O publicitário falou sobre o neurobranding, conceito que liga a construção das marcas aos estudos e percepções sobre o comportamento do consumidor. Segundo ele, para entender o conceito, o primeiro passo é compreender que qualquer negócio precisa fazer a diferença nas relações humanas.
Conforme Cruz, seu trabalho sempre foi o de fazer as estratégias funcionarem nos negócios. Pós-graduado em Neuromarketing e com master em Coolhunt, citou sua experiência em identificar tendências, por onde se busca descobrir oportunidades de negócios por meio da observação dos comportamentos.
Um dos trabalhos do publicitário é desenvolvido na Girando Sol, em Arroio do Meio. Segundo ele, toda iniciativa de marca parte de alguns pontos básicos. “Se tem a pessoa ou o escritório certo, e se tem mérito, processo, é linear, dá para fazer.”
Quando se tem um processo de marca, afirma, é possível trabalhar em vários segmentos diferentes de uma empresa. Conforme Cruz, o processo está relacionado ao que se quer, como quero que isso ocorra e de que forma quero ser percebido por isso.
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“Perceber é o grande negócio. Marca é o que faz, o que diz que faz e como é percebido”, lembra. Segundo ele, existe uma distância entre cada um desses pontos. “Essa estrutura fica muito clara quando você chega nesse consenso com a equipe inteira da marca.”
De acordo com Cruz, o título da palestra “Neurobranding venda, para o inconsciente” tem ênfase na vírgula porque significa que as pessoas comprarão sem consciência. “Não é mágica ou lobotomia. É como eu tenho um consumidor, qual o seu comportamento e como consigo falar com ele.”
Para isso, alerta, a base de tudo é trabalhar o que a marca faz, o que ela é e o que entrega. “Aqui temos um propósito de marca”, aponta. Para que uma marca sobreviva, alega, deve ser verdadeira em todos seus pontos de contato com o consumidor e seus comportamentos.
Comportamento humano
“Às vezes chego a ser chato porque estou sempre observando e olhando como as pessoas se comportam em todos os lugares”, afirma Cruz. Segundo ele, essa observação é importante para a compreensão sobre a natureza do comportamento humano.
Conforme o palestrante, há 70 mil anos iniciaram revoluções comportamentais importantes para a evolução do ser humano. “O homo sapiens começa a sair da África e começa a primeira revolução, cognitiva, da comunicação.”
Cerca de 12 mil anos atrás, afirma, inicia a revolução agrícola, que levou à domesticação de animais e plantas. “Começam a surgir as classes sociais, porque até então não existia propriedade privada.” Mais recentemente, cerca de 500 anos atrás, ocorre a revolução científica, quando o homem descobre a sua ignorância e sai em busca de conhecimento.
“Quando começa a analisar toda essa história do homem, entende o que nós somos”, destaca. Cita como exemplo dessa influência no comportamento a domesticação dos cachorros, iniciada 15 mil anos atrás.
“É óbvio que hoje o comportamento desse animal se parece com o do homem”, afirma. Para Cruz, uma estratégia de marketing que não leve em consideração os comportamentos não passa de malabarismos de imagens e de recursos, sem saber o que quer atingir.
“O que estamos tentando despertar emocionalmente no outro? Uma marca forte gera as mais profundas emoções”, alega. A junção do neuro com o branding, explica, é ir a fundo e juntar uma série de teorias e práticas consolidadas e trabalhar para saber por que faço isso e o que quero despertar emocionalmente. Tudo isso com base estratégia.
“Preciso entender com quem vou falar e o que quero que essa pessoa perceba sobre isso. Entender como e por que um consumidor se apaixona por uma marca”, assinala. Segundo ele, está comprovado cientificamente que uma venda ocorre de forma emocional e não racional.
“Antes de você decidir a sua compra, ela já está decidida na sua cabeça”, alega. Isso inclui os motivos para escolher uma marca em detrimento de outra. Antes de comprar, diz, o consumidor já foi estimulado mentalmente a fazer essa escolha.
Cruz sugeriu ao público do workshop fazer um experimento na próxima vez em que efetuar uma compra: observar por que se escolhe um produto em detrimento de outro. Segundo ele, não é apenas o preço que atrai o consumidor, e sim uma série de questões sensoriais, como o sabor e o cheiro, e como essas sensações estão na nossa memória.
