Filmei o que não devia

Opinião

Filmei o que não devia

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Dava bafadas nas lentes dos meus óculos e os esfregava na minha camisa estilo Agostinho Carrara. Estava nervoso na minha primeira vez dentro de um cassino ilegal.
Com esta minha cara de nerd leitor de quadrinhos do Batman, nas mãos suadas com o nervosismo, segurava um cafezinho morno de bingo e tentava fazer minha melhor cara de apostador. Sentia que não estava colando e que a qualquer momento algum tipo de vigarista com um 38 surgiria do imenso saguão de apostas e me desvendaria.
Mas vou contar como cheguei a essa drástica situação.
Era inverno do ano passado. Fazia muito frio. Daqueles que a gente solta fumaça quando fala e paga promessa enquanto lava a louça.
Mas na redação não se falava de outra coisa. Os óculos com câmera escondida integrada eram a nova febre dos repórteres que queriam fazer matérias investigativas.
Assim que soube que a geringonça estava pronta para uso, me atirei numa matéria sobre bingos clandestinos. Tirei meus óculos míopes e astígmatas e pus os óculos com câmera escondida.
Sem meus óculos oficiais e com meus os problemas de visão, os óculos com câmera escondida me faziam perder a dimensão das coisas. Caminhava em direção ao cassino ilegal e olhava meus pés, que pareciam ser de outra pessoa, tamanha distância entre meus olhos e eles.
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Gravando tudo, entrei no cassino. Ao porteiro, perguntei: “Até que horas isso fica aberto?” Ele prontamente respondeu “Isso aqui não fecha nunca. É 24h!”
Nossa! Ele falou isso tudo e eu gravei. Adentrei o saguão. Centenas de máquinas caça-níqueis e jogadores fumando cigarros baratos no ambiente fechado (o que todo mundo sabe que é proibido), tocando bitucas e cinzas no carpete vermelho.
Cheguei, sempre acompanhado da câmera escondida, em um imenso saguão de apostas de bingo. Senhores, senhoras, rapazes e raparigas de todos os tipos estavam lá.
Disfarçadamente, tomava um cafezinho e olhava tudo escorado numa parede. De um lado a outro. Curveando todas as esquinas de aposta do saguão enquanto gravava tudo.
Eis que ao longe vejo dois seguranças se acotovelando e apontando para mim. O nervosismo tomou conta.
Consegui desviar do olhar deles, me meti numa multidão de apostadores e finalmente consegui alcançar o banheiro para me refugiar.
Mais apostadores estavam dentro do banheiro. Resolvi que era melhor usar o mictório. Porque, quando um homem usa um mictório, ele fica invisível aos outros homens.
Só que, com toda esta adrenalina e nervosismo, acabei esquecendo que estava com o tal óculos com câmera escondida e fiz aquilo que qualquer outro menino faria ao finalizar sua necessidade: olhar para baixo e conferir os últimos pingos de xixi se dissiparem no mictório.
Sim. A câmera escondida estava ligada.
Agora minha aflição se voltava para o pessoal que editaria o vídeo. Imaginem só.
Melhor, não imaginem.
Voltei correndo com aquela gravação que, até a entrada no banheiro, tinha sido brilhante. Receoso, não comentei nada com o colega que editava o vídeo na minha frente. Fiquei parado ao lado dele, sem me mexer.
Eis que o vídeo chega na parte que entro no banheiro.
Graças ao frio que fazia somado ao ângulo do meu nariz que segurava os óculos em sua ponta, minha intimidade foi salva. Saí ileso. Nasci de novo.
Fui salvo pelo inverno e pela boa sorte que persegue os repórteres.


 
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Lajeado

Turma do Abraço gratuito dando uma amostra de como se faz. A pressa se mostra inimiga dos abraçadores. Com pouca adesão dos lajeadesens, restou abraços entre a equipe. Tá valendo! A foto é do Moisés Ruschel. Esse sabe muito.


Tua foto

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A CÂMERA ESCONDIDA

ilustração cris mijão

(SEM LEGENDA)


 

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