Jovens eleitores diminuem 57% em dois anos

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Jovens eleitores diminuem 57% em dois anos

Em 2012, adolescentes de 16 e 17 anos representavam 2% dos votos na região. Para as próximas eleições, o coeficiente caiu para 0,9%. Cientista político, João Pedro Schmidt, avalia que o senso comum generaliza a classe política, afastando as pessoas do processo.

Vale do Taquari – A descrença com a classe política fez o estudante de Lajeado, Daniel Villanova, 17, optar por não fazer o título. “Os candidatos de hoje não merecem os votos dos jovens”, dispara. A pouca participação dos adolescentes no processo eleitoral pode ser confirmada pelos números. Os eleitores com 16 e 17 anos na região reduziram 3.212 em dois anos. Nos 36 municípios, o total de votantes nessa faixa etária era de 5.644 em 2012. Nas eleições deste ano, chega a 2.432, uma redução de 57%.

Frente ao total de eleitores na região, 269.119 conforme o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o percentual de jovens não chega a um (0,9%). Em 2012, quando a população apta a votar era de 269.345, menores de idade representavam 2% do universo eleitoral.

Para o também estudante Eduardo Henneman, 16, a desilusão atinge a população de outras faixas etárias também. “Acho que a maior parte dos brasileiros perdeu a esperança na política.” Na opinião do estudante, o principal motivo para isso seria ausência de mudanças significativas nos dilemas enfrentados pelo país.

Opinião semelhante à de Sabrina Nummer, 18. Ela fez o título de eleitor aos 17 anos, porque seria obrigada a votar de qualquer forma. “Se dependesse votaria.” Para ela, os políticos, utilizam a campanha para fazer promessas que depois são esquecidas ao longo dos mandatos. Por desinteresse, o estudante de Teutônia, Pedro Augusto Lima, 17, também resolveu ficar de fora do processo em 2014. Não gosta de falar de política, não acompanha os trabalhos dos agentes políticos e generaliza a atividade. “Existe muita corrupção, por isso não gosto.”

Diante desses argumentos, o cientista político e professor universitário João Pedro Schmidt aponta alguns possíveis motivos para o desinteresse dos jovens. Para ele, um dos aspectos está ligado às manifestações do ano passado.

Diante de uma pluralidade das demandas apresentadas nos protestos, os políticos não conseguiram atender as reivindicações, aumentando o descrédito da população com os representantes.

Aliado a isso, a falta de referências nos partidos provoca ainda mais afastamento do jovem na política, diz Schmidt. “As alianças políticas desconsideram aspectos ideológicos.

Hoje é uma necessidade para conseguir governar, mas confunde o eleitorado, que fica com uma noção de que todos são iguais e isto é péssimo.”

De acordo com o cientista político, essa queda na participação dos jovens é um fenômeno nacional. No Estado, aponta o TSE são cerca de 67 mil eleitores entre 16 e 17 anos, uma redução de 50% em comparação com 2012.

Título eleitoral na carteira

O estudante de Teutônia, Maicon Tiago Dickel completa 16 anos no dia 20. Incentivado pela família, fez o título e carrega na carteira. A situação política é um dos assuntos de maior interesse para ele. “Discutimos esses assuntos em casa.”

Para ele, a maioria dos adolescentes deixa de exercer esse direito pela falta de interesse no tema. “A juventude não tem consciência da diferença para a vida de todos escolher aqueles que governarão nosso país, Estado ou município”, frisa.

Adriane Gallas, 17, decidiu fazer o título de eleitor para sentir a emoção de votar pela primeira vez. “Não queria esperar fazer 18 anos e se tornar obrigatório.” Para fazer uma boa escolha, ela procura se manter informada dos assuntos sobre candidatos assistindo e lendo notícias de política. Já Henrique Pacheco, 16, não tem o hábito de acompanhar as notícias sobre política. Mas nessa primeira participação como eleitor, quer assistir todos os debates antes de definir quais os melhores candidatos para governar o país e o Estado.

Bruno da Silva Corrêa, 16, decidiu fazer o título de eleitor por acreditar na importância da participação das pessoas para a democracia. “Muita gente protesta contra o governo, mas não quer votar para que as coisas possam, de fato, mudar.” Ele acredita que os jovens têm o dever de opinar e fazer a parte deles nas decisões para uma sociedade melhor. “Precisamos encontrar políticos honestos que nos representem, mesmo sendo difícil.”

A juventude tem pouca disposição de participar, pouca experiência e pouco interesse”

2O professor e cientista político João Pedro Schmidt realizou uma pesquisa em 1999 sobre juventude e política na primeira década de eleições diretas. Para ele, quadro de descontentamento naquela época é similar ao de hoje.

