O voto envergonhado

Opinião

Marcos Frank

Marcos Frank

Médico neurocirurgião

Colunista

O voto envergonhado

O Brasil já teve muitos movimentos de massa, quase sempre centrados em uma figura forte. Foi assim com Getúlio Vargas na primeira metade do Século XX, Brizola na segunda metade e, mais para a virada do século, Lula e o Partido dos Trabalhadores.

São inegáveis as mudanças, para bem e para mal, que esse último trouxe à politica brasileira: Orçamento Participativo, centralismo democrático, o gramscismo, a defesa apaixonada de seus militantes e a multidão de camisetas vermelhas de Che Guevara, Fidel, Lula e a estrela. As imagens da posse de Lula em 2002 deixam isso bem claro, caso alguém tenha esquecido ou não tenha vivido essa época.

Vinte anos depois e o fenômeno que se viu nas ruas foram pessoas vestindo verde e amarelo, numa clara reação ao vermelho de tempos passados. Essa mudança muito se deve aos próprios pecados do partido e ainda não bem digeridos e explicados. Olhando para essas duas épocas distintas, dá para entender quem defende a ideia de que o Bolsonarismo é uma reação ao Lulo-petismo, e o ressurgimento de Lula uma reação ao Bolsonarismo.

Afinal, ambos são líderes populistas, com posicionamentos extremados, se consideram a salvação da pátria e se acham acima do bem e do mal. E até mesmo algumas figuras histriônicas existem na sombra dos dois líderes. O dado histórico deste ano é que, pela primeira vez, os dois “caciques” de cada ala se enfrentam e literalmente dividiram a população ao meio como nos mostrou o resultado do primeiro turno da eleição presidencial.

A primeira vista, a disputa que tem lances baixos como as referências a genocídio, satanismo, aborto e a corrupção, fez com que mais de cem milhões de brasileiros se dividissem entre os dois candidatos, com vantagem para Lula, mas sem atingir um número capaz de liquidar a eleição em primeiro turno.

Essa divisão onde todos gritam, mas ninguém escuta, atingiu famílias, grupos de amigos e mesmo regiões. Sul e Centro-oeste ficaram com Bolsonaro, enquanto o Nordeste foi todo de Lula. Norte e Sudeste se dividiram. E se nos votos para presidência a esquerda teve leve vantagem, o mesmo não se pode dizer do Congresso onde os partidos de direita obtiveram uma vitória histórica.

Além disso, houve o desaparecimento da força dos partidos à direita onde o Bolsonarismo faz partidos surgir e desaparecer com a mesma facilidade que se troca de roupa. Quando se fala em Liberais, União Brasil, Patriotas ou Republicanos, não há figuras conhecidas, apenas uma identificação com valores e ideias. Na esquerda, o maior arraso aconteceu com os sempre indecisos tucanos, que perderam o governo do estado de São Paulo e minguaram por todos os cantos.

Para o segundo turno, não há de se esperar que o embate mude de nível e o quê provavelmente irá definir a eleição será a vontade das pessoas de comparecer às urnas. No primeiro turno, a menor abstenção no Nordeste e a maior no Centro-oeste claramente favoreceu Lula, mas será que isso vai se repetir? E como ninguém mais acredita em pesquisas e se percebe o medo de perder uma eleição histórica em ambos os lados, ainda teremos fortes emoções e turbulências pela frente.

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