Nascem 215 poetas

Jovens Poetas de Lajeado

Nascem 215 poetas

Projeto nascido faz 23 anos, o Jovens Poetas de Lajeado, se consolida como a maior expressão literária produzida por estudantes de Lajeado. Realizado pelo Rotary Club Lajeado-Engenho, a iniciativa desperta o interesse pela leitura e pela produção da palavra escrita

Por

Nascem 215 poetas
Vale do Taquari

Mais do que estimular a escrita e o contato com a arte, a poesia tem outro poder: expressar pensamentos e ideias, liberando pressões e servindo como refúgio para os sentimentos e mentes inquietas. Há 23 anos, o Rotary Club Lajeado-Engenho tinha Ana Cecília Togni como presidente.

Em 1996, um dos companheiros que assumia a avenida de serviços profissionais dentro clube, lembrou de uma das filhas. Ela gostava muito de escrever. Esse integrante do clube, diz Ana, teve a ideia de criar um projeto para abrir aos jovens oportunidades de escrever poesias. Assim, os dois sentaram com os membros do Rotary na época, e escreveram o projeto Os Jovens Poetas de Lajeado que, até hoje ocupa lugar notório nas escolas.

“Naquele primeiro ano, fazíamos tudo. Líamos, selecionávamos as poesias, e cotizávamos entre os integrantes do clube um valor para viabilizar o projeto”, lembra.

Ana Cecília Togni

Depois de coordenar muitas edições do livro, Ana lembra como a publicação começou. Nos primeiros anos, eram 16 escolas inscritas. Ao longo dos anos, passou a abrigar poesias de cada vez mais colégios de Lajeado, e hoje são cerca de 35, entre públicas, municipais, estaduais e privadas.

A partir do início dos anos 2000, Ana lembra que o Rotary notou que nas séries iniciais não eram as crianças que escreviam seus poemas. Isso exigiu mudança no projeto. Hoje ele funciona de modo que as crianças do 1º ao 4º ano criam o desenho que abre a página da escola, e as do 5º ano em diante escrevem as poesias.

“Nosso objetivo é que esse tema seja trabalhado nas escolas, e as poesias seja feitas neste meio”, conta.

Mesmo com o sucesso de edição em edição, ainda faltava algumas entidades sociais que não eram incluídas. Hoje também são publicadas poesias de alunos da Apae, Eja e do presídio, alunos do Neja Liberdade.

“Isso aconteceu porque pensamos na inclusão. É lindo ver a gratidão deles por estarem participando”, lembra. Como voluntária da Apae faz 20 anos, ver as poesias de cada criança publicada no livro é um dos maiores orgulhos de Ana.

Com o passar tempo, com tantas escolas participando, o livro deixou de ser um projeto artesanal, com o apoio do poder público e da Gráfica Cometa, que fazia a edição e as impressões. Quando surgiu a editora da Univates, o Rotary fez parceria com a instituição, que passou a editá-lo. Isso faz quase duas décadas. Neste ano, na 23ª edição, o projeto passou para as mãos do Grupo A Hora, responsável pela edição e revisão. Trabalho feito como apoio cultural.

“Penso que esse projeto é importante, porque em um mundo conturbado em que estamos vivendo, os jovens têm sentimentos puros e doces. O livro faz o resgate dos sentimentos que estão no coração, na alma e no convívio familiar desses alunos”.

Ana conta que para cada um que tem seu livro publicado, a noite de lançamento tem um sentimento especial de alegria, integrando as famílias com a vida dos alunos, igualmente felizes.

Esse projeto já ultrapassou as fronteiras do estado, servindo de espelho para um clube dos Campos dos Goitacás, no Rio de Janeiro.

Palavra do Coordenador

A cada ano, um rotariano fica responsável por coordenar o livro Os Jovens Poetas de Lajeado, e nesta última edição, o coordenador foi Ronaldo Zarpellon. Em seu texto para compor a abertura do livro, ele escreve:

“Ao completar a 23ª edição do projeto Os Jovens Poetas de Lajeado, quando os valores da ética e bons costumes estão distorcidos devido ao baixo índice de escolaridade em nosso país, sentimos que, aqui no Vale do Taquari, estamos no caminho certo, incentivando pais, alunos e professores a participar efetivamente deste belo projeto que atinge além de fronteiras do Vale do Taquari e do Rio Grande do Sul”.

