Legalização avança em Brasília e divide opiniões na sociedade

JOGOS DE AZAR

Legalização avança em Brasília e divide opiniões na sociedade

Câmara dos deputados aprovou projeto que possibilita o funcionamento de cassinos, bingos, jogo do bicho e apostas em corridas de cavalos. Proposta agora vai ao Senado. Bolsonaro sinaliza possível veto. Liberação pode resultar em arrecadação de R$ 20 bilhões por ano ao país

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Legalização avança em Brasília e divide opiniões na sociedade
Tema divide opiniões na sociedade. De um lado, regulamentação retira práticas da clandestinidade e gera retorno aos cofres públicos. De outro, jogos podem causar vício e facilitar lavagem de dinheiro

Após décadas de proibição no país, a legalização dos chamados jogos de azar avança no Congresso. Nesta semana, a câmara dos deputados concluiu a votação do projeto de lei. A medida inclui a permissão para funcionamento de cassinos, bingos, jogos online, jogo do bicho, entre outros. Agora, a proposta vai para apreciação do Senado.

Polêmico, o projeto teve votação apertada no plenário da câmara, com 246 votos favoráveis e 202 contrários. Se passar pelos senadores, caberá ao presidente Jair Bolsonaro decidir pela liberação dos jogos. Entretanto, ele já sinalizou que irá vetar a proposta.

A tentativa do Congresso em levar adiante a discussão não é recente. A proposta aprovada essa semana foi apresentada originalmente em 1991. Voltou a ser debatida em outras oportunidades. Só no ano passado que a tramitação da legalização dos jogos de azar avançou de forma significativa.

Para os defensores da proposta, o argumento que prevalece é o de que a legalização das modalidades vai gerar milhares de empregos diretos e aumentar a arrecadação de estados e municípios. Por outro lado, os contrários consideram a tributação aprovada baixa e também alertam para as consequências aos jogadores viciados.

Penalidades

O projeto também prevê penalidades administrativas passíveis de serem aplicadas e proibições às operadoras de jogos que praticarem atos ilícitos. As multas podem chegar a até R$ 2 bilhões.

A tributação sobre a exploração de todos os tipos de jogos será na forma da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide). A base do cálculo é a receita bruta, considerada como a diferença entre o total de apostas feitas e o total de prêmios pagos, desde que positiva.

Quanto à arrecadação, 68% serão distribuídos para fundos, programas e ações na defesa de áreas diversas. Os 32% restantes vão para estados e municípios. Ao Ministério da Economia, caberá implantar a taxa de fiscalização, com recolhimento trimestral.

Ponto e contraponto

Para o deputado federal Elvino Bohn Gass (PT), que votou contra, há discussões mais importantes neste momento em nível nacional. “Sobre questões como a seca, não se movimentam. Agora querem regularizar jogos de azar. Deveria ser feito um debate mais amplo sobre, pois hoje não estamos preparados para isso. Vai parecer mais a oficialização da lavagem de dinheiro”, pontua.

Já o deputado Alceu Moreira (MDB) lembra que os jogos já existem no país, de forma clandestina, e, geralmente são focos do crime organizado. “Com a legalidade, possibilita muitas coisas. Sei das consequências para quem tem vício. Mas votei a favor para que fique visível aos olhos do estado e usarmos recursos dos tributos para financiar políticas públicas importantíssimas ao país”.

Poucas apreensões

Titular da Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento (DPPA), o delegado Augusto Cavalheiro Neto diz que não ocorreram operações relacionadas aos jogos de azar nos últimos meses na cidade. Na passagem anterior à frente da DPPA, ele atuou no fechamento de dois bingos clandestinos em Lajeado.

“O mais recente foi no bairro Hidráulica, em 2017. Teve também um na Júlio May, em 2015. Antes chegava muita denúncia para nós. Mas nos últimos tempos diminuiu isso, inclusive pelo Disque-Denúncia. Desde que voltei, não tivemos ações neste sentido”, comenta.

