“Não existe profissão ou atividade sem o professor”

Vale do Taquari - ao mestre com carinho

“Não existe profissão ou atividade sem o professor”

Ex-professor, o ator Werner Schünemann é o padrinho do PENSE. Ele esteve na região na segunda-feira. A educação como prioridade real, sem discurso ou falsas promessas, em que a sociedade seja a protagonista e mostre ao poder público o que deve ser feito. Em entrevista exclusiva, Werner Schünemann enaltece a iniciativa de organizações regionais para valorizar a atuação do professor. Para ele, a experiência iniciada nessa segunda-feira tem potencial para transformar o ensino e servir de exemplo ao país

“Não existe profissão ou atividade sem o professor”
Vale do Taquari

Movimento conjunto entre organizações civis e públicas para valorizar a atuação dos professores. Esse é o princípio do Programa Ensino e Educação (PENSE) Solidário lançado pelo A Hora, Univates, Centro Regional de Oncologia (Cron), Instituto Dale Carnegie, Sicoob Meridional, Associação dos Municípios do Vale do Taquari (Amvat) e 3ª Coordenadoria Regional de Educação (CRE) nessa segunda-feira, 26.

Frente ao caráter comunitário da iniciativa, o professor de História e ator Werner Schünemann aceitou o convite de ser o padrinho do PENSE. “A comunidade precisa tomar as escolas e os professores nos braços e mostrar ao poder público como queremos que seja a educação”, defende.

Primeiro palestrante do PENSE, o artista sustenta que a única forma de se ter uma sociedade mais justa, fraterna e igualitária é por meio do ensino de qualidade. Sob essa tônica, enalteceu o comprometimento dos parceiros na iniciativa.

O PENSE tem por objetivo estimular professores e alunos para transformar o processo de aprendizado, também proporcionar melhoria na autoestima dos professores por meio de cursos e intercâmbios (detalhes dos prêmios ao lado).

A organização estima que o programa alcance 4,7 mil professores e mais de 50 mil alunos. “É algo inédito no país. Não tenho conhecimento de um projeto com esse formato”, frisa Schünemann.

Entre as ações, estão 18 caravanas às escolas. Nessas, profissionais de diversas áreas participarão de debates, palestras e atividades com professores e alunos. A programação conta ainda com dois seminários. Dez educadores, cinco alunos e cinco escolas serão premiados. Para tal, precisam desenvolver projetos inovadores na área do ensino. Para os estudantes, as premiações serão definidas por meio de um concurso de redação que fale sobre ações em defesa dos educadores.

Ator e professor Werner Schünemann é padrinho do PENSE. Nessa segunda-feira, palestrou na Univates, visitou o A Hora, o Cron, em Estrela, e concedeu coletiva

Ator e professor Werner Schünemann é padrinho do PENSE. Nessa segunda-feira, palestrou na Univates, visitou o A Hora, o Cron, em Estrela, e concedeu coletiva

Entrevista

Nascido em Porto Alegre em fevereiro de 1959, Schünemann se formou em História pela UFRGS. Antes disso, participava de grupos de teatro. Entre 1980 e 83, foi professor para alunos de 14 a 17 anos.

Para ele, o sistema educacional cria amarras sobre os professores. As exigências de cumprir o cronograma de conteúdos e avaliar por meio das provas afasta o educador do aluno. “Professor não é carrasco. Ele precisa ser admirado.”

Durante a passagem por Lajeado, após a palestra na Univates, Schünemann esteve no jornal A Hora, concedeu uma entrevista coletiva no Restaurante Chef Imec e visitou o Cron em Estrela. Em quase duas horas, abordou as dificuldades, os desafios e como seria a escola ideal. Confira a seguir parte da conversa com o ator:

A Hora – Como essa concepção de programa com envolvimento comunitário pode interferir na sociedade? 

Werner Schünemann – Penso que essas iniciativas comunitárias são como o mundo deveria funcionar. Não podemos esperar tudo do poder público. Não acho que deva partir dos governos esse tipo de movimento. Eles têm de fazer o que a sociedade disser para fazer.

