“Vocês são loucos. Nunca vai dar certo”. Essa é a frase mais ouvida pelo casal Evandro André Bauer, 37, e Vanessa Tresoldi Schneider, 33, de Forquetinha. Eles queriam voltar ao interior, mas não para criar suínos, aves ou produzir leite. “Buscava algo inovador, com potencial e onde pudesse conciliar com meu emprego na cidade”, resume Bauer.
A ideia de cultivar o lúpulo surgiu de pesquisas feitas por Vanessa. Primeiramente, o objetivo era fabricar a própria cerveja artesanal. Diante da percepção da demanda do mercado, onde 99% da matéria-prima é importada e a parceria estabelecida com uma cervejaria de Bom Retiro do Sul, optaram por apenas produzir o lúpulo.
A estrutura erguida nos fundos de casa tem capacidade de acomodar 680 plantas, mas a meta é de no mínimo duplicar a produção nos próximos anos. “Nosso clima é o ideal e vamos colher uma matéria-prima de qualidade superior”, aposta Vanessa.
Potencial e dificuldades
No primeiro ano cada planta produz em média 100 gramas. Já no quarto, quando chega ao auge, alcança 2 quilos. Entre as dificuldades está a ausência de técnicas para fazer o manejo. A maioria das informações é obtida em livros, artigos na internet e grupos de conversa em redes sociais.
Cultivada no sistema de parreiral, a planta atinge até oito metros de altura. Bauer indica o plantio no início da primavera. A floração começa em dezembro e a safra na segunda quinzena de fevereiro.
Durante o inverno a planta entra em dormência e rebrota em setembro. “Produz por mais de 10 anos. Em condições ideais cresce até 40 centímetros por dia”, observa. Outro detalhe é a necessidade de irrigação, pois a cultura é exigente em umidade.
Um dos grandes aliados para obter êxito é o sol. As plantas necessitam acima de 10 horas de luz solar ao dia para florescer, ensinam. O casal trabalha para conseguir o certificado de Procedência e de Produção junto ao Mapa. No futuro a meta é tornar o cultivo orgânico.
Mercado promissor
Criada em maio de 2018, a Associação Brasileira de Produtores de Lúpulo (Aprolúpulo), com sede em Lages, já reúne 123 produtores de 11 estados (RS, SC, PR, RJ, SP, RN, ES, RO e TO)e além de ter um membro em Portugal.
Alexander Creuz, um dos fundadores e atual presidente, depois de assistir uma reportagem no Globo Rural em 2016 sobre o cultivo, fez um curso técnico em Agronegócio do Senar e decidiu colocar em prática o plano de negócios elaborado como trabalho de conclusão de curso: cultivar lúpulo.
Na Localidade de Cadeados, instalou o matrizeiro, que está na segunda safra e é usado como uma espécie de laboratório, para fazer práticas de manejo diferentes entre as variedades cultivadas. Cada muda custa em média R$ 40.
Em 2018, o Brasil importou 3.362 toneladas de lúpulo, destinado em sua maioria para cervejarias artesanais. O valor do quilo varia de R$ 100 a R$ 1,2 mil, dependendo da qualidade e variedade, aponta. No país, o cultivo alcança apenas 40 hectares, segundo estimativa da Aprolúpulo.
Falta de tecnologia
Esta, além da ausência de máquinas para auxiliar os produtores em quase todas as etapas produtivas, desde o cultivo, colheita, separação dos cones, secagem, armazenagem e peletização, são considerados os principais gargalos.
Por ser uma cultura de alto valor agregado, não precisa de grandes extensões de terra para ter um bom retorno financeiro. É ideal para pequenos produtores, observa. Hoje, a erva responsável pelo aroma e amargor, é comprada de lojas especializadas, as quais importam o produto de outros países como Alemanha e Estados Unidos, responsáveis por fornecer 80% da matéria-prima mundial.
A cultura exige cuidado extremo com o solo, pois a planta necessita de muito nitrogênio, potássio e fósforo para se desenvolver. Acredita que o mercado seja promissor, caso a qualidade da matéria-prima alcance bons índices. “O consumidor busca algo inovador, com mais sabor. Ele bebe menos, prioriza a qualidade”, opina.
A criação da Câmara Setorial da Cerveja é outro ponto positivo. É um espaço para discutir os problemas e buscar soluções para toda cadeia produtiva. Em algumas décadas poderemos passar de importador para exportador, projeta.
Da lavoura para o copo
Uma cervejaria de Bom Retiro do Sul colocou no mercado em 2019 o primeiro rótulo (Harvest APA) produzido com lúpulo da variedade Cascade, oriundo da propriedade de Elson Alllgayer, de Santa Clara do Sul. “Teremos este ano a Harvest IPA e a expectativa é lançar mais rótulos a partir de 2021 com matéria-prima de novos produtores parceiros”, explica o engenheiro agrônomo responsável, Marcus Outemane.
O crescimento das cervejarias artesanais nos últimos dez anos desperta o interesse dos agricultores. Para incentivar a expansão, em agosto foi criado o projeto Salva Hops onde é garantida a assistência técnica, desde o cultivo a colheita, além da compra do lúpulo, beneficiamento e venda da cerveja, gerando renda e oportunidades para todos.
As áreas cultivadas possuem de 30 até mil plantas. Além do interesse cervejeiro, temos que considerar a indústria farmacêutica, alimentícia, cosmética, entre outras, observa.
Estão em fase de testes em torno de 15 variedades na região. A meta é identificar as com mais potencial e melhor adaptação ao clima e solo. “Buscamos novos parceiros para ampliar a área e a produção”, avisa.