Este ano, a solenidade de entrega dos livros foi realizada no Teatro do Colégio Alberto Torres, no dia 9 de novembro.

Jurema de Oliveira

Fonte de expressão

Subindo pelas escadas do Colégio Estadual Presidente Castelo Branco, se é recebido pela orientadora educacional, Jurema Ferreira de Oliveira. Conta que a escola já participa do projeto há anos, e que os professores de linguagens sempre são os responsáveis por trabalhar o gênero e a escrita em sala de aula.

“O professor faz um trabalho em sala de aula para que todos possam construir as poesias que passam por uma seleção do comitê de professores e equipe diretiva.”

Jurema avalia que geralmente com tema livre, os alunos criam suas poesias em meio aos sentimentos e aos momentos em que a sociedade vive, e este ano, muitos deles escreveram sobre a paz.

“Ao longo dos 13 anos em que estou aqui na escola, tenho percebido que os alunos gostam muito de escrever. É onde eles expressam seus sentimentos e despertam interesses por outros gêneros textuais. A escola é o melhor lugar para que isso aconteça”, lembra.

Um exemplo dessa identificação com a poesia é a aluna do 1º ano do Curso Normal, Júlia Gabriele Stacke, 16. Ela conta que seus versos falam de amor e saudade, e que essa ideia veio-lhe à cabeça em uma das idas até a casa do pai. “Nós temos um cavalo, e quando eu caminho com ele, ou simplesmente o observo, parece que o silêncio ou o entendimento dele me inspiram. Muitas vezes eu logo anoto no caderninho, mas algumas delas eu apenas gravo no celular”, lembra.

Desta vez, seu poema revive memórias da avó, com quem ela tinha laços muito fortes e que faleceu há cerca de 3 anos. Júlia conta que sempre sentiu saudade dela, e que sua vida resumia-se à este sentimento. Teve um tempo em que ela andava muito triste, e uma das professoras a incentivou a escrever seus sentimento no papel, em forma de poesia. Assim, mais do que descobrir aptidão pela escrita, ela também conseguia liberar algumas das pressões de forma lírica.

Júlia Stacke

“Fiquei surpresa quando fui escolhida para o livro Os Jovens Poetas, mas muito feliz. Isso me deu um incentivo a mais para voltar a ler e escrever meus poemas”, conta. De muitas formas, essa prática mudou a vida de Júlia, e ela acredita que, por meio da poesia é possível conhecer um mundo diferente, muitas histórias e sentimentos.

“A poesia é uma lente de ver o mundo diferente, com os olhos e o coração de muitas pessoas”, resume.

Também estudante do Colégio Estadual Presidente Castelo Branco, Tamara Kappes Zvirtes, 14, do 9º ano do EF teve sua poesia publicada no livro Os Jovens Poetas pela primeira vez este ano. Ela, que sempre gostou muito de ler, decidiu escrever seu poema sobre a leitura e, entre tantas coisas boas, selecionou os melhores sentimentos que o hábito lhe traz.

Alguns dos versos retratam movimentos de verbos como inspirar, divertir, imaginar, flutuar, amar, respeitar, comemorar e descobrir.

“Trabalhar coisas assim na escola fazem com que nos tornamos pessoas melhores. Eu fiquei surpresa de ter sido escolhida, mas já estou treinando em casa para, quem sabe, ano que vem conseguir de novo”, conta.

“Na hora de escrever minha poesia, eu pensei nas coisas que eu mais gosto e que me fazem sentir bem, então coloquei no papel. Ela é o meu reflexo”, conta Vitória Luísa Graffitti de Chagas, 14, do 9º ano do EF do Colégio Estadual Presidente Castelo Branco.

Ela diz que a professora propôs que cada aluno escolhesse sentimentos e coisas positivas para expressarem em seus poemas. Depois de ter tido duas poesias publicadas em edições anteriores de Os Jovens Poetas, Vitória conta que para ela, escrever significa criar um mundo de sentimentos reais, e uma forma de transmitir pensamentos e ideias para as outras pessoas.

“Nesse dia estava chovendo, e isso me inspirou um pouco mais, eu gosto de sair da sala e olhar ao meu redor quando escrevo poemas”, conta.

