13º salário, férias e vale-alimentação. No contracheque, a monitora do quadro permanente recebe R$ 1,9 mil.

No ano passado, alteração em lei federal possibilita o uso de até 70% do repasse aos municípios pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) para custeio de salários para servidores efetivos de ensino. “A terceirização sai de recursos do próprio município. Para concursados, haveria um custo menor. Isso tudo interfere e traz muitas dúvidas”, avalia a presidente do sindicato, Patrícia Rambo.

“Não podemos nomear alguém para deixar sentado”

Para a secretária de Administração, Elisângela Hoss, comparar o custo entre concursado e terceirizado é injusto. “Quando ocorre uma nomeação efetiva, esse servidor vai ficar 30 anos no município. Depois mais 30 como aposentado. É um acordo para a vida toda. São cálculos diferentes”, condiciona.

Por isso, não é possível apenas olhar para o vencimento, frisa. “Caso feche uma turma, o que vamos fazer? Não podemos nomear alguém para deixar sentado. Sem algum atividade. Também não é possível colocar essa servidora em uma função administrativa, por exemplo. Ela fica vinculada ao cargo que fez o concurso.”

Elisângela defende que o momento é de correção dos fluxos dentro da rede municipal. Por isso, o governo avalia os cargos e cada necessidade das escolas. “Havendo comprovação, vamos solicitar a nomeação do cadastro reserva.”

“O ano começou e o quadro estava completo”

As monitoras aprovadas criaram um grupo para troca de informações. Entre ela está a moradora do bairro São Cristóvão, Josiane Johann Ribeiro. “Eu fiquei lá embaixo no cadastro reserva, não me importo se vou ser chamada”, afirma.

No entanto, critica o fato do Executivo ter privilegiado os contratos terceirizados antes de chamar aprovadas no concurso. “Não está certo isso. Tem meninas que se prepararam. Ficaram ali, entre as dez melhores. Investiram tempo e dinheiro com o desejo de entrar no serviço público. Algumas até tiveram de aceitar trabalhar como terceirizadas.” A inscrição no concurso para monitor de ensino custou R$ 90. No ano passado, Josiane atuava na rede municipal de Lajeado por contrato emergencial.

Com a exoneração em dezembro, alega que as direções das escolas estavam fazendo um cadastro de quem teria interesse em continuar por meio do contrato com a empresa Arki. “Achei estranho isso. O que me surpreendeu foi depois. O ano começou e o quadro estava completo. Isso trouxe muita insatisfação.”

Tanto que o assunto foi levado ao Ministério Público e à Defensoria Pública. Conforme o promotor Sérgio Diefenbach, esse tipo de reclamação sobre conduta administrativa é recorrente no Vale do Taquari. “O que se pode fazer é a análise da legalidade dessas contratações. Nada impede também que algum candidato prejudicado leve essa discussão ao Poder Judiciário.”

Pelo menos 80 exonerações

Segundo ela, houve pelo menos 80 exonerações de monitores de ensino do quadro efetivo no fim do ano passado. Pela lei, o município não pode manter trabalhadores que fecharam o ciclo de trabalho em repartições públicas caso tenha aposentadoria pela Previdência Social (INSS). Já no estatuto dos servidores de Lajeado, no artigo 56, há os critérios de vacância de postos públicos. “A exoneração é um dos casos. Se o cargo ficou vago, precisa ser ocupado por servidores concursados.”

Na avaliação de Patrícia, em caso de existir vagas de sobra, a administração decide como proceder. Quando se trata de uma reposição, da chamada vacância, os cargos abertos devem ser priorizados para quem passou pela seleção pública. “Neste aspecto, as aprovadas estão cobertas de razão.”

Em cima disso, a dirigente teme perda de qualidade no serviço público pela exigência de formação. No edital do ano passado, um dos critérios é a exigência de pelo menos ter formação no Curso Normal, antigo Magistério. Para a terceirização, é preciso comprovar matrícula em alguma licenciatura.