A Hora: Com relação a essa queda de eleitores jovens, como podemos explicar esse fenômeno?

Schmidt: Em termos gerais, o único elemento de grande impacto, que foi importante no último período, foram as manifestações do ano passado. Os protestos engajaram a juventude em diversas cidades. Podemos apontar a desilusão deles frente à política nacional e também da expectativa de mais conquistas. É inegável que a população teve ganhos. A interpretação que podemos fazer é que alguns segmentos da população ganharam, mas não estão satisfeitos. Por exemplo, uma família que passou da classe D para a C. Antes, eles não tinham casa própria. Agora têm, mas querem mais. Sentem a importância das conquistas. Só que eles não atribuem isso a política, que continua sendo mal-falada apesar das mudanças.

Sobre os protestos do ano passado. Havia uma expectativa de maior participação do jovem nesta eleição. De que maneira as passeatas influenciam nesses números?

Schmidt: Difícil obter respostas convincentes. Exemplo das Diretas Já em 1984 e 1985. Foi um movimento forte e pontual. Então, mesmo que as eleições diretas tenham ocorrido em 1989, houve um sentimento que valeu a pena ir às ruas. Com o impeachment do Collor, a mesma coisa. Em suma, foram dois movimentos pontuais. No ano passado, por haver uma lista ampla e genérica de demandas, dificultou o atendimento por parte dos políticos. Aquilo que foi pontual, como a passagem urbana, teve êxito. Mas a resposta concreta dos governos foi percebida como insuficiente. Ficou a impressão: eu fui lá e não me ouviram. Fico com meu descontentamento e não vou mais participar.

Com as redes sociais, a participação em termos de opiniões sobre candidatos, postagens aumenta. Deste modo, como o senhor avalia a consciência política do jovem hoje?

Schmidt: Seguramente os jovens não mostram adesão à ideologia, ou mesmo a um partido ou grupo. Isto não é de agora. Faltam referências ideológicas e partidárias. Na internet, a pluralidade de opiniões endossa críticas inocentes. Ficam soltas em meio ao cenário, uma briga de estratégia

entre situação e oposição. Criado um ambiente de desencanto, qualquer coisa que parece crítica, alguns jovens endossam, e de maneira ingênua.

Por que eles estão desinteressados? É o modelo político que precisa melhorar, evoluir?

Schmidt: Deveria haver uma série de mudanças na reforma política. Reforço das políticas de consulta à população. Temos bom exemplo e este é o caminho. Aumentar a participação das pessoas e a internet faculta que o povo seja ouvido, ela tem de ter canais de expressão. Fortalecer o já existente e criar novos. Ir ao encontro dos jovens de uma forma inteligente. Sem dúvida, os jovens

descontentes gostariam de ser ouvidos. Ir ao encontro das pessoas, dos jovens, criar mecanismo para que eles falem e dar retorno aos anseios. Isto aprofunda a democracia representativa.

Como fazer para o jovem ter mais interesse com a política?

Schmidt: As escolas e universidades são um ambiente importante. Também temos as igrejas, fizemos um levantamento na Unisc. Avaliamos vários aspectos e um deles era interesse na política. Entre os mais destacados, estão as organizações religiosas. Este elemento é importante para dizer a forma das pessoas contribuir a uma sociedade melhor. Temos de aproveitar todos os canais existentes. As escolas, universidades e igrejas, sem desmerecer nenhum.

Vimos em uma publicação do senhor, Juventude e Política, uma avaliação sobre o cenário na década de 90. Quais as diferenças daquela época com hoje?

Schmidt: Naquele período, era a primeira década de redemocratização. Em 1999, data da pesquisa, percebemos um sentimento de frustração e descontentamento. Similar ao que ocorre agora. Naquele período, a frustração era agravada pelo nível de benefícios sociais menores do que agora. A juventude tem pouca disposição de participar, pouca experiência e pouco interesse. Não vejo grande diferença. Infelizmente, apesar das melhorias, o sentimento de rejeição continua muito agudo.

Na minha opinião, a grande mídia é uma das responsáveis por esse desencantamento da política. A cobertura baseada no espetáculo pega fatos isolados e amplia como se fosse regra. A tônica da mídia, formadora de opinião, é negativa. Casos como o Bolsa Família. O programa aparece nas notícias quando há um flagrante de desvio. Não se foca na sua importância na vida das pessoas. O mesmo não é dito quando há comprovação que o povo pobre usa de maneira consciente os R$ 200 que recebe por mês. Ninguém sabe que dois milhões de brasileiros voluntariamente saíram do cadastro porque conseguiram um emprego e estão recebendo mais. Isto é excelente. Mostra que as pessoas não querem o pequeno recurso. Que elas lutam e querem melhorar. Mas isto não vira manchete.

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