Crime e castigo

Opinião

Ney Arruda Filho

Ney Arruda Filho

Advogado

Coluna com foco na essência humana, tratando de temas desafiadores, aliada à visão jurídica

Crime e castigo

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O título remete ao romance do escritor russo Dostoiévski, publicado em 1866. Crime e Castigo conta a história de um jovem estudante pobre, Ródion, que mata a golpes de machado uma senhora idosa, por sinal agiota, a quem ele devia dinheiro e por quem se sentia explorado.
A velha Aliena, nome da tal senhora, humilha e tortura psicologicamente os clientes desesperados, dos quais cobra juros astronômicos e por quem não demonstra qualquer piedade. O jovem estudante convence a si mesmo que não é tão errado matar uma pessoa tão maldosa e cruel, de quem o mundo não sentirá falta.
O crime, no entanto, torna-se um duplo homicídio quando ele é surpreendido pela presença de Lisavieta, irmã mais nova da velha agiota, que também é morta com golpes de machado. Apesar de escapar impune, o personagem começa a sofrer com a culpa e com a tensão dos seguidos interrogatórios feitos pelo juiz do caso.
Na brilhante narrativa, Dostoiévski aproxima o leitor do dilema do protagonista: negar o crime e viver atormentado pelo remorso ou confessar os assassinatos para ter a chance de redenção?
Influenciado pela religiosidade de Sônia, prostituta miserável por quem acaba apaixonado, Ródion confessa as atrocidades e é condenado a oito anos de prisão na Sibéria, onde começa sua reabilitação moral e seu provável caminho de ressocialização.
Passados mais de 150 anos da publicação da obra, a vida segue imitando a arte e as sanções legais aos infratores aumentaram consideravelmente. As sociedades, os valores e as próprias noções de ética sofreram absurdas transformações.
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No Brasil, editaram a Lei dos Crimes Hediondos, agravando as punições e enquadrando-as no regime fechado. A Lei dos Crimes do Colarinho Branco e outras tantas criminalizando condutas que não importam diretamente em violência física possibilitaram colocar na cadeia gente que não passava nem perto dela. Ainda assim, a sensação que temos é que nada resolve, nem aumentar as penas, nem prender efetivamente. Parece que a coisa só piora, que a galera “tá nem aí” e segue faceira, como se não houvesse amanhã.
Mais perto da gente, um ex-prefeito e integrantes do primeiro escalão do governo atual são presos e acusados de diversos crimes, entre eles, de fraude em licitações. Isso tudo em época de operação Lava-Jato e condenação de ex-presidente da República a 12 anos de prisão por supostos crimes de lavagem de dinheiro e corrupção.
Mais perto ainda, um cidadão insatisfeito com o atendimento recebido em um hospital ateia fogo no nosocômio, atentando gravemente contra o patrimônio, interrompendo serviços de urgência e colocando em risco a vida e a saúde de inúmeras pessoas. O cara já é réu num processo por homicídio e foi preso preventivamente.
Ródion foi condenado a oito anos de prisão, Lula a 12, Brönstrup sabe-se lá a quantos. E o incendiário do HBB, que pelo ato praticado efetivamente representa um grande risco à sociedade, pode pegar de três a seis anos, certamente a menor das penas. A dúvida que para mim fica é onde começa, de fato, a reabilitação moral e o tal caminho de ressocialização. Se é que começa …


Lei do Depoimento Especial entra em vigor

Uma nova forma, mais humanizada e protegida de ouvir crianças e adolescentes que sofreram violência sexual, a Lei do Depoimento Especial (Lei n° 13.431/2017), entrou em vigor ontem, 5, em todo o país.
A partir de agora, as vítimas deixam de ser ouvidas nos ambientes formais das salas de audiências para serem acolhidas em separado, tendo o depoimento gravado por profissional habilitado, evitando situações de constrangimento e o processo de revitimização.
A forma de escuta especializada que entra em vigor surgiu por iniciativas das autoridades judiciárias do RS. Depois de ouvir o relato impactante de uma criança abusada sexualmente por um adolescente, em uma audiência judicial realizada na forma tradicional, o então juiz de Direito do 2º Juizado da Infância e Juventude de Porto Alegre, José Antônio Daltoé Cezar, decidiu que algo deveria ser feito para mudar essa realidade.
Até agora, segundo o magistrado, “a vítima ficava no mesmo ambiente da audiência. Sofria esse embate direto das perguntas e dos filtros que, muitas vezes, eram colocados. A situação de constrangimento e de sequelar ainda mais quem estava naquela condição era óbvia. E volta e meia o resultado que se tinha dessas audiências era nenhum, era o silêncio”.


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Na falta de filhos, companheira herda tudo

Nos casos de ausência de descendentes ou ascendentes, é garantido à companheira o direito de recebimento dos bens deixados pelo companheiro falecido, ressalvada a existência de manifestação de última vontade.
Portanto, o direito da companheira sobrevivente prepondera em relação aos parentes colaterais, como irmãos, tios e sobrinhos, em virtude da ordem legal prevista pelo Código Civil.
O entendimento foi fixado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao negar provimento ao recurso especial de parentes de quarto grau contra acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), que reconheceu à companheira o direito à totalidade da herança do falecido, incluídos os bens adquiridos antes do início da união estável. “Não há mais que se considerar a concorrência do companheiro com os parentes colaterais, os quais somente herdarão na sua ausência. O artigo 1.790, III, do Código Civil de 2002, que inseria os colaterais em terceiro lugar na ordem de vocação hereditária, não subsiste mais no sistema”, apontou o relator do recurso especial, ministro Villas Bôas Cueva.
Segundo o ministro, em maio de 2017, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil, que estabelecia a diferenciação dos direitos de cônjuges e companheiros para fins sucessórios. Para o STF – em entendimento também adotado pelo STJ –, deveria ser aplicado em ambos os casos o regime estabelecido pelo artigo 1.829 do Código Civil.

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