Quase 2 mil pacientes aguardam por consulta em traumatologia

NA FILA

Quase 2 mil pacientes aguardam por consulta em traumatologia

Moradores da região enfrentam dificuldades em conseguir agendar consultas, exames e até procedimentos cirúrgicos nos hospitais de Canoas. Situação aumenta pressão sobre o Estado e líderes locais cobram que referência na especialidade

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Atualizado quarta-feira,
19 de Abril de 2023 às 14:12

Quase 2 mil pacientes aguardam por consulta em traumatologia
Moradora do bairro Oriental, em Estrela, Teresinha de Oliveira esperou seis anos até conseguir a cirurgia para reconstruir os ligamentos do joelho. Crédito: Filipe Faleiro
Vale do Taquari
Seis anos. Esse foi o tempo em que Teresinha Pereira de Oliveira, 52, de Estrela, esperou para fazer uma cirurgia no joelho. As dores devido a lesões nos ligamentos provocaram inúmeras dificuldades. Precisou parar de trabalhar. Inclusive as tarefas mais cotidianas ficaram prejudicadas. “Mudou minha vida. Entrei até em depressão.”
Fez a cirurgia em outubro do ano passado. Devido à longa espera, o outro joelho ficou sobrecarregado e também precisará passar por intervenção cirúrgica. “Fiz uma ressonância magnética e terá de ser operado. Com o que aconteceu antes, não tenho nem ideia se vou conseguir ainda neste ano.”
Os atendimentos em média e alta complexidade para pacientes do Vale do Taquari têm como referência hospitais de Canoas. De acordo com o secretário de Saúde de Estrela, Celso Kaplan, a espera para cirurgias leva em média entre quatro a cinco anos.
Pelo acompanhamento do município, são 127 pessoas aguardando pela primeira consulta e mais de 700 na fila por cirurgias. “Isso é inaceitável. É desumano. Uma situação dramática para as pessoas. Sabemos que não é exclusividade de Estrela, mas de toda a região e do estado. Esse sistema está errado e precisa mudar”, realça Kaplan.
O encaminhamento de pacientes depende de autorização. “Mesmo com o pedido de alta complexidade e urgência, temos dificuldades. Inclusive com negativas dos hospitais de Canoas”, admite a coordenadora da 16ª CRS, Rafaela Fagundes.
Para atendimento de casos simples e de média complexidade, a região tem dois hospitais com autorização para estes serviços. O Ouro Branco, em Teutônia, e o São José, em Arroio do Meio. Pelos relatórios da coordenadoria, de 2018 até 2022, a região conseguiu internação em traumato-ortopedia para 291 pacientes. Número inferior à necessidade.
“As urgências estabilizadas no hospital são negadas pelo sistema de saúde de Canoas, o que significa que tudo volta para o município, com risco de sequelas e pessoas perdendo membros”, afirma o secretário Kaplan.
Levantamento preliminar em 25 municípios do Vale mostra que há 1.783 pacientes na fila pela primeira consulta na especialidade de traumato-ortopedia em hospitais de Canoas. Os dados fazem parte do diagnóstico organizado pela 16ª Coordenadoria Regional de Saúde (CRS). Este relatório servirá de argumento para avançar na negociação com o Estado para regionalizar esses serviços no Hospital Estrela.

Proposta em análise

Prefeitos da região, por meio da Associação dos Municípios do Vale do Taquari (Amvat), negociam desde março uma mudança no sistema de atendimento. Em assembleia marcada para amanhã, às 16h, em Forquetinha, os gestores públicos voltam a tratar do tema.
Há uma reunião pré-agendada com a secretária estadual de Saúde, Arita Bergmann, para o dia 24 de abril, para avançar na proposta de tornar o Hospital Estrela referência regional. Conforme o presidente da associação e prefeito de Estrela, Elmar Schneider, é preciso qualificar o serviço.
“A regionalização trará melhores condições de atendimento às pessoas da nossa região, que não vão precisar de grandes deslocamentos. Também reduzirá despesas públicas, nos gastos com transporte.”
Pela proposta em construção, o hospital de Estrela atenderia a demanda dos municípios da região na especialidade traumato-ortopedia. A proposta inclui 16 cirurgias consideradas complexas por mês e 70 vagas em casos de média complexidade.
A proposta envolve um alto investimento em profissionais, equipe técnica e infraestrutura, que inclui a contratação de pelo menos sete ou oito traumatos, cinco enfermeiros, oito técnicos, além de pessoal de administração, limpeza e cozinha. O custo estimado por mês, para tornar a casa de saúde referência, ultrapassa os R$ 622 mil. Deste total, algo em torno dos R$ 382 mil seriam custeados pelo governo federal e pelo Estado, por meio do Programa de Financiamento da Média e Alta Complexidades (Recurso MAC). O restante, em torno de R$ 240 mil, seria dividido entre os municípios da região.

