Médium arrasta multidão para ginásio

Vale do Taquari - crença e esperança

Médium arrasta multidão para ginásio

Hamilton Júnior esteve em quatro cidades na semana passada e reuniu mais de oito mil pessoas

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Médium arrasta multidão para ginásio
Vale do Taquari

Sentado diante da multidão, os olhos fechados e a cabeça baixa escorada sobre a mão esquerda, Hamilton Junior se concentra. Na mão direita uma caneta, à sua frente, uma pilha de folhas brancas. E as cartas começam a chegar.

É a sétima passagem de Hamilton Júnior pelo Vale do Taquari. Ele passou por Encantado, Taquari, Lajeado e Cruzeiro do Sul, reunindo mais de oito mil pessoas. A primeira vez em que o jovem paraibano de 22 anos pisou em solo gaúcho foi em março de 2017. Apenas 17 pessoas estiveram em Cruzeiro do Sul para conhecer o trabalho do médium. Adriana Pessi fazia parte dessa seleta plateia, chegou lá a convite de uma amiga.

Dois meses depois, Hamilton voltou à região e ela compareceu de novo. Dessa vez, recebeu uma carta psicografada pelo médium. “Eu recebi carta da minha mãe falecida faz 24 anos. Eu nunca tinha conversado com ele”, relata.

Adriana Pessi

Convencida pelo trabalho, Adriana foi atrás de doações para garantir mais uma visita. “Na segunda vez, eram 50 pessoas, na terceira, 400, depois, 800, 900 pessoas. Na semana passada, em Encantado, deu mais de duas mil na primeira noite e três mil na segunda”, conta.

Cartas dos filhos mortos

Na tarde desse sábado , Hamilton Junior se apresentou no ginásio municipal de Lajeado. Quase 1,5 mil pessoas lotaram a quadra e as arquibancadas. Adriana conta que a maioria das pessoas vêm na esperança de receber uma carta de um parente morto. Muitas são mães que perderam os filhos. Os curiosos e, em menor número os desconfiados, também compõem o público.

Uma destas mães é Vanda. Quando descobriu a psicografia, ela era “evangélica daquelas bem evangélicas”, define. O desespero da perda do filho, que morreu de câncer aos 33 anos, a fez buscar outro caminho, o espiritismo.

Vanda da Silva

Na carta, além das informações que indicavam a autoria e de mensagens de tranquilidade para a família, vinha também um pedido para que a mãe estudasse a doutrina espírita. Desde então, já recebeu cinco correspondências. “Cada uma trazia detalhes diferentes.”

Em uma delas, o número do CPF do filho foi apresentado como comprovação de que era ele quem estava passando a mensagem. Vanda diz que busca questionar a veracidade da psicografia e estudar a respeito e acredita que o médium não teria acesso aos detalhes da vida familiar que estão contidos nas cartas.

“Ninguém ali sabia quem era eu ou meu filho. A carta veio com riqueza de detalhes, falava da minha falecida mãe, dos meus dois netos. Ele falou até o nome do médico que fazia a quimioterapia”, afirma.

Ginásio lotado em uma tarde quente

Do lado de fora, a temperatura passava dos 30ºC. Dentro, o calor era ainda mais intenso. As placas dos automóveis indicam que o público vem de diversas cidades do Vale: Travesseiro, Taquari, Cruzeiro do Sul, Santa Clara do Sul, entre outras. O público chega carregando cadeiras de praia. São jovens, adultos, idosos. Cristãos, evangélicos, espíritas.

Ao fundo, Hamilton autografa o livro Reencontros e Despedidas, escrevendo dedicatórias a cada integrante de uma longa fila que se renova sem parar. A publicação foi lançada em agosto. O médium afirma que não ter ideia do número de exemplares comercializados, mas, segundo a organização do evento, foram cerca de 250 a R$ 30 cada apenas no sábado.

