Schmutzige Hände (mãos sujas, em alemão) foi o nome escolhido para a operação desencadeada na manhã de ontem, 28, pelo Ministério Público e a Polícia Civil. O objetivo foi apurar crimes de organização criminosa, corrupção, fraude em licitações, lavagem de dinheiro e tráfico de influência. A ação teve como alvo o centro do governo municipal e resultou na prisão preventiva de quatro pessoas.
Foram encaminhados ao presídio de Lajeado o ex-prefeito Ricardo José Brönstrup – pai do atual, Jonatan Brönstrup –; o secretário de Saúde e chefe de gabinete, Alexandre Peters; o procurador-geral do município, Gustavo Fregapani; e o chefe do setor de Compras, Caciano Krahl. Até o fechamento desta edição, eles permaneciam presos.
Ainda foram feitas cinco conduções coercitivas e cumpridos oito mandados de busca e apreensão em departamentos da prefeitura, incluindo os setores de compras, licitações e o gabinete do secretário de Saúde. As residências de Peters, do ex-prefeito e a empresa RJB Terraplenagem (que seria de Ricardo Brönstrup) também tiveram objetos apreendidos. Os agentes recolheram celulares, computadores, documentos, entre outros.
A operação iniciou por volta das 8h, quando servidores municipais foram surpreendidos com a chegada de cerca de 12 viaturas na prefeitura. Coordenada pela Promotoria de Justiça, a ação teve auxílio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), Núcleo de Inteligência do Ministério Público (Nimp), Polícia Civil e Tribunal de Contas do Estado (TCE). Participaram sete delegados e 15 policiais, cerca de 20 agentes do Ministério Público e dois auditores do TCE.
“Corrupção das mais variadas ordens”
Conforme o promotor Jair João Franz, o foco da operação é investigar práticas de “corrupção das mais variadas ordens”, principalmente em fraudes em licitações, que resultariam em “vantagens” para os servidores dentro de suas atividades na administração. Segundo ele, o processo investigatório foi instaurado após o recebimento de uma denúncia.
“Informalmente, já havia informações de que havia uma espécie de corrupção sistêmica dentro da prefeitura. Mas as pessoas têm uma dificuldade, uma resistência, para afirmar as declarações. Até que, finalmente, nós tivemos um início de prova, com uma declaração de uma pessoa, e depois vieram outras provas”, revela Franz.
Sobre Jonatan Brönstrup, Franz afirma que o atual chefe do Executivo não é alvo da operação. “Investigar o prefeito não cabe ao promotor da comarca da cidade. É a Procuradoria de Prefeitos que faz esse tipo de investigações. Nosso alvo não era a investigação do prefeito, tanto que ele ainda não foi investigado. Isso pode ser feito, eventualmente, em um segundo momento”, comenta.
Afastamento preventivo
Por determinação da Justiça, o secretário de Cultura, Marcelo Brentano, foi afastado da função ontem, de forma preventiva. De acordo com Franz, a medida foi executada pelo Judiciário do município e tem relação com o objeto das investigações. Mais detalhes não foram informados devido ao sigilo do processo, afirma.
“Ramificação na câmara”
Franz não descarta a possibilidade de novas prisões. “Não dá para adiantar isso ainda. Depende da análise daquilo que foi apreendido”, comenta.
Em relação às prisões preventivas, caso não haja intervenção do Tribunal de Justiça por meio de recurso, os suspeitos permanecerão no presídio durante o andamento das investigações, que não têm perspectiva de término.
O promotor ressalta que, além dos presos, há outras pessoas sob investigação dentro da administração pública, incluindo uma possível “ramificação na câmara de vereadores”. “Isso será investigado mais para frente”, antecipa.
Nota oficial
No fim da tarde, o governo publicou uma nota oficial sobre a operação Schmutzige Hände. Conforme o texto, a administração “está colaborando com as investigações”. Consta, porém, que o Executivo não teve conhecimento sobre o conteúdo do processo. “Diante disto, faremos todo o possível para esclarecer os fatos da forma mais rápida”, alega.
