O nascer do sol pode ser visto de diferentes lugares por William Spessatto e Maya Jurisic. Isso porque, em 2018, o casal comprou um motorhome e decidiu “pegar” a estrada. Ele de Nova Bréscia e ela da Croácia, encontraram na Itália o lugar para iniciar esse sonho, e há três anos fazem parte dos diversos viajantes que escolheram trocar o conforto e a estabilidade de um endereço fixo para viver de forma nômade e conhecer diversos lugares pelo mundo.
William, o “Ika”, e Maya demoraram a se acostumar com a vida na estrada. Afinal, viver em uma casa ambulante tem seus desafios. Entre eles, o acesso a internet, necessário para o trabalho de forma online, e encontrar locais para estacionar o motorhome nas grandes cidades, além do risco de assalto.
Muitos lugares também não possuem água para abastecer o carro ou local adequado para despejar a água suja. Mesmo assim, para eles, as dificuldades são poucas perto dos benefícios dessa vida nômade que compartilham no perfil.
“Se pudesse colocar em uma palavra essa experiência, seria liberdade. Acordar em um lugar diferente todos os dias, conhecer a diversidade, as culturas, é uma vida que te deixa feliz por simplesmente acordar”, acredita Ika.
Desde que iniciaram a aventura, tinham um plano de visitar 100 países em cinco anos. Até agora, entre os lugares que conheceram, estão Itália, San Marino, Suíça, Liechesteinsten, Áustria, Eslováquia, República Tcheca, Polônia, e outros mais de 30 países.
O próximo destino nos planos do casal era o norte da Ásia, passando pelos países da antiga União Soviética até a Mongólia, viagem adiada com a pandemia. Hoje o motorhome está estacionado em uma casa alugada no sul da Itália, e o casal espera o primeiro filho. Assim que as fronteiras abrirem, a ideia é voltar à estrada e levar o pequeno com eles por mais algum tempo.
Uma oficina de motorhome
Para viabilizar o sonho dos viajantes, uma oficina em Taquari transforma ônibus, vans e outros automóveis em motorhomes. Nas garagens da Popó Home, Rodrigo Saldanha tem nove veículos em produção.
“A gente compra o automóvel ou o cliente larga aqui. Na maioria das vezes é comprado ônibus rodoviário que transita com passageiros, então a gente arranca tudo o que tiver, os bancos, assoalhos, lataria, modificamos os fa
róis, para então começar a transformação”, explica Rodrigo.
Desde 2012 na profissão, o taquariense estima que já fez mais de 40 motorhomes e adaptações como os baús dos caminhões. O trabalho dele não é divulgado nas redes sociais, mas a própria clientela indica a oficina para outros viajantes.
Durante a pandemia, a procura pelos serviços de Rodrigo tem aumentado, mas principalmente para o comércio, já que o custo da transformação é mais barato. Segundo ele, um ônibus, por exemplo, custa, em média, 50 mil reais, e a montagem custa cerca de 120 mil. Com a colocação dos ítens necessários, como cama, cozinha e banheiro, cada veículo leva entre três e quatro meses para ser finalizado.
Mas nenhuma produção é igual a outra. O trabalho exige criatividade para atender o desejo dos clientes que são variados. Muitos deles querem o motorhome para rodeios e levam as famílias. Ou
tros fazem disso um negócio e revendem depois da transformação de Rodrigo. Para outros, ainda, o motorhome é realmente a nova casa, e o espaço interno do veículo é adaptado para abrigar tudo o que é necessário para se tornar um lar.
Entre os clientes da oficina, está o casal Marinês e Clineu da Silva que, natural de São Lourenço do Sul, encontrou em Taquari, além de uma família, o que precisava para realizar o sonho de viver na estrada.
Motorhome: Cada dia um quintal diferente
Clineu era motorista de caminhão e viajava pelas estradas nacionais há anos. Foi nessas andanças que conheceu a esposa Marinês. Formanda em arquitetura, ela acompanhava o marido nas viagens e se encantou pelos caminhos que percorreram.
“A estrada é libertadora. Tu tem a possibilidade de cada dia vivenciar uma experiência diferente. Conhecer pessoas de várias etnias, com outras culturas. Isso sempre nos encantou”, conta Marinês.
Acostumados com a vida na estrada, a vontade de deixar o apartamento alugado para viver em um motorhome era um sonho que eles passaram a compartilhar e que foi reforçado com a pandemia.
Da aquisição do veículo à transformação em motorhome, o processo levou cerca de quatro meses e teve um investimento de 150 mil reais. No interior, foi colocado um quarto, ar condicionado, cama de casal, TV, armários aéreos, banheiro com chuveiro a gás e água quente. Na cozinha, um frigobar, microondas, forno elétrico e tomadas para os eletrodomésticos. Toda a iluminação é feita com led.
O veículo também tem sofá e um espaço para os dois gatos que se mudaram com o casal. Na área externa, é possível montar uma pequena varanda, com um fogão, mesa portátil e cadeiras, onde o casal costuma tomar café da manhã e assistir ao nascer no sol.
É tudo reduzido na “nova casa” e mesmo as louças ocupam o menor espaço possível. Hoje o casal não possui um endereço fixo, e quando precisam receber correspondências ou encomendas da internet, utilizam o endereço da família e amigos.
A primeira saída com o motorhome, chamado Casa M e Silva, foi para São Lourenço do Sul. Hoje estão no extremo sul do estado, em Santa Vitória do Palmar. O próximo destino nos planos do casal é o Uruguai e Argentina, antes de subir para o nordeste. “Não temos um período específico para viver dessa forma. O tempo vai nos dizer”, afirma Marinês.
De carro pelas estradas do país
Muitos viajantes optam por pegar o próprio carro para percorrer o país ou atravessar as fronteiras. Entre eles, o morador de Lajeado Felipe Manfroi, que passou sete meses na estrada com o Honda FIT 2013. O carro, espaçoso e econômico é carinhosamente apelidado de Roy, em homenagem ao Fitz Roy, uma famosa montanha na Patagônia Argentina.
Além de fotógrafo de casamento, Manfroi é sócio em uma empresa de viagens, duas áreas muito afetadas pela pandemia. Trancado no apartamento, ele queria estar na natureza e decidiu sair em busca de novos destinos nacionais para a empresa.
Desde que saiu de Lajeado, rodou por dez estados brasileiros, e passou pela região dos cânions gaúchos e catarinenses, Chapadas dos Veadeiros (GO) e Diamantina (BA). Também andou por quase todo o litoral da Bahia até São Paulo.
“Com o agravamento da segunda onda da Covid, optei por voltar para casa. Pretendo ficar dois ou três meses pela região. Se as fronteiras abrirem, vou para o Chile ou Argentina, caso contrário, subirei para o norte do Brasil, novamente de carro”, conta o viajante.
Manfroi deitou os bancos do veículo e uma chapa de madeira foi colocada para nivelar o espaço. Em cima fica o colchão e é ali que ele passa as noites durante a viagem. O carro também leva o fogareiro, mesa e chuveiro portátil, saco de dormir, alguns leds e outros equipamentos.
A falta de uma geladeira, banheiro, energia elétrica e local fechado para banho são os pontos negativos ao viajar de carro. Mas campings e postos de combustíveis podem resolver o problema.
Por outro lado, os benefícios são incontáveis. “Pude dormir de frente para o mar, na beira de cachoeiras, no alto de montanhas, no meio do mato. Antes, eu acumulava muito mais do que precisava e morando em um carro, aprendi que preciso de poucas coisas para viver bem e feliz. Mas é importante realizar viagens menores antes de embarcar em um grande projeto”, acredita.
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