O tempo é relativo

Opinião

Ney Arruda Filho

Ney Arruda Filho

Advogado

Coluna com foco na essência humana, tratando de temas desafiadores, aliada à visão jurídica

O tempo é relativo

Por

Lajeado

O maior marca os segundos. O grande indica os minutos e o pequeno as horas. Não lembro do ano, mas lembro muito bem da paciência do meu pai me explicando o que significava cada ponteiro, como funcionava e para que servia um relógio. Marcar o tempo, não se atrasar nos compromissos, ser pontual. Sessenta, tudo era sessenta, um tinha sessenta dentro dos outros sessenta e os sessenta de um eram o um do outro. Não lembro quantos anos eu tinha, mas lembro muito bem como era complicado pra mim entender que sessenta poderia ser um. Sessenta segundos, um minuto. Sessenta minutos, uma hora.

Tempo depois, já professor, descobri que uma hora-aula não corresponde a sessenta minutos. Por alguma razão metafísica/astronômica/metodológica ou mesmo pedagógica, uma hora-aula pode variar de quarenta e cinco a cinquenta minutos. E por muitos anos desfrutei da convivência nos bancos universitários, sem sentir os minutos passarem. Sala cheia, lousa verde e giz, ou mesmo quadro branco com canetinhas, pouco me importava se eram quarenta e cinco ou cinquenta. O que valia mesmo eram as trocas, os debates, a construção conjunta do conhecimento. Tempos idos.

A pandemia acabou de vez com o pouco que restava de romantismo no ensino. Não tem mais sala cheia, nem lousa verde ou quadro branco com canetinhas. Agora a pegada é “on line”. Por isso, eu que sou um analógico assumido, tenho que confessar a minha dificuldade de permanecer atento à tela de um computador, circunstância que me levou a me importar mais com a tal hora-aula. Como aluno, nos dias atuais, acabo por fracionar as aulas, assistindo parte em tempo real e parte em momento posterior, quando o curso e o sistema permitem. Nessa onda de assistir às aulas gravadas, me foi apresentada uma ferramenta que permite a aceleração das vídeo-aulas. É bem provável que isso seja algo corriqueiro pra maioria dos estudantes de hoje, poder assistir a uma aula gravada em velocidade 1,25 ou 1,5. Mas pra mim, foi um achado. Estou utilizando, acelerando o processo, fazendo com que aquele professor que fala mansinho, pausado, pareça o Pedro Ernesto Denardin narrando Gre-Nal.

Agora fiquei sabendo que o WhatsApp liberou uma função que pode aumentar a velocidade dos áudios em até duas vezes. Aí me caíram os butiás restantes. Quer dizer que o áudio longuíssimo, daquele amigo querido, permeado de afeto e que te atualiza das notícias da turma de colégio, já pode ser escutado na metade do tempo? Sim, isso mesmo. Não é mais necessário dedicar “todo” aquele tempo pra ouvir o que o nosso amigo tem a dizer. Dá pra acelerar, pra sobrar mais tempo. Mas sobrar mais tempo pra quê? Sei lá, confesso que fiquei confuso com todas essas possibilidades de acelerar o tempo. Agora, mais do que nunca, o tempo é de fato relativo.

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