O som do silêncio

Opinião

Raquel Winter

Raquel Winter

Professora e consultora executiva

O som do silêncio

Por

Xiu! Todos fiquem quietinhos! Quero ouvir o som do silêncio. Difícil de encontrar, raro mesmo. O som do silêncio não está disponível onde ou quando quisermos e o mais impressionante é que, se não estivermos atentos aos poucos momentos em que ele se revela para nós, somos capazes de passar anos ou até mesmo uma vida inteira sem ouvi-lo.
Antes de mais nada, temos que compreender que o silêncio pode apresentar o seu som em vários tons diferentes, depende mais da nossa capacidade de escuta do que dele (o silêncio) propriamente dito. Algumas vezes, esse som vem embalado por notas de saudade. Em outras, chega cheio de inspiração para criação. Há também as situações em que a solidão é quem dita a melodia. Há silêncios que acontecem no nosso interior e outros no nosso exterior.
Na minha opinião, sempre dependerá, como eu já disse a pouco, da nossa capacidade de escutar e isso, meus amigos, muda muito com o decorrer da vida, das experiências e aprendizados que vamos construindo com o passar do tempo.
Bom exemplo disso eu vivi um dia desses quando, em um dia de primavera, mais precisamente em um domingo cedinho da manhã, eu estava sentada sozinha no jardim da minha casa. Todos ainda dormiam, inclusive os cães da vizinhança. Enquanto o sol aquecia meu rosto, fui envolvida, verdadeiramente tomada, por um lindo, intenso e confortante som de silêncio. Percebi que aquele som me era familiar. Já havia ouvido aquele silêncio antes, mas confesso que de pronto não soube dizer quando. Aos poucos, o som do silêncio foi ficando mais alto.
Fechei os olhos. Concentrei-me e comecei a decifrar as notas. Algumas tinham som de insetos e outras de pássaros. O vento também assobiava aos meus ouvidos em ondas que subiam e desciam. Nenhuma das notas trazia qualquer tom de urbanidade. Havia eco de palavras ditas por crianças. Parecia-me que algumas notas traziam o som do rugido de um balanço de ferro.
Era isso! Despertei quase que de um transe. Foi o rugido do balanço de ferro que se mexeu com o vento que me trouxe o som do silêncio! Agora eu lembrava. Tudo fazia sentido. Realmente aquele som do silêncio me era familiar. As manhãs de domingo da minha infância tinham esse som. Som do vento, dos pássaros e insetos. Som do silêncio do domingo.
De uma época em que eu ficava sozinha no quintal da nossa casa me embalando alto e mais alto… Eu passava horas desse jeito, escutando o ruído do vai e vem das correntes de ferro do meu balanço e sonhando acordada com o futuro que um dia chegaria. Bons tempos. Uma época em que os meus tormentos interiores ainda eram poucos ou nenhum, em que me era possível ouvir o som puro e alegre da vida simples e descompromissada da minha singela, mas digna infância.
Interessante. Agora o futuro daqueles sonhos já é o meu presente. E de presente recebi naquele domingo um raro silêncio que oportunizou calar a minha mente e me fazer sonhar acordada com um passado que já vivi. A vida tem mesmo destas.

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