Despesas e judicialização

De acordo com os gestores, pela demora no atendimento, os municípios precisam fazer a complementação. Por vezes, os procedimentos vão à Justiça. “A despesa com transporte, gasolina, horas extras de servidores e a insatisfação dos pacientes são problemas. Isso sem contar quando levamos pacientes de maca e eles ficam dois ou três dias esperando por um leito”, conta o prefeito de Taquari, André Brito.
“Temos pacientes esperando desde 2015. É uma afronta à população, na medida em que na maioria das vezes a referência entende não ser o caso de receber o paciente”. Pelo acompanhamento, em menos de duas semanas o município custeou dois procedimentos de colocação de prótese do quadril, em pacientes que entraram via emergência do Hospital São José, conta.
“Tiveram  frustradas as transferências porque Canoas entendia não serem de alta complexidade. Ambos judicializaram e por meio de ação judicial ganharam a causa”. Como se trata de situações recorrentes, a despesa anual com a judicialização de procedimentos chega a R$ 610 mil.
Entre convênios para pacientes eletivos, contrato com especialistas, exames de radiografia, tomografia e custos com ações jurídicas, diz o prefeito, o custo total supera R$ 1,1 milhão por ano. “Com a referência em Estrela, o aporte de recursos, se empregado de maneira correta e haver qualidade, fará com que outras despesas decorrentes do péssimo atendimento em Canoas sejam redirecionadas para algo melhor”, acredita Brito.
Pelo relatório da Secretaria de Saúde de Taquari, há 200 pacientes na lista de espera por consultas eletivas e outros 77 com diagnóstico por cirurgias em traumato-ortopedia.

Críticas da região

  • Para consultas, são de três até oito meses para conseguir alguma agenda. Problemas no joelho, as quotas são raras e a demanda é alta;
  • Para cirurgias, há pacientes na fila há quase dez anos;
  • Frente à demora no atendimento, os exames são providenciados na maioria das vezes pelos municípios, tais como raio-X, tomografia, ecografia e outros. Essa iniciativa é adotada para otimizar o diagnóstico e não depender das marcações da referência;
  • Municípios afirmam que falta resolutividade e efetividade no serviço prestado pelos hospitais de referência;
  • Como a estabilização dos pacientes é feita em hospitais da região, quando é solicitada a transferência, as casas de saúde de Canoas não aceitam por entender que não se trata de urgência.

Alternativa em análise

  • Proposta da Rede Divina Providência, mantenedora do Hospital Estrela, foi apresentada para agentes públicos da região e do Estado em março;
  • A ideia é criar a referência para o Vale do Taquari, como forma de reduzir o gargalo de atendimento em traumato-ortopedia;
  • Em reunião da Amvat, amanhã, às 16h, em Forquetinha, prefeitos voltam a tratar do assunto. Encontro será uma preparação para agenda com a secretária de Saúde do RS, Arita Bergmann;
  • Pela proposta inicial, casa de saúde de Estrela poderia fazer 16 cirurgias de alta complexidade por mês e outras 70 de média;
  • O custo estimado para tornar o hospital referência passa dos R$ 622 mil por mês. Pelo formato do convênio, seriam repasses tripartite (União, Estado e municípios). A divisão entre os municípios da região seria de acordo com a população, em um montante estimado de R$ 244 mil por mês.

Região defende tornar o Hospital Estrela referência  na especialidade. Custo estimado por mês ultrapassa os R$ 622 mil. Crédito: Filipe Faleiro

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