No apartamento do designer Gustavo Cassiano da Silva, 34, a bancada da cozinha em muito lembra a mesa de um cientista – ou, em uma visão mais poética, de um perfumista –, quando ele mostra sua coleção de cafeteiras. Com termômetro, balança, filtros, moedor e chaleira de precisão ao alcance, ele pesa a quantidade de grãos, tritura, sente aromas, verifica a temperatura da água e escalda recipientes antes de servir uma xícara da bebida fresca. “O café é uma ciência”, defende.
O consumo da bebida vem desde a infância. Até os cerca de 18 anos, a receita era a tradicional de muitas famílias com crianças: uma colher de pó solúvel para três de açúcar – sempre preto, já que o leite servido no interior de Estrela, onde o agora morador de Lajeado nasceu, era muito forte. Foi no início da vida adulta, quando o paladar foi madurecendo com ajuda do amargo das cervejas, que passou a preferir o passado sem açúcar.
E há três anos começou a pensar no tema do TCC da faculdade de Design e se envolveu de vez com a bebida. Inicialmente, queria desenvolver um balcão portátil que permitisse o preparo do café em empresas. Mas, conforme avançou na pesquisa, mudou o foco para a relação entre design de experiência e percepção de valor do café. Viajou até fazendas produtoras do Sudeste para entender o assunto pela raiz.
De lá para cá, a imersão não parou. Apesar de não ser daqueles que estão sempre carregando uma xícara, ele faz questão de tomar pelo menos duas doses de qualidade ao dia: uma de manhã, outra à noite. A cafeteira mais usada em sua rotina é a V60. Nesse modelo, o buraco de saída é maior para aumentar o fluxo de água e diminuir o tempo de contato com o café. “O filtrado permite perceber os detalhes do sabor”.
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Também faz questão de conhecer cafeterias legais quando tem oportunidade. As dicas são compartilhadas em um grupo no WhatsApp, com um pessoal principalmente de Porto Alegre, onde costuma comprar grãos – o custo mensal gira em torno de R$ 150. O pacote de 250g do bourbon vermelho do Sítio Canaã (MG), que ele preparou durante essa reportagem, por exemplo, saiu por R$ 45.
Para o futuro, não descarta a possibilidade de trabalhar com serviços relacionados à bebida. Até que isso seja viável, conta com a ajuda da internet para assistir a degustações de café, competições entre baristas, e aprender mais. “O Brasil é o maior produtor de café e exporta para diversos países. Temos que valorizar”.
Critério e curiosidade
Segundo o proprietário da Banca Gourmet, Pedro Müller, nos últimos anos o consumidor brasileiro tem sido mais curioso e criterioso em relação ao café. “Nos surpreendemos. O café tem tido uma procura interessante”. Os chamados especiais, comenta, são da espécie arábica. Essa planta é cultivada a pelo menos 800 metros de altitude e é caracterizada pela acidez equilibrada, além de ser mais frutada e aromática.
Já os produtos comuns, encontrados em mercados convencionais, são feitos a partir da espécie robusta. Esse cultivar, explica, pode ser encontrado em altitudes menores e é mais resistente a intempéries. Costuma ser mais amargo e tem mais cafeína. “Por isso, o brasileiro é acostumado a tomar café com açúcar. De certa forma, o açúcar pode esconder alguns defeitos do café”.
O empresário ressalta, porém, que a espécie é apenas um em um conjunto de fatores, como plantio, colheita, seleção, beneficiamento e até modo de preparo do café na hora do consumo. “O que difere muito um café do outro é o ponto de torra. Isso define se vai ser mais frutado ou mais amargo, por exemplo”. A mistura entre diferentes tipos de grãos se chama blend.