“Confiamos no trabalho desenvolvido pela equipe de governo, secretários e servidores municipais, e daremos aos envolvidos na operação oportunidade de defesa e esclarecimentos. Reafirmamos a convicção da honestidade dos nossos servidores. Ressaltamos que a Prefeitura de Teutônia não pode parar com suas atividades e, portanto, todos os projetos e ações continuam tendo nossa atenção.”
Contas reprovadas
Ricardo Brönstrup governou o município de 1997 a 2000. Em 2006, teve as contas reprovadas pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) devido a irregularidades apontadas referentes ao exercício de 1999. Os direitos políticos do ex-prefeito foram cassados por oito anos. Em 2012, tentou se candidatar de novo, mas foi impedido pela Justiça com base na Lei da Ficha Limpa.
Em 2016, a 1ª Vara Judicial da Comarca de Teutônia acatou denúncias encaminhadas pelo Ministério Público e condenou o ex-prefeito por improbidade administrativa. Além de ficar novamente inelegível, Ricardo foi condenado a devolver R$ 590,7 mil aos cofres do município. A quantia foi determinada em razão de serviços de pavimentação asfáltica não prestados e pela manutenção de servidores considerados irregulares.
A chegada ao presídio
Antes de deixarem a cidade de Teutônia, todos os quatro presos passaram por exame de corpo de delito no Hospital Ouro Branco e prestaram depoimento na delegacia do município. Eles só começaram a chegar ao superlotado Presídio Estadual de Lajeado por volta das 11h.
O primeiro a chegar foi o chefe do setor de compras da prefeitura, Caciano Krahl. Às 11h40min, em uma caminhonete Mitsubishi L200 da PC, chegou o secretário de Saúde e também chefe de gabinete, Alexandre Peters. Ele não falou com a imprensa.
Cerca de meia hora depois, às 12h10min, em uma outra caminhonete da polícia, foi a vez do procurador-geral do município, Gustavo Fregapani, chegar ao presídio. Ele vestia terno e gravata e também não falou com a imprensa. Apresentava um semblante preocupado.
O último a chegar à carceragem foi o ex-prefeito e pai do atual gestor de Teutônia. Ricardo Brönstrup veio acompanhado de três policiais civis, em uma Renault Duster da PC. Chegou por volta das 12h30min, sem advogados. Usava um boné da marca Mormai, camiseta polo, calça jeans e sapato preto. Ele entrou rapidamente no presídio e não falou com imprensa.
Galeria de fotos
Nenhum dos quatro presos chegou algemado ao local. Esse fato gerou algumas críticas por parte de parentes de outros presidiários que estavam em frente ao antigo albergue. “Se fossem pobres, estariam algemados”, reclamou um deles.
Dentro da carceragem, os quatro ficaram divididos em duas celas distintas. A Cela 1 e a Cela 2, ambas na Galeria B. São espaços para presos comuns. O ex-prefeito, por exemplo, ficou na primeira, junto com pelo menos outros sete presidiários, em um local onde existem apenas seis camas. Para se acomodar, ele recebeu um colchão extra dos agentes penitenciários.
Por volta das 17h30min, os quatro foram obrigados a ir ao pátio do presídio com os outros 240 criminosos, para a revista geral realizada periodicamente nas galerias. Segundo agentes da Susepe, os quatro pareciam “bastante assustados” neste momento.
Já no início da noite, o advogado de Fregapani solicitou que ele fosse transferido s Porto Alegre ou para uma cela administrativa em Lajeado, pois o procurador jurídico tem graduação em nível superior. O ex-prefeito também tem formação, mas até o fechamento desta edição nenhum representante legal dele havia realizado tal pedido. A reportagem não foi informada sobre a escolaridade dos outros dois presos.
Alexandre Miorim: alexandre@jornalahora.inf.br | Rodrigo Martini: rodrigomartini@jornalahora.inf.br