Busca pelo modelo ideal dura 27 anos

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Busca pelo modelo ideal dura 27 anos

Multas, reclamações e inadimplências perduram em um sistema de estacionamento que parece sem solução

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Gustavo Adolfo 1 - Lateral vertical - Final vertical

aEm janeiro de 1993, reportagens divulgavam o fim da cobrança de estacionamento rotativo iniciado oito anos antes. A nova gestão, liderada por Leopoldo Feldens, anunciava estudos para atender às reivindicações de comerciantes e motoristas. Mais de 19 anos depois, a comunidade ainda aguarda uma solução.

O atual modelo adotado pela União das Associações de Moradores de Bairros de Lajeado (Uambla) é questionado por motoristas e arguido pela Justiça. Um inquérito civil tramita no Ministério Público (MP) avaliando a concessão do serviço público sem processo licitatório. Na rua, as críticas de usuários são em relação à falta de orientação, demora na cobrança e falta de tolerância.

Só em julho foram registradas 103 autuações do Departamento de Trânsito contra motoristas que não pagaram no momento em que estacionaram. Destes, 71 saldaram dentro do prazo de sete dias a taxa de R$ 37,50 – correspondente a 30 horas de estacionamento – na Uambla para se livrarem da multa. Os demais foram multados em R$ 53,20 e levaram três pontos na Carteira de Habilitação.

Durante todo o primeiro semestre foram 1,1 mil autuações. Apesar de manter o mesmo sistema de cobrança desde 1996, muitos motoristas argumentam que desconhecem a obrigação de quitar o valor no momento de estacionar. A informação consta no site da Uambla e na Lei Municipal.

As placas que alertam os perímetros de cobrança não têm essa instrução. Pelo contrário, o aviso é sobre a obrigatoriedade do “uso de cartão”, modelo de cobrança extinto há mais de cinco anos. Vilmar Antônio Scheidt, de Teutônia, foi autuado na Av. Benjamin Constant. Pensou que bastava pagar no momento de sair. “Como vou adivinhar o sistema, venho pouco a Lajeado.”

Outra reclamação constante recai sobre o número de cobradores. Muitos reclamam de ofensas por parte dos motoristas. “As ofensas são piores quando são multados. Mas não temos culpa”, diz uma atendente que trabalha há meio ano. Hoje, são 48 trabalhando em 40 quadras da área central. A média é de seis mil atendimentos todos os dias.

Com o grande número de inadimplentes, que chega a 30% do total de usuários, a direção da Uambla afirma que inexiste recurso ou condições para contratação de novos funcionários, resultando em agilidade no serviço prestado.

Sobre as multas, a direção considera baixo o número, considerando o alto índice de não pagantes todos os dias. “Cerca de 1,8 mil não pagam e apenas 200 são multados”, diz o presidente da Uambla, Darci Pólis.

Uambla mostra evolução no atendimento

Mesmo diante de várias reclamações, a Uambla inovou no atendimento ao público nos últimos anos. A implantação de aparelhos eletrônicos pockets no lugar das antigas cartelas e a possibilidade de pagamento antecipado via internet ou na própria sede da entidade facilitam o processo. Hoje, cerca de três mil veículos estão cadastrados no sistema eletrônico de cobrança criado no início de 2011.

Pólis informa que as empresas podem solicitar o sistema de cobrança pós-pago. Ao se inscreverem, as corporações recebem boletos mensais de cada veículo de sua frota. “É uma forma de controlar os funcionários e evitar possíveis multas.”

Sobre a investigação do MP, a direção da Uambla argumenta que o convênio firmado com o Executivo atende aos requisitos da lei. “Não se trata de concessão, por isso é desnecessário licitação.” Ressalta que não há lucro financeiro, e a responsabilidade social é cumprida no momento em que a entidade proporciona o primeiro emprego a muitos dos atuais funcionários.

Inadimplências em Encantado e Venâncio Aires

Os problemas verificados em Lajeado são semelhantes em outras cidades. Em Encantado, o mesmo sistema de cobrança foi instituído em dezembro de 2011. O controle é da Associação Pró-Menor Encantado (Ame), que conta com sete funcionários e não precisou de licitação para assumir a gerência. Em sete meses de funcionamento, foram registrados 18,5 mil atendimentos. Cerca de 20% dos usuários continuam em débito.