O PENSE é uma iniciativa das pessoas. Envolve vários segmentos da comunidade em torno de uma ideia fundamental para todos. Não existe família, profissão, atividade, segmento social que não tenha a presença do professor. Só há uma maneira de melhorar o mundo: se todos abraçarem as escolas.

Nossa implicância com o poder público tem bons motivos, mas também tem um pouco de preguiça. Não existe o governo fazer um projeto como o PENSE. Ele funciona melhor com a atuação comunitária, pois essas pessoas estão envolvidas, conhecem a realidade local e sabem o que deve ser feito.

Partindo da afirmação de que a sociedade tem de dizer ao governo o que fazer, como as decisões políticas interferem no processo educacional?

Schünemann – Eu inocento o poder público de muitas das queixas, pois elas acontecem por nossa culpa. Porque estamos elegendo os deputados errados. Estamos muito preocupados com a eleição para presidente, mas é no Congresso que estão sendo feitas as leis. Eles que estão aprovando. Lá que estão fazendo um país retrógrado.

No livro de Edir Macedo, chamado Plano de Poder, há o caminho para dominar a nação e eles vão tomar o poder. Não agora, daqui uns 15 anos. Eles querem ter 60% do Congresso. Pra que eleger presidente? Não precisa. O presidente envia o projeto, eles não votam. Só aprovam o que querem.

Sobre o papel do professor. Como a educação favorece um ambiente mais democrático, respeitoso e livre?

Schünemann – Com o professor, principalmente. O legal no PENSE é isso, ele se volta para o professor. Nas manifestações de políticos e de governantes, os discursos colocam o educador como mais um item. Se fala em construir escolas, em comprar computadores, melhorar o laboratório, no professor…

Não é assim. Pegamos o exemplo socrático, do professor caminhando na rua com os alunos. Nessa intervenção, ele está ensinando. Ele pode ensinar em um saguão, no pátio.

Agora coloca o aluno dentro do prédio. Em uma sala cheia de computadores. Ele não aprende sozinho. É momento de focar. De colocar o professor no topo da pirâmide de prioridades. Ele é o mais importante.

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Como tornar esse conceito realidade?

Schünemann – Não restringindo na docência. No currículo, nas exigências legais. Libertando o professor para as experiências humanas do aprendizado. A aula deve ter significado para o aluno. É uma experiência à vida.

Um exemplo bom é pensar sobre a autoridade. Há dois tipos: autoridade imposta e também a no sentido de reconhecer determinada pessoa. De valorizar o profissional. Essa autoridade deve ser concedida.

Isso consegue com crianças irriquietas e adolescentes cheios de hormônios por horas excessivas dentro de uma sala de aula? Sim é possível, pois são seres inteligentes. Rebeldes, sim. Questionadores, muito. Transgressores, espero que sim. Mas é possível estabelecer padrões.

Um cara da minha geração, de roqueiro, punk, escreveu que disciplina é liberdade. É verdade. Até a gente entender isso, disciplina é uma prisão. Mas o professor precisa mostrar a liberdade em termos de obrigações. Em cumprir horário, mas escolhendo o que nos faz bem.

Para tanto, temos de ter um professor estimulado. Não ser pressionado a dar conteúdo por que semana que vem tem prova.

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Como seria a escola ideal?

Schünemann – De tempo integral. O valor de uma escola se mede nas possibilidades extracurriculares. Tem de ter a Matemática, Português, Ciências. Mas também oferecer música, teatro, grupo de ecologia, esportes, design, clube de xadrez. Eu estudei em uma escola que tinha isso. Passei pelo atletismo, teatro. Lembro que nas quintas e sextas eu era liberado da aula para treinar porque tinha competição no sábado. Ou ia ensaiar porque tinha espetáculo.

A escola não fazia essas atividades como se fosse algo sem importância. Como se não tivesse mais nada para fazer. A escola participa e incentiva a presença do aluno naquele ambiente. A partir disso, um monte de gente conseguiu perceber o que gostava.