Exemplos que transformam

Desde o início do projeto, os alunos do Colégio Madre Bárbara participam do livro. Neste tempo, uma das professoras de Língua Portuguesa, Rosâna Bathke Scherer, foi um exemplo e incentivo para que os alunos se dedicassem cada dia mais.

Ela conta que nos 7º anos do colégio é introduzido o gênero lírico em sala de aula, com as características do poema e, por isso, dividem as turmas para que os 7º e 9º anos participassem desse projeto, e as demais turmas de outras atividades.

“Todo ano eles esperam ansiosamente para saber quem foi escolhido”, lembra. Neste ano, comenta que os temas mais abordados pelos alunos nas poesias foi a política, em função da eleições. Ela também tem percebido que os mais novos gostam muito de escrever sobre as memórias da infância.

“No início do ano trabalhamos com eles um poema que não tem sentido, porque a poesia pode ser um jogo de palavras apenas, então eles trabalham temas livres”, conta.

Uma das poesias selecionada pelo colégio foi do aluno Miguel dos Santos Soares, 13, do 7º ano. Ele conta que durante a aula tinha a ideia de escrever um poema sobre histórias. Mas chegando em casa com os jornais nas mãos, ele lembrou de tantas coisas ruins noticiadas ali.

“Minha poesia acabou sendo sobre o Brasil, a situação dos professores, das pessoas que perderam suas casas, e de como seria um país ideal”, conta.

Assim como Miguel, a aluna do 8º ano, Maria Júlia Diehl Berti, 13, também teve sua poesia escolhida para o livro Os Jovens Poetas, com versos sobre a saudade da infância. “Escrevi sobre as coisas que vamos sentindo falta a medida em que vamos crescendo, como a imaginação”, lembra.

Outro tema das poesias escolhidas foi a harmonia, escrita pela aluna Marília Abreu da Silva, 17, do 1º ano do Ensino Médio. “Meu poema tomou rumo diferente do imaginado, porque escrevi sobre a falta dela no mundo em que vivemos hoje”, lembra.

Com o caderninho de poemas nas mãos, criou o hábito faz pouco tempo e, sempre que a criatividade aparece, da ponta do lápis vão surgindo os versos.

Aptidão para ensinar

Na Escola Municipal Porto Novo, alguns alunos também foram escolhidos para compor a coletânea de poemas imersos no livro Os Jovens Poetas de Lajeado. Uma das professoras que trabalhou o gênero lírico com os alunos do 6º ano foi Margarete Conrad, lecionando Língua Portuguesa.

Depois de trabalhar poesias o ano inteiro, ela conta que quem teve mais aptidão para escrever teve seu poema escolhido para esta edição do livro.

“Sempre gostei muito de escrever poemas, porque é um gênero que envolve muita criatividade. Poesia é arte”, lembra.

Uma das alunas, Wendy Mirella Schmitz, 12, do 6º ano do EF, escreveu um poema sobre as 12 coisas que a deixam mais feliz. Entre elas, a família, a dança, visitar a avó, e mais um tanto de sentimentos que, para ela, tem poder de transformar seu dia.

Wendy ficou surpresa por ter sua poesia escolhida para o livro, mas conta que ler e fazer poemas é um das formas que encontra de se inspirar para realizar novas atividades.

No 7º ano da Escola Estadual Porto Novo, a professora auxiliou os alunos com um tema para criarem as poesias que seriam escolhidas para o livro. Eles tiveram que escrever sobre a leitura, um tema que Camile Luísa Simsen, 13, gosta muito.

“Eu só escrevi o que sinto quando leio, como fico mais criativa e viajo no mundo da Lua”, lembra.

Da mesma forma, no 1º ano do Ensino Médio, o tema escolhido foi a Segunda Guerra Mundial, um dos assuntos trabalhados no ano. A aluna Débora Luiza Doebber, 15, 9º ano teve sua poesia selecionada nesta edição, e conta que seus versos retratam curiosidade e desabafo de escrever sobre algo que não viveu, e que trouxe tanta tristeza.

“Escrevi que a verdadeira arma não é lutar, mas amar”, conta. Ela já havia participado do livro em 2015 e 2016, e acredita na importância do projeto, por ser um espaço onde muitas pessoas diferentes se unem pela poesia.

 

Acompanhe
nossas
redes sociais