Cinco anos após perder o anfitrião, “Velho  Florestal”  ainda respira  futebol

Lajeado

Cinco anos após perder o anfitrião, “Velho Florestal” ainda respira futebol

Escolinha do Lajeadense funciona desde janeiro de 2016 no antigo gramado do Estádio Florestal, deixando viva a lembrança do esporte no histórico – e já demolido – “pavilhão de concreto” erguido com a força da comunidade e dos fanáticos torcedores. O local, que já foi palco de grandes confrontos no passado, ainda tem o futuro incerto. Por ora, é celeiro de novos craques

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Cinco anos após perder o anfitrião, “Velho  Florestal”  ainda respira  futebol
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Gustavo Adolfo 1 - Lateral vertical - Final vertical

Falcão e Renato Portaluppi talvez sejam os maiores ídolos do futebol gaúcho. Um pelo Internacional. Outro pelo Grêmio. Ronaldinho Gaúcho e Dalessandro são outros com histórias marcantes pela dupla Gre-Nal. A semelhança é que todos eles jogaram por diversas vezes no velho gramado do Estádio Florestal. Venceram e perderam. Sempre com grandes públicos os prestigiando.

Hoje, apesar da demolição das antigas arquibancadas – local e visitante –, vestiários, banheiros e sede administrativa do clube, em junho de 2012, a grama ainda é pisoteada pelas chuteiras. Pelo menos 125 alunos da escolinha do clube – coordenada pela Associação Lajeado de Esporte (ALE) – utilizam o imóvel localizado na esquina das ruas Gal. Flores da Cunha e Clélia J. Betti, no bairro Florestal.

O centro de treinamento é improvisado. Mas não tem custo. O grupo de investidores que comprou o imóvel por R$ 6,5 milhões, em 2009, cede o espaço. Para isso, cobra só a limpeza e manutenção do local. A água é “puxada” do restaurante localizado ao lado do estádio – a antiga Galeteria AlviAzul. Há um medidor próprio da ALE para o custeio. A luz vem de uma empresa de lavagem vizinha.

Com auxílio de patrocinadores e voluntários, dois banheiros foram construídos onde antes ficava a arquibancada principal. Ali, é possível visualizar um dos poucos vestígios do “Velho Florestal”: parte do parquêt do antigo vestiário ainda aparece em meio a vegetação. Além disto, os quatro postes com os refletores seguem de pé.

O muro que cerca o campo segue parcialmente de pé, com a tinta branca desgastada. Em alguns pontos onde a estrutura cedeu, placas de metal foram instaladas para impedir invasões. E o velho gramado é utilizado de forma diferente pelas crianças. São três campos menores no espaço do antigo, cujas dimensões variam de acordo com a idade dos jovens jogadores.

Um deles é Jean Marco Krombauer, de 10 anos. Está faz quase dois na escolinha do Alviazul. Atua como volante. “E zagueiro, se precisar.” Morador do São Cristóvão, lembra – vagamente – de ter ido a dois jogos do Lajeadense no velho estádio. Um contra o Internacional. Outro contra o Juventude. “Era mais legal. A gente ficava muito próximo ao campo. Só tinha uma grade”, lembra.

Questionado sobre qual grande craque já pisou no gramado, responde rápido. “Ronaldinho Gaúcho”. Ao ser lembrado de outros nomes, demonstra surpresa e euforia. “Não sabia de tantos. Mas eu não era nascido”, brinca. O sonho dele, assim como a maioria dos jovens atletas, é jogar na “Europa e na Seleção Brasileira”.

Muitos estão mais próximos disto. Hoje, a ALE e a escolinha do Alviazul comemoram três atletas treinando no Grêmio – mais quatro estão indo para um período de monitoramento no clube da capital gaúcha –, e 12 na Chapecoense. Também têm meninos fazendo estágios no Inter e no Juventude.

 Jean sonha em jogar na Europa. Perguntado sobre quem já pisou no gramado, responde: Ronaldinho Gaúcho

Jean sonha em jogar na Europa. Perguntado sobre quem já pisou no gramado, responde: Ronaldinho Gaúcho

Futuro incerto

A reportagem tentou, sem sucesso, contato com um dos investidores que compraram o imóvel faz quase oito anos. Enquanto esses não se manifestam, são diversas são as especulações sobre qual será o empreendimento construído naquela área: um hospital privado. Um condomínio fechado. E até um novo shopping. Mas nada de concreto ou oficial.

Essa incerteza preocupa um dos coordenadores da escolinha. Samuel Seben, que é sócio da ALE junto com o irmão, Alexandre. Ele afirma ser grato pela cedência do espaço e fala sobre os planos para o futuro. “Recebemos material de construção para construir um escritório e uma lavanderia. Mas, não sabemos o que vai ocorrer daqui um ou dois anos.”