Contudo, o delegado ressalta que as ações podem ocorrer mesmo sem que sejam recebidas denúncias de atividades clandestinas. “Se tomamos conhecimento do fato, devemos agir. Mas, neste cenário de escassez de recursos humanos, nos concentramos nos crimes mais graves”.

“Jogador patológico”

Estima-se que um em cada 10 jogadores frequentes sejam viciados em jogos. Conforme a médica psiquiatra Luiza Lucas, são pessoas que prejudicam suas vidas, passam muito tempo envolvidas na atividade e apostam quantias crescentes para alcançar a emoção desejada. Isso pode fazer a situação sair do controle.

“O jogo muitas vezes aparece como forma de se aliviar da ansiedade ou se distrair de tristezas. Quando a pessoa perde dinheiro, segue jogando com o objetivo de reverter as perdas. Isso leva ela a mentir aos familiares para esconder o quanto jogam, e afeta também seus relacionamentos”, frisa.

Para Luiza, a liberação dos jogos tende a afetar sobretudo adolescentes e idosos. “Pessoas que abusam de substâncias como álcool, cigarro e drogas também tem muito mais chance de ficar dependente dos jogos. Se pensarmos no jogo patológico assim como no tabagismo, aumentar os locais para jogo aumenta o número de jogadores patológicos, assim como facilitar a prática do tabagismo aumenta os tabagistas”.

O QUE A PROPOSTA AUTORIZA:

CASSINOS
Poderão ser instalados em resorts como parte de complexo integrado de lazer, em localidades classificadas como polos ou destinos turísticos, e também em navios. Cada grupo econômico pode deter apenas uma concessão por estado;

BINGO
Texto permite a exploração apenas em casas de bingo, além de estádios com capacidade acima de 15 mil torcedores. Será credenciada, no máximo, uma casa de bingo a cada 150 mil habitantes. Poderão funcionar até 400 máquinas de videobingos num mesmo local. Caça-níques são proibidos;

JOGO DO BICHO
Todos os registros devem ser informatizados e com possibilidade de acesso em tempo real pela União. Poderá haver, no máximo, uma operadora a cada 700 mil habitantes do estado. Resgate dos prêmios até o limite de isenção do imposto de renda não precisará de identificação do apostador.

APOSTAS EM TURFE As apostas em corridas de cavalo dependerão de consentimento prévio do Ministério da Economia em vez da Comissão da Criação do Cavalo Nacional. Além das apostas em corridas, as entidades turfísticas poderão ser licenciadas para explorar jogos de bingo e vídeo-bingo.

Histórico dos jogos no país

• A história dos jogos de azar no país remete ainda aos tempos de Brasil Império. Nas primeiras décadas após a proclamação da República, foram proibidos. Na década de 1920, porém, os cassinos foram liberados em estâncias turísticas;

• Mesmo com a liberação na época, muitos cassinos foram fechados por decisões judiciais e por governadores que eram contra a atividade. Na década de 1930, no governo Getúlio Vargas, o país viveu a “década de Ouro” dos cassinos;

• A proibição definitiva dos jogos de azar foi estabelecida em 1946, pelo então presidente Eurico Gaspar Dutra. O argumento utilizado, de que o jogo era “degradante ao ser humano”, teve forte influência da primeira-dama, ligada à Igreja Católica;

• A última partida de roleta legalizada no Brasil ocorreu em 1946, no cassino do Hotel Copacabana Palace. Estima-se, que à época, o país tinha 71 cassinos que empregavam até 60 mil pessoas de forma direta e indireta;

• Em 1993, no governo de Itamar Franco, uma lei, conhecida como “Lei Zico”, autorizou a retomada dos bingos promovidos por entidades esportivas, com a finalidade de angariar recursos para o fomento do esporte;

• Cinco anos depois, foi autorizada a instalação de bingos em todo território nacional. Já em 2000, a exploração do jogo tornou-se exclusiva da União, por meio da Caixa Econômica Federal. A proibição definitiva veio em 2001.


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