Entre a chegada do desconhecido e o colapso na saúde

UM ANO DE PANDEMIA

Entre a chegada do desconhecido e o colapso na saúde

O Vale do Taquari revisou protocolos e comportamentos para enfrentar a maior pandemia dos últimos cem anos. No próximo sábado, dia 20, a região completa 12 meses do primeiro caso confirmado. Na saúde, uma adaptação forçada. A rotina do trabalho, a educação, as relações pessoais. Tudo mudou. Entre a chegada da vacina até as UTIs lotadas, a sociedade falhou para conter as infecções

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Atualizado segunda-feira,
15 de Março de 2021 às 12:41

Entre a chegada do desconhecido e o colapso na saúde
Vale do Taquari
Gustavo Adolfo 1 - Lateral vertical - Final vertical

Um ano de pandemia no RS. Essa foi a marca desta semana. Já o próximo sábado, dia 20, completa 12 meses do primeiro contágio por covid-19 no Vale do Taquari. Antes do primeiro caso, autoridades políticas, médicos, gestores de saúde, acompanhavam o avanço da doença pelo mundo e já previam o impacto nos hospitais.

Com os diagnósticos crescendo no estado, era questão de tempo para os pacientes começarem a chegar. Para se antecipar a essa condição, foi formado o comitê de crise regional e os municípios também passaram a instituir algumas restrições.

Foi o momento das transformações. Aulas presenciais suspensas, aglomerações proibidas, restrições para realização eventos sociais e novas regras para atendimento em saúde nos hospitais, postos de saúde e unidades de emergência.

A palavra de ordem era evitar contágios. Fazer de tudo para frear o risco de um colapso no atendimento em saúde. Todos os profissionais dos hospitais, postos e emergências tiveram de adotar novos protocolos. Foi uma reviravolta, pois tudo era novo e desconhecido.

Conforme dados da Secretaria Estadual de Saúde, a condição atual da rede de atendimento do Vale do Taquari conta com 69 leitos de UTI cadastrados. Na tarde dessa sexta-feira, haviam 95 pacientes em estado grave internados. Representa uma ocupação de 137,6%. Do total de leitos ocupados, 80 são casos suspeitos ou confirmados de covid-19.

“O médico me ligou e disse: ‘Josi, pede por um milagre’”

Josiane Delazeri Hilgert Bandeira, 37, é psicóloga. Atua na assistência social de Teutônia e tem consultório em Lajeado. Casada com Rafael Lima Bandeira, 36, mãe de um menino com 2 anos e de uma menina com 5.

Em todo o ano passado, a família precisou se adaptar. O marido, professor de futebol, parou de trabalhar e ficou com os filhos. A ordem era distanciamento. Quanto a Josiane, ficou duas semanas de março passado com serviços suspensos. Logo em seguida, ela retornou. Muito diferente de como era.

No início de fevereiro, o baque. Em um encontro familiar no domingo de Carnaval, com os pais em Teutônia, o marido começou a passar mal. Sintomas muito fortes, com febre elevada.

Voltaram para a casa e ambos testaram positivo. O filho do casal, de dois anos, também contraiu a doença. Rafael precisou ser internado. O restante da família ficou em isolamento. O pai dela, o professor de Direito da Univates, Renato Hilgert, também se contaminou e está internado no Hospital Ouro Branco, de Teutônia.

Do diagnóstico até a internação foi rápido. O pulmão de Rafael ficou 90% comprometido. “O médico me ligou e disse: Josi, pede por um milagre. Sou cristã. Mas foi desesperador ouvir isso. Parecia que o médico queria se desculpar, ele não disse, mas senti. Era como se estivesse querendo me dizer: eu não consigo ajudar.”

Dois dias depois, já fim de fevereiro, Rafael começou a melhorar e voltou para casa. “Recebi a informação que o perigo tinha passado. Já tinha melhor saturação de oxigênio no sangue.” Ainda usa oxigênio, mas já consegue caminhar e se alimentar melhor, diz Josiane.

Quanto ao pai dela, Renato Hilgert, a informação mais recente que precisaram fazer uma traqueostomia para ajudar na respiração. “Sei que ele acordou. Estamos com esperança de que vá sair dessa.”


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Rafael, marido de Josiane, teve 90% do pulmão comprometido. Agora se recupera em casa. Renato, pai dela, está na UTI do Hospital Ouro Branco


“Ficou um vazio

na nossa vida”

A mãe de Beatris Vieira, 56, foi o primeiro óbito por covid-19 confirmado na região. A dona Elmira, então com 86 anos, contraiu a doença e morreu em abril do ano passado. “Até hoje não sabemos onde ela pegou. Foi algo que nos marcou muito. Sabíamos da doença, que estava começando, mas parecia que estava longe. Só quando acontece com a gente é que temos noção do que é essa doença.”

Até hoje ela se lembra da última vez que viu a mãe. “Foi quando ela internou. Ficou no hospital e nunca mais a vi.” A família não pode fazer o velório. “Ficou um vazio na nossa vida. Semanas depois, foi feito um memorial para ela. Foi muito lindo. Serviu como uma despedida.”

De toda a experiência da família, ficaram traumas. “Entrei em depressão. Passei a ter problemas de saúde que nunca tive antes. Ficou um pavor na vida de todos nós.” Apesar de toda essa dor, houve mudanças no comportamento. “Desejo que ninguém passe pelo que passamos.”

Família de Elmira Vieira, primeira morte confirmada por covid no Vale, não pôde fazer o velório. Um mês depois do óbito, a despedida veio por meio de um memorial

 

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