“As grandes marcas que estão atuando têm isso. Como construo uma marca que entenda o comportamento das pessoas? Não é simples, mas é possível”, assegura. Para isso, é preciso entender e ter estratégia para identificar e construir essa marca, em um processo em que não existe achismo.Funcionamento do cérebro
Funcionamento do cérebro
O palestrante falou sobre a questão da consciência e da não consciência do cérebro. Para ele, é preciso entender como funcionam e como trabalhar com ambos. Segundo ele, uma marca forte conecta emocionalmente e constrói memória. “É o cheirinho do café que lembra o da minha vó. Nunca mais vou comprar o mais barato. E, se tiver todo um universo envolto nisso, é ainda melhor.”
Lembra que algumas emoções foram tão massificadas que perderam o significado. Diante disso, é necessário criar ressignificações para gerar essa conexão com o consumidor. “O principal é que elas se mantenham vivas no cérebro das pessoas.”
Conforme o publicitário, uma marca é como uma pessoa, e nenhuma pessoa é igual ao que era cinco anos atrás. “Por que esperamos que uma marca seja exatamente igual, queira falar comigo da mesma forma e ter o mesmo poder se eu mudei?”
A marca, na concepção do palestrante, é um organismo vivo que evolui para ser parceira do cliente. Para que um trabalho de marca seja efetivo, ressalta a necessidade de fazer uma análise profunda do universo em que ela está inserida.
“Marca é de dentro para fora. A força da marca está lá dentro no que é a razão de ser dela”, reforça. Segundo o palestrante, a junção do neuro com o trabalho de marca resulta em uma disciplina avançada que une gestão com os métodos científicos para compreender o comportamento do consumidor em relação à marca e ao mercado.
“É investigativo, de observação, com metodologia e multidisciplinar”, classifica. Ressalta que não é apenas ouvir o consumidor, mas sim observar como ele se comporta para despertar os insights. Quando se fala em marca, ressalta, também se fala em preço, lucratividade, participação no mercado e do negócio como um todo. Memória da marca
Memória da marca
Para explicar como as marcas acabam fixadas em nossa memória, Cruz citou como exemplo as grandes fabricantes de tênis. Quando pensamos em comprar um produto para corridas, ressalta, imediatamente algumas marcas aparecem na mente.
“Quando vou correr, me importa se o tênis é leve, se acumula água, se vai me dar um impulso. No final, se ele for rosa-choque, não importa”, ressalta. Porém, quando se pensa em comprar um tênis para o uso cotidiano, a cor passa a fazer diferença, e são outras as marcas que aparecem no pensamento.
“Os parâmetros mudam, mas o produto é o mesmo”, aponta. As marcas que lembramos em cada situação, diz, criaram atributos que as fazem surgir na mente de todos e isso é construir uma memória de marca no consumidor.
“Por isso, ela tem que ser verdadeira e entregar o que promete. A força da marca está condicionada à capacidade de memória das pessoas”, alega. Por isso, grandes nomes como Coca-cola e Nike não vendem produtos e, sim, envolvem o consumidor de uma forma multissensorial que vai além do objeto de compra.
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“Tudo que eu toco ou cheiro, sinto alguma coisa. Tudo, não apenas produto”, destaca. Cita como exemplo o pedido de um filé com batata frita em um restaurante. Ao invés de simplesmente servir a comida de qualquer forma, é possível espalhar no ar o cheiro da carne com especiarias, oferecer uma cadeira mais confortável, uma mesa com uma toalha de tecido bom, iluminação e temperatura do ambiente confortáveis.
“Isso é entender o que você traz para uma marca de forma multissensorial”, aponta. Segundo ele, todas as marcas têm condições de trabalhar dessa forma e, mesmo sem atingir todos os sentidos, é possível alcançar vários, cada um com uma estratégia diferente.
“A construção de uma marca pode ser feita com tudo o que sentimos dentro e fora do corpo”, ressalta. Diante desse cenário, é preciso pensar para onde a evolução humana está nos levando. Lembra que o homem não acompanha a tecnologia, mas se adapta a esse novo ambiente tecnológico.
“O ser humano está sendo desenhado e já nasceu a pessoa que vai viver bem até os 120 anos. Como eu falo para esse meu consumidor?”
Construção de valor
De acordo com André Cruz, pesquisas comprovam que, quando fazemos uma compra, se a primeira coisa que pensamos é o preço, acabamos precificando o produto. Já, quando o produto é pensado antes do preço, a visão é diferente.
“Tem produto que se eu colocar o preço primeiro vou vender menos, Porque faço comparativos e na minha cabeça vem valor e não a emoção de ter o produto”, afirma. Segundo ele, o valor de uma marca está além do preço cobrado por ela. É uma mistura entre capital humano, emocional e financeiro.
