Valmor Amorim, 48, acordou por volta de 7h e decidiu fazer três bloqueios na rua Francisco Oscar Karnal, no bairro Centro. O motivo: protestar por mais segurança no trânsito após o atropelamento de uma menina de 6 anos, na noite dessa segunda-feira. Com a ajuda de vizinhos, pegou pedaços de madeira e montou barricadas entre as esquinas da Julio May e da General Osório, local próximo ao campo do São José.
O ato, que contou com a participação de pelo menos 15 pessoas, reivindica a implementação de duas faixas elevadas para evitar novos acidentes no perímetro. O pedido de lombadas no trecho havia sido feito pelos moradores faz pelo menos um ano.
“Tem que acontecer uma tragédia para alguém tomar uma providência. No ano passado, eu já tinha pedido uma lombada para o Departamento de Trânsito”, diz a moradora Isabel Cristina, 44. “Este carro passou em alta velocidade aqui, como tantos outros. Não há fiscalização nenhuma”, reclama.
O atropelamento
A menina de 6 anos foi atropelada por volta das 19h30min, quando voltava com quatro colegas do Parque Professor Theobaldo Dick, onde brincavam após a saída da creche da Sociedade Lajeadense de Auxílio aos Necessitados (Slan), que fica a cerca de 50 metros do local do acidente.
“Todas as crianças vinham de mão dadas. Quando ouviram o barulho do carro, os maiores correram e minha filha voltou”, conta Taís Soares, 23. Segundo ela, a filha sofreu ferimentos graves na cabeça, nas costelas, no pulmão e um corte profundo na região do fêmur. “Quando chegou ao hospital, ela não conseguia respirar e teve de ser entubada”, desabafa.
Segundo relato de moradores, o condutor de 29 anos, que estava acompanhado da namorada, não quis sair do carro. “Ficou travado. Um morador de rua que viu o acidente veio ajudar”, conta Valmor. “Tiramos ele do carro, pegamos o veículo emprestado e levamos a menina ao hospital. Com a gravidade do impacto, a menina não resistiria aos ferimentos até o Samu chegar. Disseram que linchamos ele, isso não é verdade”, completa.
O motorista não levou a criança ao hospital. Ficou no local do acidente prestando esclarecimentos a comunidade e aguardando a Brigada Militar, segundo relato de moradores.
Até o fechamento desta edição, a criança seguia internada na UTI pediátrica do Hospital Bruno Born. O caso foi registrado na Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento (DPPA). O motorista não apresentava sinais de embriaguez.
Reivindicação atendida
Por volta das 10h30min, uma equipe do Departamento de Trânsito se deslocou ao local do protesto para iniciar a instalação de duas faixas elevadas na rua Franscico Oscar Karnal: uma na esquina com a General Osório e outra com a Julio May. “Agora isso aqui vai ficar bom”, acredita Isabel.
Segundo o coordenador do Departamento de Trânsito, Carlos Kaiser, são mais de 370 pedidos no município de redutores, quebra-molas ou faixas elevadas protocolados pela comunidade.
Demandas reativas
Outros dois casos só tiveram demandas atendidas após acidentes graves. No primeiro, no bairro Santo André, a instalação de um redutor de velocidade na rua Rio Grande do Sul só ocorreu no fim de janeiro de 2017, quatro anos após o pedido dos moradores.
“Fiz a primeira solicitação no governo passado. Mas só depois do atropelamento de um menino de 7 anos, que andava de bicicleta, a prefeitura tomou providências”, conta Jair Kern, presidente da Associação dos Moradores do Santo André.
Caso parecido aconteceu na avenida Benjamin Constant, no bairro Moinhos d’Água, no fim do ano passado. Um motociclista morreu após ter a frente obstruída por um veículo. A comunidade também já tinha solicitado ao governo um redutor de velocidade no local do acidente fazia quatro anos e o pedido só foi atendido após a morte do homem de 23 anos.
Em menos de 24 horas
19:30 – o atropelamento
A menina de 6 anos voltava do Parque dos Dicks com mais quatro colegas de creche. Ao atravessar a rua Francisco Oscar Karnal, foi atropelada por um Fiat Uno.
07:30 – moradores protestam
No início da manhã de ontem, moradores se unem para fazer três bloqueios na rua Francisco Oscar Karnal. O primeiro na esquina com a rua General Osório, o segundo no cruzamento com a Julio May e, por fim, uma barricada próximo à João Abott.
08:30 – autoridades visitam o local
Departamento de Trânsito faz os primeiros cálculos de viabilidade técnica para implementação da faixa de elevação na Francisco Oscar Karnal.
10:30 – início da obra
Caminhões do município chegam para iniciar a construção de duas faixas de elevação na Francisco Oscar Karnal.
17:00 – conclusão
Em menos de 24 horas, as duas faixas de elevação foram concluídas. Uma na esquina com a General Osório e outra próximo à Julio May.
Entrevista
“Foi coincidência o acidente. Já iríamos instalar redutor de velocidade nessa terça-feira”
A Hora – Em pelo menos três casos, os redutores de velocidade, já solicitados pela comunidade, só foram atendidos após acidentes. Por que o município trabalha de forma reativa?
Kaiser – Estamos priorizando faixas elevadas em escolas, creches e postos de saúde. São esses os locais onde há maior concentração de crianças e pedestres. Além disso, o critério observa vias longas onde há excesso de velocidade. Pelo cálculo que adotamos, por exemplo, a cada cem veículos, se 10% ou menos passarem em excesso, já não é o suficiente para implantarmos redutores.
No caso do atropelamento da menina de 6 anos, há a Slan e o Parque dos Dicks nas proximidades. Pelos critérios, circula uma demanda grande de pedestres e crianças. O município não havia previsto isso?
Kaiser – Foi coincidência o acidente. Já íamos instalar redutor de velocidade nessa terça-feira. Até comentei com a equipe, vai parecer que só implementamos faixas elevadas após ocorrências de acidente, mas não é verdade. Essa demanda já estava prevista no cronograma.
Cristiano Duarte: cristiano@jornalahora.inf.br