A cumplicidade anônima por detrás das portas

Opinião

Raquel Winter

Raquel Winter

Professora e consultora executiva

A cumplicidade anônima por detrás das portas

Por

Gustavo Adolfo 1 - Lateral vertical - Final vertical

Há coisas que gostaríamos de falar, mas por algum motivo não falamos para quem de fato deveríamos. Isso acontece com muita gente, o tempo todo, em muitos lugares. É engraçado observarmos as declarações de amor ou mesmo as maldições escritas nas portas dos toaletes mundo afora: “Te amo, Mateo”; “Mariana e Carlos”; “Vou ser feliz hoje e sempre”; “Vá se ferrar sua ingrata”…
Parece-me que escrever atrás das portas dos banheiros de bares e restaurantes, das danceterias e cafeterias, já é um hábito cultural global. A minha curiosidade instala-se no fato que motiva alguém a esse ato. Não vejo onde está o romantismo em declarar seu amor secreto para quem quiser ler, elementarmente enquanto na melhor das hipóteses, estiver fazendo xixi!
Considero que há momentos em nossa vida que desejamos expressar sentimentos, mas falta-nos coragem. Em outros casos, a coragem até existe, mas a pessoa a quem destina-se a mensagem é quem não está disposta a nos escutar. Também há os casos em que compreendemos que não seria auspicioso fazê-lo. Nesses, estabelecemos um monólogo solitário, compartilhado em diários, portas, muros, bilhetes, carteiras escolares ou mesmo troncos de árvores.
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Parece-nos que materializar em palavras alguns sentimentos de amor ou mesmo ódio nos alivia, nos dá uma oportunidade, nos liberta. Talvez seja a criação do um vínculo secreto, de um passo em direção ao que desejamos.
Por vezes, nossos tormentos derramam-se em letras que, unidas, expressam silenciosas palavras. Silenciosas, no entanto, poderosas, definitivas, reveladoras. Revelam medos e atos heroicos que, compartilhados, mais parecem devaneios perdidos em um eco solto e sem propósito. Ledo engano. Há propósito, ainda que desconhecido, aos leigos nessa atmosfera de desabafar, revelar, gritar em rabiscos mal educados, politicamente incorretos, desajeitados e até socialmente questionáveis. Mas é fato: alguém inventou essa técnica popular de “terapiar” via rabiscos entregues a quem couber e quiser ler. No mínimo curiosa essa cumplicidade anônima por detrás das portas.

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