Nós não somos uma coisa só. Temos de trabalhar as aptidões. Não é só o trabalho. Pode se ter junto com isso um adulto, ter a pintura como hobby, ou a fotografia, ou a música. Tudo isso faz parte da educação. Claro que o conteúdo é importante. Mas com opções, até isso muda. A relação do aluno com a escola fica diferente.

E a relação família e escola?

Schünemann – A casa da criança não pode ser uma extensão da escola. A mãe não tem de ajudar a fazer o tema. Aprendizado não é castigo. Tema não é castigo. Estudar não é punição.

O melhor lugar do mundo para a criança é a família. Depois é o colégio. O dever tem que ser feito na escola. Em casa, é só o pai, a mãe. Dedicar o tempo ao convívio familiar.

Do contrário, o pai pega o tema e cobra. Ele não sabe ensinar, pois não tem didática. Daí ele ameaça com castigo. Isso não é didática, isso se faz com bois que puxam carroças.

A imersão tecnológica impacta nas salas de aula. Como o professor deve se preparar para isso?

Schünemann – No passado, nenhuma empresa, nenhum especialista, estudioso, governo antecipou a nossa relação com os celulares, ou como eles virariam ferramentas para o dia a dia. As previsões econômicas foram feitas sem isso. Agora, vamos adaptando e resolvendo no cotidiano e o professor recebe o problema na ponta. O aluno chega com a tecnologia e não sabemos como agir.

O Adair (Weiss, diretor-geral do A Hora) citou uma frase de Umberto Eco durante o lançamento do PENSE. “A internet deu voz aos imbecis”. Isso sempre ocorreu na civilização. A fofoca é uma categoria do comportamento comunitário. Pela Antropologia é um suporte para evitar o isolamento. É como quando uma vizinha vem lhe falar sobre algo pavoroso que o outro fez. Isso não se trata como verdade.

Na internet, isso virou, com meia dúzia de regras de redação jornalística, uma arma. Fazem manipulação de fatos, de eventos, justaposição de imagens, mudam significados. Penso que esse fascínio não vai durar muito.

O PENSE foi elaborado para valorizar o professor. Colocá-lo como protagonista. Como fazer isso? 

Schünemann – Queria fazer uma campanha. Equiparar o salário dos professores ao que ganha um juiz do STF. Pois o magistrado só chegou lá porque teve professores.

Não estamos dando a devida ênfase ao profissional de ensino no Brasil. Darcy Ribeiro (antropólogo, escritor e político) dizia que os problemas de ensino no país não são um problema, mas um projeto.

A elite, defende, projetou um ensino deficitário, com o sucateamento das escolas e a redução dos salários dos professores. Isso para entregar a educação para grupos de poder e eventuais iniciativas privadas.

Hoje, ao pensarmos, parece fazer sentido. Vejo que se tem mais investimento nos últimos 80 anos em estradas do que em educação.

Estradas são importantes, mas temos de colocar a educação como prioridade. As outras são paralelas e dessa maneira planejar os próximos 20 anos.


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Objetivo

• Criar uma rede de apoio aos professores
• Financiar projetos, programas de qualificação e premiação para professores, alunos e escolas
• Manter o ensino e educação em evidência, por meio de seminários, palestras e publicações

Prêmios

• Financiamento de projetos
• Viagens nacionais e internacionais
• Distinções para destaques no setor
• Cursos na universidade e institutos
• Concurso para alunos

Outras ações previstas

• Criação e publicação mensal do Jornal da Educação, com 15 mil exemplares e reportagens, entrevistas e artigos na área de ensino, saúde, financeira, psicologia, entre outros
• Site da Educação, uma página ou hotsite que ficará hospedado no portal do A Hora, com uma integração orgânica permanente para promover a interação ao programa

Filipe Faleiro: filipe@jornalahora.inf.br | Colaboração: Alexandre Miorim

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