Sistema criado para simplificar o envio de informações trabalhistas das pessoas jurídicas, o eSocial se tornou motivo de preocupação para os escritórios de contabilidade e profissionais de RH. O motivo é a falta de atenção dos empresários com as mudanças provocadas pela plataforma, que estabelece rigidez aos prazos previstos em lei e multas pesadas em caso de descumprimento
Vice-presidente do Sescon-RS, Flávio Dondoni Jr. afirma que o sistema provocará o fechamento de empresas que não estiverem organizadas. Ele foi um dos palestrantes do workshop Negócios em Pauta de maio, realizado no auditório da Unimed Lajeado.
Mediado pelo diretor do grupo A Hora, Adair Weiss, o evento também teve a presença da gerente de Departamento Pessoal da Schumacher Contabilidade e Assessoria, Rosa Maria Ongaratto, e do engenheiro de Segurança do Trabalho da Unimed VTRP, Ricardo Nicolau.
Conforme Dondoni, apesar de estar em foco agora, o eSocial começou a ser desenvolvido em 2002, quando um grupo de agentes do Tesouro pensou o sistema SPED, que deu origem à nota fiscal eletrônica. Segundo ele, em 2007 iniciaram os trabalhos para colocar as questões trabalhistas dentro do sistema SPED, dando origem ao eSocial.
“A base de informação que o sistema precisa ter foi muito bem pensada e trabalhada, mas gera trabalho, preocupação e margem de erro”, alerta. Conforme Dondoni, os operadores do sistema, governo, contabilidades, RHs e empresas de softwares estão atentos, mas não encontram respaldo por parte do setor empresarial.
“Estamos em um buraco negro, gritando sobre isso, mas parece que os empresários não se convencem da urgência do tema”, destaca. Lembra que, antes do eSocial, a incidência de multas por não cumprimento de prazos dependia da presença de um fiscal, que inclusive poderia relativizar algumas questões. Agora, frisa, tudo é automatizado por meio de robôs.
Para Rosa, a principal dificuldade é convencer o empresário a enviar as informações necessárias no prazo, que é curto. Segundo ela, se as empresas não se adaptarem ao sistema, terão um aumento no passivo trabalhista.
“Não tem mais justificativa. Se está fora do prazo, a multa é automática”, aponta. Anteriormente, lembra, era possível conversar com o fiscal e explicar pequenas falhas, algo que não é mais possível. Lembra que algumas informações precisam ser enviadas diariamente.
“Estamos avisando desde 2014, por meio de reuniões, e-mails e visita nas empresas, mas ainda hoje existem pessoas que não sabem o que é o eSocial”, assinala. Cita como exemplo os laudos relativos à saúde e segurança do trabalhador, cuja exigência existe faz muito tempo, mas eram pouco fiscalizados.
Segurança e saúde do trabalhador
Conforme Ricardo Nicolau, a fiscalização sempre foi pouco efetiva, chegando a cerca de 3% das empresas apenas, e o setor nunca foi obrigado a enviar as informações para os órgãos fiscalizadores. “Hoje, temos que quantificar a insalubridade conforme tabela do eSocial, e existe uma sequência lógica para os envios das informações que deve ser respeitada”, destaca.
Segundo ele, todos os pagamentos relativos à insalubridade e periculosidade deveriam ser feitos de acordo com os laudos técnicos. Lembra que as empresas que ainda não providenciaram essa documentação precisam fazer o quanto antes. “O eSocial não vai cobrar informações retroativas, mas será muito preciso.”
Nicolau lembra que, mesmo estagiários e menores aprendizes precisam estar incluídos nos laudos de saúde e segurança do trabalho. Segundo ele, provoca uma mudança, ainda muito lenta na cultura das empresas em relação ao tema.
