Vkousno i tochka, o novo McDonald’s russo

Opinião

Fernando Röhsig

Fernando Röhsig

Consultor empresarial

Vkousno i tochka, o novo McDonald’s russo

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Você sabe o que significa um embargo econômico? Desde o início da guerra da Rússia com a Ucrânia, em fevereiro, centenas de empresas ocidentais vem adotando medidas que resultaram na saída ou redução de sua atuação naquele mercado.

A alegação é a não concordância destas marcas com a invasão da Ucrânia pelos russos. O prejuízo acumulado pelas empresas que saíram, reduziram ou suspenderam suas operações naquele país é, até agora, de U$ 59 bilhões. São negócios de diferentes segmentos, como bancos, cervejarias, varejistas, restaurantes e empresas de navegação.

O embargo é a forma encontrada para pressionar economicamente o governo russo para que reavalie sua estratégia no conflito, uma vez que o fim desta guerra é desejo de (quase) todos.
Uma das empresas que decidiu sair da Rússia foi a rede de alimentação rápida americana McDonald’s. Com 850 lojas, mais de 62 mil empregados e 9% do seu faturamento gerado nas operações em território russo, o McDonald’s anunciou em maio que deixaria de atuar no país.

Uma das notícias tinha a seguinte chamada: “McDonald’s deixa a Rússia”. O que aconteceria a partir do momento da decisão? Imagine as pessoas que dependem desse negócio, no desemprego, no prejuízo para a empresa (por volta de US$ 1,3 bilhão), em como os fornecedores readequariam suas vendas, na queda no recolhimento de impostos, na ociosidade das áreas ocupadas pelas operações e, obviamente, na retirada e na queda dos simbólicos arcos dourados, que identificam suas lojas e significam a força da cultura ocidental junto aos consumidores mundo afora.

No domingo, 12/06/2022, quando foi comemorado o Dia da Rússia (feriado da independência), o empresário russo Alexander Govor reabriu a primeira operação do ex-McDonald’s em Moscou. Foi ele quem comprou todas as 850 lojas que haviam sido fechadas pelo McDonald’s em maio e prometeu reabrir cada uma delas ao longo das próximas semanas.

Com isso, todas as preocupações com os empregos, renda e operações suspensas perderam impacto. A ideia é que os clientes não percebam alterações no ambiente, sabor ou qualidade dos produtos e serviços. Govor anunciou ainda que o logotipo foi alterado por duas listras estilizadas de cor laranja que representam duas batatas fritas acompanhadas de um ponto vermelho. Assim, as operações agora estão sendo lideradas por um russo, que espera poder crescer muito mais e ainda abrir novos negócios.

Depois de 30 anos, após a queda do Muro de Berlim e o desmembramento da União Soviética, quando foi inaugurada, em Moscou, a primeira loja do McDonald’s, um símbolo americano, foram os russos que compraram todas as operações da rede americana e inauguraram, no mesmo endereço, a primeira loja de fast food russa. Pelas imagens, o dia pareceu marcar o início de uma nova era na Rússia, com o orgulho das pessoas e até um viés nacionalista, com multidões procurando as lojas.

Um embargo econômico como o anunciado pelo McDonald’s parecia uma defesa da democracia ocidental, um ponto de vista moral diante de um conflito com escala mundial, uma marcação de posição diante de imagens que comovem o mundo. E a adoção de um embargo, ainda mais por intenção da empresa, em geral geraria grandes prejuízos ao negócio. Mas não foi para tanto.

Como visto, o que houve foi um grande negócio, que gerou uma saída digna para o McDonald’s do país – mas sem os riscos de simplesmente abandonar uma operação gigantesca – e, de quebra, beneficiou empresas russas interessadas, neste momento, em devolver algum sinal de orgulho ao país.

Entender os dois lados deste “embargo” ajuda a perceber que, mesmo em situações críticas como uma guerra, negócios ainda são negócios. O embargo ocidental, neste caso, só resultou mesmo em “Vkousno i tochka” (que significa algo como “Delicioso. E ponto final” em russo).


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