“O terceirizado se matricula hoje na universidade e amanhã está na sala de aula. Há um longo caminho entre começar o curso e estar pronto para trabalhar”, destaca.

Alta rotatividade

A saída de monitores da rede municipal é uma tônica todos os anos, afirma a secretária Adriana Vetorello. “A função de monitor tem muita rotatividade. Inclusive a supervisão escolar entende que muitos destes profissionais não se vinculam a escola ou aos alunos, o que compromete o trabalho pedagógico.”

Segundo ela, muitos monitores ingressam no quadro para depois fazer um concurso para professor. “A cada início de ano letivo, recebemos exonerações. Profissionais saem da rede, vão para outros municípios. Esse é um problema que angustia as escolas e desafia a gestão, pois precisamos recolocar esse profissional de maneira imediata. Se for só por concurso, haverá morosidade.”

De acordo com ela, no ano passado todos concursados em cadastro reserva foram chamados. Também foi aberto um edital para contrato emergencial. “Agora temos uma nova lista, que também vai ser chamada. Mas é algo recente.” O ano letivo na Educação Infantil começou em 6 de fevereiro, enquanto no Fundamental foi dez dias depois, em 16.

“Temos pais ainda fazendo matrículas. Alunos com laudo médico entrando quase todos os dias. Não teria por que nomearmos para trabalhar só em dezembro e depois dar férias. Temos muita responsabilidade com as verbas públicas. Primeiro temos de saber qual será a demanda do ano, para depois chamar.”

Atendimento específico

As terminologias, monitor ou assistente educacional, representa funções quase iguais, admite a secretária de Educação, Adriana Vetorello. Ainda assim, afirma, a decisão de preencher vagas com terceirizados tem critérios distintos.

Parte da demanda de alunos com necessidades especiais. Na rede municipal, afirma que o total de alunos com laudo médico passa do número de contratos terceirizados. As condições de saúde dessas crianças passa por espectro autista, hidrocefalia, paralisia infantil e outros quadros.

A partir do relatório de matrículas, a rede municipal tem 102 alunos do Ensino Infantil com alguma necessidade especial. No Fundamental, são 234. Para esse atendimento, é necessário um profissional em específico, diz Adriana. “Não temos por que colocar um efetivo para fazer trabalhos que são transitórios. Esse aluno com laudo, muitas vezes deixa a rede. Vai para outra escola, ou mesmo para outra cidade.”

Por isso, diz, o município optou pelos contratos via Arki, por haver mais agilidade em preencher o posto, sem a obrigação de vinculação vitalícia, como é o caso do quadro efetivo. Outros aspectos também dizem respeito a necessidade de substituir educadores nos horários de almoço (são previstos 15 minutos por lei), atendimento durante hora/atividade dos efetivos, além dos afastamentos temporários por questões de saúde ou faltas injustificadas.

O supervisor da Arki em Lajeado, Márcio Nascimento, reafirma que os critérios para contratar as assistentes educacionais partem da instrução, de conhecimentos sobre o ofício e, no mínimo estarem matriculadas em pedagogia. De acordo com ele, das 270 vagas preenchidas, cerca de 70% estão em trabalho exclusivo para crianças com alguma necessidade.

Suspeita na câmara

O vereador Jones da Silva, o Vavá (MDB), ingressou com um requerimento pedindo os nomes das 270 contratações por meio da Arki. De acordo com ele, o motivo é apurar se houve algum apadrinhamento político. “Não podemos afirmar. É uma suspeita. Por isso é preciso checar.”
A solicitação foi encaminhada à Secretaria de Administração. “Queremos saber quem são, qual a formação, pois se trata de um contrato de R$ 20 milhões.”

 

Na sessão dessa terça-feira, grupo de aprovadas protestou contra formato de contratação feito pelo município. Crédito: Jaqueline Backes/Câmara

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