Em Venâncio Aires, as semelhanças são ainda maiores com Lajeado. Naquele município, o MP também investiga possíveis irregularidades na concessão dos serviços. A entidade responsável é a União das Associações de Moradores de Venâncio Aires (Uamva).

A diretoria argumenta que, por se tratar de convênio, o processo licitatório é dispensável. Segundo a tesoureira Maristela Cetolin, a entidade também enfrenta problemas com inadimplência dos motoristas.

Parquímetro é solução em cidades maiores

Em Porto Alegre, onde a frota é superior a 750 mil veículos, o sistema de cobrança é feito por parquímetros. A EPTC é a gestora. Em média, 450 mil veículos utilizam a área azul da capital gaúcha. Segundo o assessor de imprensa Lucas Barroso, há uma tolerância de dez minutos para o motorista se locomover até o aparelho. “O tempo não pode ser usado para deixar o carro estacionado.”

Barroso comenta que a população entende a necessidade de rotatividade e democratização do espaço público, pois todas as áreas azuis estão em zonas de grande movimento. Quem deixa de pagar é multado e o veículo, guinchado. “Não há inadimplência, pois os casos de não pagamento são autuados.”

Histórico do estacionamento

30/12/1985

Lei municipal institui o estacionamento rotativo pago em vias públicas de Lajeado. Era o Executivo que gerenciava o processo com seis cobradoras. As cartelas utilizadas para cobrança eram vendidas no comércio. Responsável pela extinta Equipe de Trânsito e Transporte Coletivo (ETTC), José Ernani Líbio comenta que a inadimplência era comum na época. “As pessoas não estavam acostumadas.” As cobranças ocorriam apenas na rua Júlio de Castilhos e em algumas transversais.

19/11/1990

A exploração do serviço foi transferida para o Conselho Comunitário Pró-Segurança (Consepro). Em outubro de 1992, o preço, que era de Cr$ 200,00, passou para Cr$ 1.000,00, equivalente hoje a R$ 0,0003. O aumento fez com que o Consepro desistisse de seguir na gerência e, no início de 1993, quando assumiu um novo governo, a cobrança foi cessada. O empresário Nelson Noll era o secretário de Planejamento naquele ano. “As pessoas passaram a deixar seus carros estacionados o dia inteiro no mesmo local. Inclusive, donos de loja deixavam seus veículos em frente aos estabelecimentos.”

29/09/1993

Muda a lei, autorizando que o Conselho Municipal da Criança e do Adolescente (Comudical) passe a ser responsável pelo serviço.

17/01/1996

Nova lei disciplinou o estacionamento rotativo autorizando transferência da exploração para qualquer entidade assistencial, social, filantrópica ou privada. Assim, a Uambla assume a administração. Eram dez cobradores, e a ideia era utilizar os valores arrecadados para o pagamento de salário aos funcionários e investir em melhorias nos bairros. As cobranças ocorriam só na rua Júlio de Castilhos, no trecho entre as vias Pinheiro Machado e Borges de Medeiros.

27/02/2006

A lei autoriza o Executivo a transferir por convênio a exploração dos serviços à União das Associações de Moradores de Bairros de Lajeado (Uambla). Ainda são utilizadas cartelas para cobrança. São delimitadas áreas azuis nas ruas Júlio de Castilhos, Bento Gonçalves e Av. Alberto Pasqualini e principais transversais. No início os preços das cartelas eram de R$ 0,40 para meia hora e R$ 0,70. Os valores foram aumentados para R$ 0,75 e R$ 1,25 em 2007. As cifras são as mesmas até hoje.

Janeiro de 2011

Uambla substitui as cartelas de cobrança por aparelhos eletrônicos e institui o pagamento e inserção de créditos por meio de internet.

Maio de 2012

Após 16 anos com a concessão repassada para a Uambla, o Ministério Público (MP) inicia investigação para averiguar possíveis irregularidades no convênio com o Executivo, assinado pela primeira vez em 1996.

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