Pouca renovação e desinteresse dos jovens desafia setor logístico

VALE DO TAQUARI

Pouca renovação e desinteresse dos jovens desafia setor logístico

Média de idade dos caminhoneiros supera 44 anos. Empresas e organizações ligadas ao setor elaboram programas para despertar o interesse das novas gerações. No Vale do Taquari, são pelo menos 50 vagas em aberto dentro de transportadoras de médio e grande porte

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Pouca renovação e desinteresse dos jovens desafia setor logístico
Média de idade acima dos 44 anos interfere sobre renovação dos motoristas para transporte de cargas. Estratégia de empresas e organizações do setor é sensibilizar os mais jovens para o ofício (Foto: Filipe Faleiro)

“A gurizada não quer mais o caminhão. Ficar fora de casa, trabalhar o fim de semana. Isso não interessa eles”. As palavras do caminhoneiro Rogério Sulzbach, 63, resumem o quadro atual da mão de obra no setor logístico.

Com mais de 40 anos de profissão, se aposentou e continua na boleia. “Se não gostasse da estrada, já tinha parado”. Autônomo, hoje prefere fazer frete dentro do RS. Mas pelo histórico, o principal local de trabalho era o Nordeste. “Agora no máximo puxo grãos do Mato Grosso”, conta.

Assim como ele, Erich Fiegenbaum, 64, tem mais de quatro décadas de estrada. Chegou a Estrela nessa quinta-feira do Centro-Oeste do país. Descarregou a carga na manhã dessa sexta em Arroio do Meio.

Com a supersafra, destaca, há uma grande demanda para trazer milho do centro do Brasil às indústrias da região. “Está difícil conseguir motoristas. A aventura da estrada, conhecer lugares, pessoas, isso não faz mais diferença para os jovens”, realça.

Esse envelhecimento dos profissionais de transporte desafia empresas de logística. Na região, em parceria com organismos do setor, uma das iniciativas são programas para sensibilizar e despertar o interesse dos mais jovens pelo ofício.

De acordo com pesquisa da Confederação Nacional dos Transportes (CNT), a média de idade do caminhoneiro no país é de 44,8 anos.

No Vale do Taquari, a partir de acompanhamento do Sest/Senat em Lajeado, dos mais de 7,5 mil atendimentos de profissionais do volante na unidade.

A faixa etária dos 41 aos 50 corresponde a 25,6% dos serviços, entre cursos e atendimento em saúde. Logo em seguida, estão condutores de 31 a 40, com um percentual de 25,5%.

“Significa que a maioria dos nossos serviços são para motoristas de 31 a 50 anos. Isso demonstra que a realidade nacional se repete na nossa região”, avalia o gerente do Sest/Senat, Luciano Fontana.

O debate sobre desafios e oportunidades dos setores produtivos no Vale do Taquari faz parte do projeto RUMO – O futuro da mão de obra na região. Iniciativa promovida pelo Grupo A Hora, conta com o patrocínio de Cascalheira Stone Gard, Colégio Evangélico Alberto Torres (Ceat), Sicredi, Univates, Rhodoss Implementos Rodoviários, Construtora Diamond, Metalúrgica Hassmann, Instituto Dale Carnegie, Plano Digital, Governo de Estrela e Tomasi Logística.

Rogério Sulzbach (e) ao lado de Erich Fiegenbaum. Cada um tem mais de 40 anos de atuação como caminhoneiros (Foto: Filipe Faleiro)

Oportunidades

Dono de uma transportadora com uma frota de 13 caminhões, Renato Hochscheidt (conhecido como Scuby), 40, por vezes precisa deixar a gestão do negócio e voltar à cabine. “Essa semana, vou trazer uma carga do centro por que um funcionário pediu demissão e não consigo ninguém para substituir.”

Em um grupo com 35 transportadoras de médio e grande porte da região, há pelo menos 50 vagas para motoristas profissionais (habilitação C, D e E) nas empresas. Diretor da Tomasi Logística e vice-presidente do sindicato do segmento (Setcergs), Diego Tomasi, considera que a perda de interesse dos jovens pela profissão de motorista tem diversos fatores.

Passa pela construção de uma imagem de precariedade da atividade, da continuidade de discursos depreciativos, como por exemplo os caminhoneiros são “responsáveis” pelos acidentes. “No passado, ser motorista de caminhão era parte do sonho das crianças.”

