Enem: rendimento das escolas do RS cai

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Enem: rendimento das escolas do RS cai

Problemas com o português e de interpretação de texto preocupam educadores

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Vale do Taquari

Vale do Taquari – Os resultados do Enem do ano passado demonstram lacunas no aprendizado gaúcho. Educadores apontam as dificuldades com o português e a interpretação de textos como os principais problemas enfrentados pelos estudantes.

Crédito: Anderson LopesO rendimento em 2014 foi levemente superior ao de 2013, ano em que nenhuma escola do estado figurou entre as cem melhores do país. Porém 45% delas tiveram média inferior a 500 pontos na redação. O resultado é muito abaixo em relação ao ano anterior, quando 29% não alcançaram a média mínima exigida para passar no teste.

Coordenador do Departamento de Jornalismo da Unisinos, Edelberto Behs aponta uma queda na qualidade do ensino da língua portuguesa nos últimos anos. Segundo ele, mesmo alunos que ingressam na faculdade apresentam lacunas na área. “São sérias dificuldades para ler, interpretar e escrever textos.”

Para Behs, entre os fatores que colaboram para o cenário, estão as reformas no sistema educacional do país. Avalia que as mudanças priorizaram o Ensino Superior, deixando de lado o aprendizado no Fundamental e Médio. “O Enem serve como sinal de alerta para essa realidade.”

O professor ressalta que o problema não é recente na educação gratuita. Frisa que as escolas públicas foram desmanteladas ao longo da ditadura militar e que a realidade foi pouco alterada com a redemocratização.

“No estado, temos o exemplo das dificuldades enfrentadas pelos professores”, reforça. Segundo Behs, para melhorar os índices da educação, foram estabelecidos métodos que privilegiavam a quantidade em detrimento da qualidade. Para ele, a preocupação hoje é exclusivamente com o número de alunos que avançam de ano ou chegam à universidade.

“Para garantir os índices de aprovação, deixamos coisas importantes pelo caminho”, considera. Cita como exemplo a disciplina de Latim, que não faz mais parte do currículo das escolas. Acredita ainda na necessidade de uma maior inserção de temas como filosofia e sociologia.

As matérias são consideradas fundamentais para a capacidade de interpretar eventos do cotidiano que costumam cair no exame. Segundo o professor, também assusta o desconhecimento de fatos históricos, inclusive os mais recentes.

Curso para formar leitores

Professora universitária faz quase 40 anos, Ana Maria Accorsi é uma das responsáveis pelo curso de especialização em Teoria e Prática da Formação do Leitor da Uergs. Em pesquisa recente com alunos da universidade, Ana constatou graves dificuldades de interpretação de textos.

“Aprendem conteúdos específicos das disciplinas, mas muitas vezes não compreendem o que é pedido quando precisam desenvolver um problema”, exemplifica. Para ela, a falta de leitura está entre os principais motivos para o problema.

Ana aponta uma barreira cultural que impede o avanço da leitura no país. Segundo ela, o hábito não faz parte do cotidiano da maior parte das famílias brasileiras, ao contrário do que ocorre em países de primeiro mundo e até mesmo de vizinhos como Uruguai, Argentina e Chile.

“Sendo assim, a escola precisa dar esse incentivo, mas nem mesmo nossos professores são leitores frequentes”, evidencia. Cita o exemplo de Porto Alegre, onde a Secretaria de Educação oferece um bônus para compra de livros. Ressalta que muitos educadores beneficiados trocam o bônus por dinheiro.

Ana alega que os baixos salários também contribuem para o problema. No estado, muitos professores trabalham em mais de um local e com isso ficam sem tempo para ler ou buscar qualificações. “Por falta de condições, mesmo a leitura de revistas e jornais deixou de fazer parte dos hábitos do professor público.”

Foi pensando nessas dificuldades que a Uergs elaborou a especialização. Para a professora, é dever da universidade pública formar esses professores e despertar o hábito da leitura. “Se fala muito em leitura, mas vemos poucos trabalhos efetivos.”

Outro exemplo citado são os livros oferecidos pelo MEC às escolas. Conforme a professora, nunca houve por parte do ministério uma oferta tão grande, mas os colégios relutam em deixar o livro em poder dos alunos. “As caixas ficam fechadas e a desculpa é que as crianças podem estragar os materiais.”

Novas realidades

Ana avalia ainda que as escolas poderiam estar mais atentas às novas tecnologias nos quais os estudantes estão inseridos e utilizar as plataformas de maneira produtiva. Para ela, os jovens leem e escrevem muito nas redes sociais, mas têm dificuldade para entender as informações que recebem.

Prova disso é a grande quantidade de informações inverídicas divulgadas por meio internet.

“Tem que ver como a leitura é feita hoje e como isso interfere na concentração e na capacidade de interpretação”, reforça.

Todos os apontamentos fazem parte dos debates e projetos propostos pelos educadores, mas ainda parecem distantes das políticas públicas existentes no Brasil e no estado. Enquanto essa realidade não for alterada, dificilmente teremos avanços concretos na educação e continuaremos a amargar os resultados do Enem.

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