Lajeado – O espaço público da biblioteca já foi mais visitado. Mesmo com as constantes aquisições de novas obras literárias, o advento de novas tecnologias, a abertura de novas livrarias e espaços para leituras e ainda a perda de interesse aparecem como os prováveis motivos para a redução no número de empréstimos do acervo lajeadense. Em 2004, mais de 25,5 mil livros foram retirados. No ano passado, houve 18 mil locações.
A queda no número de leitores contrasta com o aumento do acervo nestes últimos dez anos. De 2004 até hoje, a administração abasteceu o principal ponto de leitura municipal com 8,7 mil novas obras. A biblioteca pública conta hoje com 34 mil exemplares disponíveis, e durante o ano há previsão de outras aquisições.
Outro dado curioso também afronta a diminuição do número de leitores da biblioteca municipal. De acordo com o bibliotecária, Carine Maritan, hoje existem 12.788 pessoas cadastradas. Há dez anos, estavam registradas pouco mais de cinco mil. “Os livros didáticos, por exemplo, quase não são mais retirados. Os alunos fazem suas pesquisas e trabalhos escolares pela internet.”
Carine acredita que o uso cada vez mais facilitado da internet contribui para a baixa na procura pelos livros. “A própria biblioteca também oferece um telecentro com computadores e acesso gratuito à internet.” Mesmo assim, ela percebe uma nova geração de leitores surgindo, e também observa como positivo o crescimento na produção de livros nacionais.
Apesar da perda de alguns leitores, a bibliotecária defende o bom aproveitamento do local pela comunidade. Cita como outros atrativos a disponibilização de jornais, revistas (são 14 assinaturas), o arquivo histórico do município, espaço para pesquisas e a biblioteca infantil. Além disto, enaltece as seguidas visitas agendadas e guiadas de alunos da rede municipal de ensino. “O espaço é muito bem utilizado.”
No entanto, Carine admite a necessidade de as bibliotecas evoluírem para atrair novos leitores. “Os espaços precisam se reinventar, desde seu acervo, até estrutura, mobiliário e equipamentos.” Ela sugere, por exemplo, unir livros digitais e obras impressas em um mesmo espaço. Cita formas para facilitar o acesso dos leitores. Hoje, a equipe oferece reserva de obras e renovação de empréstimos via internet. “É uma inovação, pois em grande parte das bibliotecas isso não ocorre.”
É simples se tornar “sócio” da biblioteca. É preciso residir, estudar ou trabalhar em Lajeado. Para realizar o cadastro, basta apresentar no local a carteira de identidade, comprovante de endereço atualizado, telefone para contato e duas fotos 3×4. Será cobrada uma taxa anual de R$ 5 para o cadastro. Conforme Carine, cada usuário pode retirar até três livros e permanecer com eles por, no máximo, 14 dias. Revistas também podem ser levadas para casa.
Queda não significa menos leitura
A redução no número de empréstimos na biblioteca municipal é considerada normal pela doutora em Literatura, a professora Rosane Cardoso. “Uma das razões para isso é o acesso que o estudante tem, hoje, a acervos excelentes nas escolas, trazidos pelas políticas públicas”, cita. Ela lembra ainda que as escolas também estão enfrentando de forma diferente a promoção da leitura, com projetos de incentivo e com práticas educacionais no espaço da biblioteca e na sala de aula.
O advento da internet também é citado como um “divisor de águas” no mundo da literatura. Para Rosane, a aproximação do leitor com outros suportes contribui para o afastamento da biblioteca pública. “É possível ler muita coisa on-line e isto é atraente e cômodo, na medida em que permite não apenas a leitura, mas informações sobre o que se lê. Não resta dúvida que a rede transformou as práticas de leitura.”
Rosane comenta sobre a transformação de obras literárias em filmes. Histórias que saem do papel para as telas de cinema, para ela, levam leitores a deixarem os livros de lado. “Muitos são os que dizem ‘conhecer’ determinada história porque a ‘viu’ nas telas. E assim, o livro fica de lado.” A professora entende que a queda na procura pelo acervo público não significa que as pessoas estão menos intelectuais.
No entanto, ela reitera os níveis baixos de leitura do país. “A quantidade de pessoas que diz não gostar de ler continua imensa, embora isso não assuste tanto quanto o número de pessoas que simplesmente não consegue ler.” Segundo Rosane, apesar de decodificarem e saberem o que está escrito, muitos não chegam a uma compreensão efetiva do texto. “Seja ele literário ou não.”
Para ela, independente de qual tipo de obra o leitor escolher, é sempre importante manter algum tipo de leitura. “Seja um best-seller, um jornal, um HQ, ou mesmo segurando um livro ou lendo na tela de um computador.” Comenta que as pessoas podem ter encontrado outros espaços para ler, abdicando da procura pela biblioteca municipal. “A busca por livros em um espaço público não nos dá o mapa da leitura de determinado local.”
Apesar da realidade atual, a professora ainda considera a biblioteca pública ou a escolar como os locais que melhor representam a leitura. Ela desafia os promotores da leitura. Pais, professores, entidades governamentais. Diz que é preciso perceber esse novo leitor e o futuro contexto da leitura. “A única certeza é que a leitura continuará sendo o que nos permite adentrar o conhecimento, a emancipação pessoal. A emoção e o prazer não acabam porque o suporte é on-line.”
Tradição mantida
Apesar da diminuição no número de empréstimos, a biblioteca municipal ainda mantém fiéis e assíduos frequentadores. Aos 95 anos, Maria Thalita Garcia visita todo mês o acervo disponibilizado ao lado da Casa de Cultura de Lajeado. Ela mantém a tradição há décadas. E não pretende parar. “Sempre pego dois livros por vez. Fui criada lendo e não consigo parar. Minha família é assim.”
Mãe do jornalista Alexandre Garcia, Maria Thalita lembra ter nascido em um berço de cultura. “Meu pai e demais familiares respiravam cultura. Todos sempre fomos incentivados a ler.” Com alguma dificuldade para ir sozinha à biblioteca, ela costuma visitar o local acompanhada da filha. Aproveita também para realizar outros afazeres. Banco, mercado e farmácia sempre fazem parte do roteiro. “Mas o principal objetivo são os livros. Eles nos ensinam, mudam nossas vidas.”