“Tentamos encontrar respostas, a gente tem que aceitar, mas é difícil”

óbitos e desaparecimentos na cheia

“Tentamos encontrar respostas, a gente tem que aceitar, mas é difícil”

Após a enchente histórica de maio deste ano, o Vale do Taquari contabiliza 47 mortes e 18 pessoas ainda estão desaparecidas. Familiares lidam com o luto, a incerteza e a busca por respostas

“Tentamos encontrar respostas, a gente tem que aceitar, mas é difícil”
Vanessa, filha do casal desaparecido César e Bernardete, foi informada que os pais estavam na residência em Jacarezinho. Casa foi destruída por deslizamento. (Foto: BRAYAN BICCA)
Vale do Taquari

Mais de dois meses após a tragédia climática que atingiu o estado, famílias ainda vivem o luto ou a incerteza sobre a perda de algum familiar. No Vale do Taquari, as cheias causaram 47 mortes e 18 pessoas continuam desaparecidas.

De acordo com dados do Departamento Médico-Legal (DML) de Lajeado, ainda há três corpos de Cruzeiro do Sul que aguardam confirmação da causa da morte e identificação. Caso se confirme, o número de óbitos passa para 50 e o de desaparecidos para 15.

Na região, o corpo mais recente foi encontrado no domingo, 8, em Bom Fim, no interior de Cruzeiro do Sul. O corpo foi levado para exames no DML de Lajeado para apurar as causas e fazer a identificação. Nessa quarta-feira, a instituição também divulgou a identidade de dois corpos de Teutônia que estavam sob análise. As vítimas foram identificadas como Danilo e Ondina Sirlei Ferreira, de 45 e 50 anos.

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“Rezo para que eles possam descansar”

Muitas das vítimas eram moradoras do bairro Passo de Estrela, em Cruzeiro do Sul. Na localidade, ainda estão desaparecidos Adriana Maria da Silva e o companheiro Jorge Lauri Rodrigues.

Os dois moravam em uma casa próxima à igreja da comunidade. A estrutura foi destruída pela força das águas. “Estávamos há dois dias tentando tirar eles de lá, mas já não tinha como chegar”, conta a sobrinha de Adriana, Paloma Gerevini, 31.

As águas atingiram o primeiro andar da residência durante a noite e logo o segundo piso também foi inundado. Adriana e Jorge foram para o telhado, sempre em contato com a família que, do outro lado da linha, buscava ajuda para o resgate.

Conforme conta Paloma, a tia e ela ficaram em ligação naquela noite. Adriana contou quando parte da casa dos vizinhos caiu e quando a própria residência começou a se mover com as águas. A sobrinha ouviu a tia chorando quando Jorge foi levado pela correnteza junto com a casa e quando Adriana se segurou em um galho para se salvar.

“Não desliguei em nenhum momento. Ela estava cansada, fraca, com muito frio e já chorava muito”. Com outro celular, Paloma continuava pedindo ajuda.

Ela conta que um helicóptero passou pela localidade e resgatou outros vizinhos. Como ela estava em uma árvore, não a viram e o vento fez Adriana se soltar. “Ouvi barulho de água, e ela chorando e soluçando. A partir daquele momento, nunca mais soube nada dela”.

Paloma e a família procuraram por Adriana em outros municípios, mas nem ela, nem Jorge foram encontrados. “Foi bem difícil. A gente não dorme, tem pesado, a gente escuta a pessoa te chamando o tempo inteiro, como se pedisse ajuda. A gente se culpa por não ter conseguido ajudar”.

A cada corpo que encontrado e encaminhado ao DML, Paloma vai ao local fazer o reconhecimento. Apesar de ainda viver entre o luto e a esperança, o que ela mais quer é trazer a tia para casa, assim como prometeu por telefone naquela madrugada da tragédia.

“Tentamos encontrar respostas, a gente tem que aceitar, mas é difícil. Rezo para que eles possam descansar e a gente também. Não sei se é mais difícil tu saber que a pessoa morreu ou não ter notícias”.

“É uma tormenta não saber”

Moradores de Linha Jacarezinho, em Encantado, César Gilmar das Chagas, 53, e Bernardete Marques da Silva, 49, também estão desaparecidos desde o início de maio. Uma das filhas, Gicele Andressa Das Chagas, que reside hoje em Bento Gonçalves, mandava mensagem aos pais todos os dias. O último contato com o casal foi no dia 29 de abril.

“Não consegui contato no dia 30 e no dia 1° de maio consegui entrar em um grupo de moradores de Encantado e região. No dia 2, eu comecei a assistir as lives feitas pelos veículos de comunicação e consegui anunciar o nome dos meus pais ao vivo”, conta.

Gicele diz que a polícia informou à irmã Vanessa Aparecida Das Chagas, 38, sobre o relato de um vizinho confirmando que César e Bernardete estavam na casa, que ficava próxima ao posto do Pedrão e ao lado da residência de Josiane Machado, que morreu durante um deslizamento de terras na localidade durante os temporais. “Consegui falar com os filhos da Josiane. Eles não viram meus pais no momento do resgate da mãe deles”.

A jovem diz ter sido um momento difícil de buscas, em que não tinha muita informação. Ela chegou a vir à região com um grupo de voluntários que trazia mantimentos e ajudava na limpeza, mas não conseguiu acessar o local onde os pais residiam. Ontem, Gicele completou 23 anos, e este é o primeiro ano que passa a data sem os pais. “É uma tormenta não saber onde eles estão”.

No total, 182 óbitos foram confirmados no RS em e ainda há 31 pessoas desaparecidas.

Registros

  • Óbitos: 47
  • Desaparecidos: 18

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