Metade do valor é doada para instituições de caridade e o restante serve para custear os eventos. As reuniões são gratuitas, apenas é sugerida a doação de um quilo de alimento. Mais de 20 toneladas foram arrecadadas nas visitas do religioso à região.

Em sua sétima passagem pelo Vale do Taquari, médium que psicografa cartas dos mortos lotou ginásios em quatro cidades . Na primeira quinzena de dezembro, Hamilton volta à região

Em sua sétima passagem pelo Vale do Taquari, médium que psicografa cartas dos mortos lotou ginásios em quatro cidades . Na primeira quinzena de dezembro, Hamilton volta à região

“Sou só uma caneta de Deus”

Apesar da grande comoção em torno da sua presença, Hamilton faz questão de relativizar sua importância. “Eu sou somente uma caneta de Deus, um servo de Jesus, um meio para escrever estas mensagens. Não sou de suma importância. Se eu não fizer, outro faz”, afirma.

Após a sessão de autógrafos, a reunião é aberta com uma rápida palestra. Em seguida, o médium se concentra e começa a psicografar. “Os espíritos se aproximam de mim organizados pelo meu mentor espiritual, um padre chamado Vicente. Ele organiza a fila e neste momento eu começo a ouvir. Às vezes eu escuto a própria voz do familiar falando comigo, outras vem só um pensamento”, explica. Ele afirma que fica quase totalmente inconsciente e que não sabe o que está sendo escrito nas cartas.

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Durante a psicografia, é proibido conversar na plateia. Algumas pessoas fecham os olhos e rezam, outras os mantêm abertos e atentos às cartas que vão sendo escritas em forma de quatro ou cinco rabiscos ilegíveis por folha.

Sentada junto ao médium, Adriana Pessi vira as páginas conforme são escritas. Cada correspondência tem cerca de 20 folhas. A caneta solta sobre a mesa é um sinal de que a carta está pronta. Há sessões em que são escritas cinco cartas, em outras, 17.

Após 30 minutos, Hamilton volta do transe e começa a ler as mensagens. Os textos trazem desde informações genéricas e palavras de conforto até detalhes sobre a morte do ente querido e nomes de pessoas do convívio da família.

Fernanda Vetorello de Fracenschi

Próxima visita

A primeira carta da sessão foi para a família que trabalhava na copa durante o evento. O médium anuncia o nome do remetente – Artur Vetorello – e chama os parentes. Fernanda Vetorello de Fracenschi se aproxima chorando. O filho morreu ainda bebê, oito anos atrás. “Eu vim com a esperança, mas sabendo que se fosse para mim ela viria e veio como um presente”, afirma.

Espírita, Fernanda sempre acreditou em uma sequência da vida após a morte, mas somente agora se sentiu à vontade para tentar algum tipo de comunicação com o filho. Foi ao encontro com seus pais. Bastante emocionada, ela afirma ter certeza de que se trata de uma mensagem do filho, pois a mensagem respondia a perguntas que ele havia feito mentalmente enquanto rezava.

De origem evangélica, e com formação em Teologia, Hamilton se decepcionou com a igreja e ingressou no espiritismo. Descobriu sua mediunidade em 2016 em um centro espírita. Desde então, já viajou por todos estados do país. Em um primeiro momento, ele confessa ter ficado impressionado e assustado. Hamilton é carismático, fala de forma tranquila com sotaque da Paraíba e cita frases de Chico Xavier.

Na presença do médium paraibano em Lajeado, mais de 250 livros psicografados foram vendidos. Famílias também fizeram fila em busca de um autógrafo

Na presença do médium paraibano em Lajeado, mais de 250 livros psicografados foram vendidos. Famílias também fizeram fila em busca de um autógrafo

“Sou uma pessoa normal, que tem uma vida. Essa comunicação só acontece quando os espíritos querem. Chico costumava dizer que o telefone toca de lá pra cá, nós somos apenas instrumentos”, afirma.

A próxima visita dele à região será na primeira quinzena de dezembro.

Matheus Chaparini: matheus@jornalahora.inf.br

 

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