Na antiga fábrica de conservas, o início dos bairros

Um novo olhar sobre os bairros

Na antiga fábrica de conservas, o início dos bairros

Antes dos Oderich instalarem a filial em Lajeado, os atuais Conservas, Morro 25 e Nações eram extensas propriedades rurais. Com o tempo, novos negócios se estabeleceram nos bairros e alavancaram o crescimento das comunidades. Na memória, a antiga Sociedade 25 de Julho, desativada há muitas décadas

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Atualizado terça-feira,
06 de Fevereiro de 2024 às 19:10

Na antiga fábrica de conservas, o início dos bairros
Crédito das fotos: Livro "No Hotel da Esquina Verde"/Reprodução
Lajeado
Gustavo Adolfo 1 - Lateral vertical - Final vertical

Do outro lado do arroio Saraquá, as primeiras famílias se estabeleceram no começo do século XX, quando os bairros Conservas, Morro 25 e Nações não passavam de extensas propriedades rurais.

O cenário mudou na década de 1920. A fábrica de conservas Oderich – fundada em 1908 em São Sebastião do Caí – instalou uma filial em Lajeado, próximo ao Rio Taquari. A indústria enlatava carne de porco e linguiças na banha e, depois, escoava os produtos pelo rio.

O mesmo engenheiro que fez a fábrica Oderich também foi responsável pelo projeto da antiga Sociedade 25 de Julho, que não existe mais no Morro 25

Para administrar a filial, Max Oderich veio morar na cidade, era o filho mais novo do fundador da Fábrica Oderich. Max veio com a esposa Nora e, juntos, edificaram uma casa no alto da localidade. Essa residência, anos depois, em 1978, passou a ser sede do Lar da Menina, que recebeu o nome de Centro Social Nora Oderich.

Nos anos de funcionamento, o complexo industrial atraiu muitos trabalhadores. Eram duas grandes chaminés, matadouro e área de industrialização.

Entretanto, com a chegada da Segunda Guerra Mundial, grandes multinacionais passaram a investir em enlatados de carne, que eram enviados aos soldados na guerra.

A competição no mercado e a escassez de combustível durante o conflito dificultaram o escoamento da produção. Assim, a fábrica Oderich de Lajeado foi fechada e o complexo desativado e demolido. Hoje, é difícil encontrar ruínas da antiga indústria.

Da velha Oderich, ficou o nome do bairro: Conservas. A denominação foi definida no governo de João Frederico Schaan, em 1939. Até então, a localidade era conhecida como São Bento do Sul e a atual Avenida Beira Rio era chamada de Avenida São Bento.

Memórias do bairro

Quem cresceu no Conservas foi João Carlos dos Santos, 73, conhecido por todos como “Nenê”. Da infância, lembra do futebol nos potreiros e das brincadeiras nas ruínas da antiga fábrica dos Oderich. “Tinham vários curtumes e frigoríficos por aqui, isso atraiu novos moradores depois”, cita.

Nenê recorda também do antigo Cine Avenida, que ficava em frente à Praça do Chafariz. “Lembro que fazíamos várias filas, uma era para o pessoal do Conservas e a outra para quem vinha de Picada Moinhos, para evitar confusão”, conta.

Ainda hoje, Nenê vive no bairro que cresceu. Trabalha com pedras preciosas e recorda dos anos em que Lajeado foi chamada de “Cidade Jóia”. “Depois perdemos o posto para Soledade, mas tinha muita fabriqueta por aqui”, lembra.

Para além da escola

A professora Iva Huber começou a lecionar na Emef São João Bosco nos anos 1970. A foto mostra os alunos em 1985, no Conservas

A professora aposentada Iva Araújo Huber, 82, se mudou para o bairro Conservas há mais de 50 anos. Nascida em Estrela, foi em 1970 que ela começou a dar aulas na Escola São João Bosco, que fica na localidade.

Poucos anos depois, em 1972, ela, o marido e os dois filhos vieram morar no Conservas. “Nosso terreno era um potreiro, só tinha uma casa e um armazém nas redondezas. A luz só veio em 1975”, conta.
Na época, também não tinha água encanada. A família de Iva furou um poço e levava as roupas para lavar no rio.

Do tempo de professora, Iva ainda lembra que a capela funcionava junto da escola. “Nós tínhamos que ajudar a fazer as missas e até enterros. As professoras iam junto com os padres nas casas das famílias para ajudar, ensinávamos a fazer sabão, a como lavar roupa”, recorda.

Nos mais de 40 anos como professora, Iva não lembra de confusões no bairro. “Naquela época, os alunos eram muito respeitosos com os professores. Moro aqui no Conservas até hoje, e não penso em sair.”

No morro, os Wiebbelling

“Era um salão muito lindo, o mais bonito que já vi”. É assim que Ari Wiebbelling, aos 84 anos, recorda da antiga Sociedade 25 de Julho, que funcionava no Morro 25.

Ari Wiebbelling mora desde 1965 no bairro, comprou o terreno do tio Theodoro Wiebbelling, que era dono da maior parte das terras do Morro 25

Ari, mais conhecido como Chico, nasceu em Passo de Estrela, hoje, município de Cruzeiro do Sul. Foi o tio de Chico, Theodoro Wiebbelling, quem ajudou a fundar a antiga sociedade, em 1930. Época em que muitos funcionários da antiga Oderich moravam nas redondezas.

O prédio, erguido pela comunidade, contemplava salão de baile, bar, cancha de jogos e até uma pequena biblioteca, ficava próximo ao rio Taquari. “Eu tinha uns sete anos e acompanhava minha mãe nos bailes, que trabalhava na cozinha. Lembro das brigas”, conta entre risadas.

O salão, mais tarde, foi transformado em boate. “Pegou fogo uma vez e ficou destruído, hoje não existe mais”, revela. Conforme registros, a planta da construção foi feita pelo mesmo engenheiro que fez a fábrica de conservas, Luís Korgel.

Ari trabalhou por anos no Curtume Koefender, que funciona no Morro 25 desde os anos 1950. Na foto, a casa de Ari aparece, próxima à fábrica

O tio Theodoro Wiebbelling foi o primeiro presidente da Sociedade 25 de Julho, que acabou dando nome ao bairro. Naquela época, Theodoro era o dono da maioria das terras que hoje formam o Morro 25. Foi dele que Ari comprou o terreno da casa onde mora ainda hoje, na rua Carlos Alfredo Koefender.

Ele e a esposa Orvelinda se mudaram para o bairro em 1965. “Criamos nossas três filhas aqui. Eu trabalhei mais de 30 anos no Curtume Koefender, comecei aos 14 anos”, lembra Wiebbelling.

Essa indústria de couros tinha sido fundada por Carlos Alfredo Koefender, em 1951, junto de seus filhos. Um deles, Oscar, foi homenageado com o nome da Emef Oscar Koefender, criada em 1988 no atual bairro Nações.
Localizado na divisa com Cruzeiro do Sul, esse bairro só foi criado em 1993. O nome faz referências às várias ruas que carregam nomes de países da América Latina.

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