Movimento Pró-Matas Ciliares do Vale do Taquari divulga Carta Aberta

MEIO AMBIENTE

Movimento Pró-Matas Ciliares do Vale do Taquari divulga Carta Aberta

Documento aborda enchentes no estado e lista ações de prevenção

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Movimento Pró-Matas Ciliares do Vale do Taquari divulga Carta Aberta
Foto: Felipe Neitzke
Estado
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Na noite desta sexta-feira, 24, o Movimento Pró-Matas Ciliares do Vale do Taquari divulgou uma Carta Aberta com argumentos sobre as recentes enchentes que afetaram o estado.

O grupo, que é independente e suprapartidário, é composto por profissionais técnicos da área ambiental, ambientalistas e simpatizantes da causa ambiental.

No documento, são listadas diversas ações em nível estadual e federal, abrangendo a Bacia Hidrográfica do rio Taquari-Antas, entre outras regiões, com o objetivo de prevenir desastres futuros.

Confira a Carta na íntegra

“A Gestores Públicos, Administradores, Diretores Conselheiros de Meio Ambiente, Promotores de Justiça e Comunidade em Geral O Movimento Pró-Matas Ciliares do Vale do Taquari é um grupo formado por pessoas dos mais variados segmentos da sociedade. Trata-se de grupo independente e suprapartidário, constituído, principalmente, por profissionais técnicos da área ambiental, ambientalistas, simpatizantes da causa ambiental e pessoas preocupadas com a atual situação em que nos encontramos. Somos de diferentes municípios e regiões do Estado e País. Muitos de nós trabalham na área ambiental há vários anos e, neste momento, estamos nos estruturando para auxiliar na recuperação das margens de nossos rios e encostas. Acreditamos que a recuperação destas áreas é uma das medidas mais importantes e urgentes para uma recuperação duradoura do Vale e que este assunto deve ser pautado quando falamos em restaurar nossa região.

Nosso Movimento surge como uma estratégia para a construção de ações que estejam focadas na recuperação do Vale do Taquari e que considerem aspectos ambientais, além do social e do econômico. Não existe recuperação sem considerarmos o ambiente, sempre tão ignorado e desrespeitado e que agora nos cobra uma conta sem precedentes. Precisamos entender que o ocorrido, em três ocasiões desde setembro de 2023, é resultado das alterações climáticas (em nível global) provocadas pela ação do homem, aliadas ao mau uso e ocupação do solo, em pleno desrespeito às Áreas de Preservação Permanente (APP’s), bem como do desmatamento desenfreado, ocupação de encostas, drenagem de áreas úmidas, impermeabilização do solo tanto em áreas urbanas quanto em áreas rurais, uso de combustíveis fósseis, falta de planejamento urbano e rural, dentre outros fatores.

Isso tudo está aliado à ausência de ações que visem a redução da emissão dos gases causadores do aquecimento global e de outras medidas que minimizem os impactos ambientais gerados há anos pela ação antrópica. É o caso da análise do Cadastro Ambiental Rural (CAR) no Rio Grande do Sul acompanhado da não implementação do Programa de Recuperação Ambiental (PRA), e de não terem sido tomadas medidas suficientes diante dos alertas previamente dados, dentre tantas outras situações. Além disso, é essencial a compreensão de que a mata ciliar atua como uma “esponja”, retendo a água da chuva no solo, como uma barreira natural, que o protege contra o impacto direto da água. Assim, ela reduz a quantidade de água que escoa para os centros urbanos, bem como sua velocidade. Ela também age como sustentação, fortalecendo a estrutura dos taludes de cursos hídricos e encostas, através das raízes da vegetação, que seguram o solo. Dessa forma, reduz significativamente o desgaste do solo em margens de rios e arroios e nos terrenos com declividade, além de formar corredores ecológicos que facilitam a circulação da fauna silvestre e promovem a dispersão de sementes, funcionando como fonte de diversidade biótica e abiótica, propiciando o fluxo gênico entre populações.

Desta forma, listamos abaixo ações imprescindíveis, em nível estadual e federal, abrangendo a Bacia Hidrográfica do rio Taquari-Antas e outras:

– Elaborar e executar um plano de resposta aos desastres, principalmente dos movimentos de massa e inundações, em nível de Bacia, devendo conter, no mínimo, o mapeamento das áreas de risco e ações para evitar a sua ocupação, inclusive de fiscalização;
– Elaborar e implantar um programa de recuperação das APP’s em margens de rios e arroios, incluindo as áreas de risco de movimento de massa em todas as Bacias;
– Proibição imediata da reconstrução de casas e edificações nas áreas atingidas pelas águas, promovendo a realocação e a reconstrução em áreas seguras, acompanhado da implantação de medidas que visem a restauração da cobertura vegetal;
– Exame e implementação imediata da análise do CAR e do PRA em nível estadual, previstos na legislação de proteção à vegetação nativa;
– Ampliação das faixas de APP’s nas margens de rios, respeitando os limites atingidos pelas águas na inundação de maio de 2024 (cotas de inundação) com o restabelecimento da cobertura vegetal, utilizando espécies nativas, o que inclui a implantação de sistemas agroflorestais nas porções mais distantes da margem e fora da margem de APP;
– Revogação da Lei nº 16.111 de 09/04/2024 que alterou a Lei nº 15434/2020 (Código Estadual do Meio Ambiente do Estado do Rio Grande do Sul) e permitiu a execução de determinadas ações em margens de rios (projeto de lei aprovado na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul em março de 2024);
– Implantação de sistemas de produção, utilizando a agricultura regenerativa agroecológica, com produção de diversidade alimentar e saudabilidade, conciliando com a conservação em sistemas agroflorestais;
– Incentivar o uso de outras tecnologias de geração de energia elétrica, como a solar, a eólica, o uso de biodigestores na suinocultura, bovinocultura e em aterros de usinas de reciclagem, reduzindo a dependência das usinas hidrelétricas. Destaca-se ainda ser imprescindível que as áreas ocupadas em encostas e margens de rios, atingidas pela catástrofe sejam desocupadas. É preciso considerar que o leito original do rio é maior do que ele normalmente ocupa e que, por este motivo, ele pode voltar a ocupar esse espaço, como foi o caso das três grandes inundações de 2023-2024. Já em nível local, envolvendo os municípios, julgamos necessárias ações que visem o (re)planejamento urbano e rural:
– Exigir que a restauração das matas ciliares ocorra em uma ampla faixa nas duas margens dos rios e arroios, associando medidas de engenharia natural nas margens, visando a plena recuperação destas. E que a restauração seja realizada com espécies nativas da região, características de margens de rios;
– Criar mecanismos para reduzir as áreas impermeáveis, essencialmente as que se encontram em pontos críticos de concentração de águas pluviais. Essa impermeabilização é consequência da mecanização agrícola, da ampliação de áreas urbanas, de calçamentos, canalização de córregos e drenagem de açudes, dentre outros. Para tanto, deve-se buscar alternativas para reduzir a impermeabilização do solo, com técnicas que evitem a compactação do solo na agricultura e sistemas que propiciem a infiltração da água nas cidades;
– Mapear os pontos onde o asfalto foi destruído e de locais para nova pavimentação de forma a permitir uma drenagem minimamente eficiente, favorecendo a absorção da água pelo solo, pelo menos nos pontos em que há cursos d’água que mal comportam uma precipitação mais intensa;
– Realizar planejamento visando a eliminação da canalização/tubulação de cursos hídricos, principalmente nas áreas urbanas. Os cursos hídricos canalizados e/ou tubulados devem ser
priorizados para a revitalização/renaturalização/restauração;
– Realização de investimentos em parques urbanos com florestas contendo estruturas permeáveis para absorver a água da chuva. E, que os projetos que visem a sua implantação sejam acompanhados por técnicos locais com conhecimento sobre a diversidade vegetal regional;
– Criar programas e incentivos para fomentar construções sustentáveis que garantam a retenção de parte de água da chuva incidente no lote, implantação de cisternas com desconto no IPTU para a edificação que implantar, por exemplo;
– Modernizar a construção de estradas e calçadas com materiais permeáveis, visando a redução do escoamento superficial. Pode-se inclusive instalar bacias de retenção de água nas margens de estradas de terra nas áreas rurais;
– Armazenar restos de materiais da construção civil, árvores que foram derrubadas, vegetação e madeiras em geral para utilização em técnicas de engenharia natural (bioengenharia) para estabilização das margens dos rios e encostas. E ainda, que o material verde seja triturado para uso como adubo orgânico.

Por fim, destacamos a necessidade da implantação de programas de Educação Ambiental, por parte de todos os setores da comunidade (governos federais, estaduais e municipais; escolas e meios de comunicação), conforme prevê a Política Nacional de Educação Ambiental.

Ressalta-se que as medidas sugeridas acima, em sua maioria, são ações amplamente utilizadas em todo o globo, cuja eficácia na proteção de rios e encostas já se mostrou seguramente satisfatória. Além disso, estas orientações foram elaboradas em conjunto, por integrantes do grupo que possuem o conhecimento e a experiência necessários para tal.

O grupo MOVIMENTO PRÓ-MATAS CILIARES DO VALE DO TAQUARI se solidariza com todos os atingidos e se coloca à disposição para contribuir na recuperação da Região.” 

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