A associação conta com apoio de empresários e pais dos jovens atletas. Outro que ajuda a escolinha é o ex-presidente do clube, Nilson Giovanella. “A luta agora é para garantir participação no campeonato gaúcho juvenil. Precisaríamos de R$ 80 mil para custear a competição”, diz Sebben. “E vamos pleitear junto ao governo uma área própria para garantir sequência deste trabalho”, completa.

Torcedores viram grandes nomes do futebol. Ronaldinho Gaúcho e Dalessandro atuaram no Florestal

Torcedores viram grandes nomes do futebol. Ronaldinho Gaúcho e Dalessandro atuaram no Florestal

Dias de festa. Dias de violência

A mudança de estádio foi concretizada em 2012, ano em que o clube oficialmente deixou as dependências do velho Florestal para iniciar nova história na Arena Alviazul, construída entre 2010 e 2011, no bairro Floresta. Muitos torcedores torcem o nariz quando questionados sobre a troca de campo. Outros não demonstram insatisfação.

Walmir de Siqueira, o popular “Maninho”, é um entre tantos que lamentam a ida do clube para longe do bairro Florestal. Ele foi jogador do clube na década de 50. Era centroavante e ponta esquerda do time campeão Gaúcho de 1959 – sem a presença da dupla Gre-Nal –, montado pelo então presidente, Lourenço Mayer da Silva, e pelo treinador, Joaquim Inácio da Silveira Filho.

Ele lembra dos irmãos Paulo e Nestor Heineck, e Roque e Rogério Lopes, que eram os craques da época. Lembra, também, que os salários na época eram quase simbólicos. Passados quase 40 anos daquela conquista, Maninho voltou ao estádio para vender espetinhos de carne em uma churrasqueira construída junto ao muro, e que até hoje permanece intacta.

“Achei a mudança ruim, né. Sempre dava para ganhar uns ‘troquinhos’ a cada jogo. E tinha o privilégio de assistir o jogo da minha própria casa”, brinca. Maninho mora na rua Natalício Heineck. O muro dos fundos da residência é colado com o muro estádio. “Hoje eu vou poucas vezes para a Arena. É ruim para voltar de ônibus. Até caminhando já tive que vir para casa.”

Para outro vizinho do antigo estádio, o fim dos jogos não é motivo para lamentações. Tadeu Kreutz costumava assistir as partidas em décadas mais distantes. No entanto, algumas brigas o fizeram perder um pouco do gosto pelo esporte. Uma dessas ocorreu no início da década de 90, em uma partida entre Lajeadense e Grêmio. Vitória de 1×0 para o Alviazul, com gol de Denílson aos 40 da segunda etapa.

“Fui naquele jogo. Vi o gol e logo depois sair do estádio. Fui para casa. No caminho, pedia para conhecidos não atirarem pedras nos torcedores e no ônibus dos gremistas. Já havia muitos parabrisas quebrados”, lembra. Ele também deu “abrigo” para jovens torcedoras gremistas que estavam assustadas. “Eu e minha esposa demos água com açúcar para se acalmarem.”

Apesar da lembrança da violência, Tadeu se emociona ao lembrar das jovens torcedoras do Grêmio que se esconderam na casa dele. Isso porque, um mês depois, durante o período de natal, a família foi surpreendida com uma carta assinada pelas meninas. Era um agradecimento pela gentileza do casal de lajeadenses. “Foi de chorar. Mas eu disse: agora chega, não vou mais. Nem sei onde é o novo estádio.”

Jogador na década de 50, Maninho vendia espetinhos nos últimos anos do Florestal

Jogador na década de 50, Maninho vendia espetinhos nos últimos anos do Florestal

Saiba mais

O Estádio Florestal foi inaugurado em 1936 com uma partida diante do São José. O primeiro gol foi marcado por Antoninho, do Alviazul, e o goleiro era Eulálio Tombini. O padre Érico Schmidt deu o pontapé inicial do jogo. Um dos mais memoráveis jogos ocorreu em julho de 1981, quando mais de cinco mil pessoas compareceram ao estádio para um jogo entre Lajeadense e Internacional.

Falcão, craque do Internacional durante a década de 70 e início dos 80, havia sido vendido para a Roma e se despedia do time. Naquela noite de quinta-feira, o Lajeadense venceu por 1×0, com gol de Mauro Farias. Com o resultado, o Grêmio foi o campeão gaúcho. Pela Libertadores, o Inter disputaria o título na quarta-feira seguinte, contra o Nacional, em Montevidéu.

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