“Para entender isso, tenho que entender de mercado e ir afundo da empresa. Assim, construo uma marca significativa, porque temos o entendimento do todo”, destaca. Lembra que vivemos em um mundo onde somos bombardeados por estímulos, e que para ser lembrado é preciso realmente fazer a diferença.
“Quando tivermos 66 anos, teremos visto 2 milhões de anúncios televisivos, oito horas por dia, durante sete dias por semana em um intervalo de seis anos”, ressalta. Porém, lembra que o consumidor só lembra de 2.2 de cada 21 anúncios que ele já viu na vida.
“Ou eu sou relevante, ou eu sou forte ou realmente conecto emocionalmente, ou entendo porque eu estou fazendo o que estou fazendo, ou serei um cara que se foi”, alerta. Segundo ele, marca é estratégia de negócio e comunicação, e esse ciclo virtuoso é o que dá certo.
Conforme o palestrante, Neurobranding é esse apanhado complexo, que trabalha a marca de forma profundo com consciência estratégia para que ela se consolide.
Adair Weiss – O que preciso perceber e como devo começar a realizar um trabalho de marca?
André Cruz – É uma consolidação de vários pontos. Ainda temos empresas que trabalham de forma segmentada, onde o marketing não conversava com o comercial. Esse é o primeiro ponto: observar internamente na estrutura se ela é uma estrutura ou várias, se é uma marca ou mais. Porque, se for uma marca, ela fala uma coisa só e as pessoas lá de dentro têm esse mantra do que elas falam e são. Fazendo um exercício, se estou em um elevador no térreo e entra um investidor que eu quero no negócio, tenho alguns segundos para falar da minha marca. Todo mundo da empresa tem que falar isso e saber o que a marca quer comunicar. Comunicar não é mídia em si, mas o que está atrás. O primeiro exercício é observar se essa estrutura se fala, se comunica. Se ela não se comunicar, é o primeiro ponto a ser alterado.
Elisete Kreutz – A relação entre consumidor e a marca é uma relação de confiança. Quando se fala de vender para o inconsciente das pessoas, não podemos ter uma quebra dessa confiança?
Cruz – É importante ter o conhecimento profundo da marca e entregar a verdade. Marca forte é marca verdadeira. Que faz o que diz que faz e é percebida por isso. Porque, se ela não disser a verdade, ali na frente terá problemas hoje, mais do que nunca, devido ao comportamento do jovem de verificar o que compra. Na Girando Sol, eu queria saber se os produtos faziam mal ou não e hoje temos o selo de dermatologicamente testado. Para obter esse selo, deixei o pessoal do laboratório maluco. Porque o produto não é apenas o produto. O que está atrás desse dermatologicamente testado? Isso não é frescura. Se tenho essa verdade, posso dar a minha cara a tapa. Para isso, você precisa ter profundidade e completa ciência do que está falando. Você é responsável. Você pode ter um produto e dizer que ele promove alegria, mas se a química dele resseca a mão está errado. Nos mínimos detalhes é que se constrói confiança. Não quebre essa confiança e não ache que o consumidor é bobo. É frescura não fazer testes em animais, por exemplo? Os pets são um mercado que cresce na casa do bilhão ao ano. Isso é um comportamento, entre vários outros. Se uma pessoa descobre que o que você diz não é verdade, é tchau marca e você não reconquista. Marca tem que entregar o que promete.
Marciano Krein (Gerente da Benoit de Capitão) – As empresas ainda brigam muito por preço. Como vender pelo produto?
Cruz – Quando vejo um preço primeiro em determinado produto, e eu estou com vários, posso julgar o produto com base no preço. Voltamos para o branding, o que minha marca é com quem ela fala e o que ela faz. A Apple não fala preço. Que outras não falam preço? Mas se estou numa gôndola preciso falar o preço, mesmo porque a legislação exige. O que essa marca me chama de tal forma que o preço é caro ou barato? Porque é relativo. Dez reais pode ser caro e pode ser barato. Mas essa é uma decisão que depende de uma série de fatores e de como eu sou percebido. Se sou percebido como uma empresa de volume grande, de desconto, se tirar o preço, eu morro. Tem que tomar cuidado. Mas mesmos essas empresas de grande volume têm ações nesse sentido. A rede Pão de Açúcar, quando começou a vender vinhos, colocava um produto em um espaço acarpetado onde, para chegar, você subia um degrau. Ao subir um degrau, estou me elevando. O carpete é macio, tinha uma pessoa só para vender vinho. A empresa alavancou o vinho, mas não tirou o preço do resto. A questão de preço é uma observação: eu olho o produto e analiso o preço. Vale ou não vale? Essa análise é uma união de vários fatores.
Thiago Maurique: thiagomaurique@jornalahora.inf.br