De acordo com Dondoni, na prática os laudos sempre existiram, mas eram encadernados e guardados pelo contabilista para o caso de fiscalização, que raramente ocorria. “Os empresários reclamavam da cobrança pelo laudo e acabavam escolhendo profissionais que não exigiam a documentação. Agora, a fiscalização é automática e as multas também.”
Presente no público o advogado Marcelo Mallmann afirma que a questão da insalubridade exigirá uma avaliação séria por parte dos empresários. Segundo ele, muitas vezes o pagamento era feito independente de laudo, para evitar discussões na justiça.
“Diante do eSocial temos uma outra realidade, pois só deverá ser pago o que está fundamentado pelos laudos”, destaca. Rosa lembra que a adaptação ao sistema independe do tamanho da empresa: todos os CNPJs estão incluídos.
Médicos, condomínios e MEIs
Dondoni alerta que, mesmo profissionais liberais com funcionários, como médicos e advogados, precisam enviar as informações ao sistema, e dentro dos prazo. “Empresas são empresas. Médicos com secretárias tem que cumprir, pois estão equiparados à pessoa jurídica.”
O mesmo vale para condomínios, mesmo sem funcionários. No caso dos Microempreendedores Individuais (MEI), a contratação de funcionários torna o eSocial obrigatório. Para Rosa, o mais importante para empresas de qualquer tanho, é ter um bom software de folha de pagamento para dar suporte aos escritórios de contabilidade.
Segundo o vice-presidente do Sescon-RS, toda esse mudança também impacta no custo das empresa, que precisarão criar estruturas para sistematizar o envio das informações. Lembra que as penalidades por erros podem chegar a valores exorbitantes, em alguns casos cobrados por cada registro.
[bloco 1]
“No caso da contabilidade, haverá um dilema sobre quem é o responsável pela multa, se foi a empresa ou o escritório contratado que não enviou a informação”, acredita. Para Dondoni, os serviços de contabilidade tendem a custar mais caro, porque a responsabilidade aumenta.
O vice-presidente do Sescon-RS afirma que as empresas ainda estão acostumadas com a “cultura do jeitinho”, por isso acreditam que o eSocial não veio para ficar. “Isso só vai mudar quando começar a incidir as penalidades. Por enquanto, não vejo reação.”
[bloco 2]
A conscientização, complementa Rosa, deve se estender também aos funcionários das empresas, que precisam manter seus cadastros atualizados. Quando um colaborador casa ou se separa, por exemplo, é preciso enviar as informações para a empresa. “Se a empresa não é avisada, o sistema tranca e ele fica sem receber. Então, todos os setores precisam estar envolvidos.”
Gargalos preocupam
Para os palestrantes, um dos principais problemas envolvendo o eSocial é de estabilidade do sistema. Conforme Dondoni, serão milhões de empresas enviando informações ao mesmo tempo, em uma estrutura de internet que não comporta tanto tráfego.
[bloco 3]
“No início do sistema, uma admissão demorava minutos para ser processada e autenticada. Agora, leva uma hora”, aponta. Segundo ele, a preocupação maior é em relação ao mês de junho, quando começam a ser enviadas todas as informações relativas aos funcionários.
De acordo com Rosa, a instabilidade no sistema pode resultar em atrasos nos prazos, portanto, em multas. “Se a minha empresa não entregar a folha no dia 7, por um erro de sistema, será multada. Não há flexibilidade.”
Para ela, existe grande chance de aumento da informalidade. Dondoni afirma que as empresas que não tem condições de cumprir as exigências do sistema tendem a fechar, porque não serão toleradas falhas mínimas e detalhes.
Empresário do setor de transportes, Valmor Scapini afirma que o cumprimento da lei custa caro, mas que a maior rigidez na fiscalização garante uma competição mais igualitária para as empresas que fazem o certo.
Para ele, diminuir a informalidade pode ser a premiação para quem cumpre o que está na lei. O empresário espera que o eSocial crie um ambiente mais favorável, impedindo a prática de preços aviltados por empresas que usam da informalidade para aumentar a margem de lucro.