O desejo de viajar e conhecer lugares começou a ser substituído pela tecnologia. É o que afirma a diretora da Sulati, Liselena Bersch Neumann. “Hoje os jovens conhecem pessoas, podem visitar cidades, tudo na frente do computador. Não é a mesma coisa, mas ficar longe de casa por muito tempo é um empecilho para atrair interessados.”

Início tardio e o custo

Por lei, a habilitação para dirigir motocicleta e carro pode ser feita com 18 anos. No transporte de cargas, é preciso mais um ano de experiência de CNH para o evoluir ao tipo C. Depois mais doze meses para a D e igual período para o tipo E.

Significa que o condutor só estará pronto para começar a trabalhar quando tiver mais de 21 anos, isso se cumprir todos os requisitos, como não cometer infração grave de trânsito, não ser multado ou se envolver em acidente.

“Caso dê tudo certo, será que jovem vai esperar? Vemos que ele assume outro trabalho neste tempo.”, realça o gerente do Sest/Senat, Luciano Fontana.

Além disso, o alto investimento. Todo o processo custa em torno R$ 10 mil. “A habilitação é muito cara. Hoje, nas condições em que as famílias estão, quem pode esperar para começar a trabalhar nas estradas até os 21, 22 ou 23 anos e pagar tudo isso? Precisamos de iniciativas para facilitar esse acesso, quem sabe uma parceria público-privada para incentivar a formação de motoristas profissionais”, frisa Diego Tomasi.

Busca por soluções

Na Sulati, empresa de Arroio do Meio, uma das iniciativas é o programa de escalonamento para atrair os mais jovens. “Eles começam como auxiliar dos motoristas. Conhecem a profissão, vivenciam o dia a dia. Fazem viagens ao lado do caminhoneiro”, conta Liselena.

Com tempo, experiência e aperfeiçoamento, o assistente avança e pode se tornar motorista. “O desempenho desse candidato quem avalia é o motorista principal. Ele age como um tutor, um mentor dos auxiliares.”
Desde o início do projeto, relembra a gestora, muitos funcionários acenderam dentro da empresa.

“Formamos novos motoristas. Também temos quem deixou a direção e hoje são vendedores, ou se tornaram representantes comerciais. Desse modo, a cadeia funcional segue na organização e conseguimos reposições.”
No Sest/Senat, o ano tem sido dedicado para programas voltados a sensibilização dos jovens. Em conjunto com empresas do setor, há em andamento aulas dentro do Jovem Aprendiz. Nos encontros, são organizados diálogos com os motoristas.

Os alunos também conhecem o veículo, a tecnologia embarcada, o funcionamento e detalhes sobre a vida dentro do caminhão. “Com essa convivência e integração, conseguimos cativar alguns jovens. Tanto meninos quanto meninas disseram que gostariam de seguir a profissão”, diz Fontana.

“Fizemos encontros similares na Sulati. Nos reunimos com turmas do 8ª ano. Eles entram em caminhões e avaliam o ponto cego junto com o instrutor. As crianças ficam encantadas com a experiência de entrar no veículo”, destaca Liselena.

Perfil do caminhoneiro

Pesquisa da CNT aponta detalhes sobre a atuação dos profissionais de transporte no país

O motorista tem em média
44,8 anos

Renda mensal média
R$ 4.609,35

Idade média do veículo
15,2 anos

Tempo de profissão
18,8 anos

67,8%
atuaram em profissões anteriores antes de serem caminhoneiros

Rendimentos
55,7% dizem que a situação financeira melhorou com a profissão

Outras iniciativas

  • Ações em escolas com atividades envolvendo trânsito e motoristas;
  • Atividades práticas, como dirigir um kart educativo com sinalizações e regras de trânsito;
  • Proposta de redução dos custos para obtenção da CNH profissional;
  • Projeto “Motorista de Futuro” e “Mais Motoristas”, feitos em parceria com o Sest/Senat;
  • Programa para troca de categoria de CNH custeada e treinamento;
  • Enfatização do futuro promissor da profissão de motorista;

Rotina de trabalho

  • Rodam em média 8,5 mil quilômetros por mês
  • Trabalham em média 11,5 horas por dia
  • Cerca de 5,7 dias por semana

Entraves

  • Assaltos e roubos 64,6%
  • Custo do combustível 35,9%
  • Valor do frete 27,4%

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