Os desafios de recrutar, manter bons profissionais e com isso minimizar os índices de rotatividade nas corporações foram o tema do Workshop Negócios em Pauta do mês de junho. O encontro realizado na sede do Sincovat, em Lajeado, teve a participação do presidente da Rede Imec, Leonardo Taufer, da consultora organizacional da Capital Verde, Fabiana Corbelini, e da coordenadora de recrutamento e seleção da Univates, Janaína Schneider.
Líder de uma empresa com 2,1 mil colaboradores e unidades em 14 municípios, Taufer afirma que o maior desafio da Imec é deixar de ser apenas uma porta de entrada para o mercado de trabalho. Segundo ele, os supermercados acabam assumindo esse papel devido à baixa exigência de qualificação para parte das funções.
“As pessoas procuram porque percebem no setor uma forma rápida de ingresso no mercado”, alega. Conforme o presidente, a empresa procura fazer com que o colaborador não veja o Imec apenas como a porta de entrada.
“Temos despertado nas pessoas que trabalham conosco e na reputação que nosso trabalho cria nas comunidades que estamos inseridos o conceito de propósito”, aponta. Para isso, alega, a rede trabalha conceitos normalmente pouco encontrados no mercado de trabalho.
“As grandes empresas costumam olhar primeiro para o cliente e depois para o colaborador e nós invertemos essa lógica”, afirma. No conceito defendido pela Imec, tanto clientes quanto colaboradores são pessoas, e para impactar os consumidores, primeiro é necessário tratar o colaborador de uma forma diferente, com políticas e diretrizes voltadas para o bem-estar dele.
“Dessa forma, conseguimos passar um propósito”, acredita. Além de estabelecer um tratamento diferenciado aos profissionais, a empresa também aposta no recrutamento adequado para assegurar as competências necessárias para cada atividade.
“Muito mais do que desenvolver pessoas, precisamos recrutar bem e desenvolver o trabalhador a partir dessas competências”, afirma. Conforme Taufer, quando uma empresa consegue identificar as pessoas certas para as posições certas, o trabalhador acaba desempenhando as tarefas naturalmente, o que representa maior eficiência.
Para Fabiana Corbellini, o processo estabelecido pela Imec faz todo o sentido. Segundo ela, a Capital Verde é uma empresa de consultoria e assessoria que começou a oferecer serviços de recrutamento e seleção devido a essa necessidade nas empresas.
Conforme Fabiana, hoje o mercado de trabalho busca mais as competências comportamentais do que o conhecimento de uma forma geral. “Não que o conhecimento deixa de ser importante, mas anos atrás se olhava para o currículo e a formação em primeiro lugar e hoje a prioridade é para o comportamento.”
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As questões comportamentais, alerta, hoje representam o principal motivo para as demissões. Para descobrir se o perfil de comportamento do profissional é o mais adequado, uma contratação não pode ser apressada. Afirma que um dos principais gargalos é encontrar o tempo necessário para que a contratação seja efetiva.
Treino para entrevista
Mediador do encontro, o diretor-geral do A Hora, Adair Weiss, perguntou aos convidados sobre uma questão que preocupa os gestores, a dos candidatos que se especializam em entrevistas e passam uma imagem diferente da real nas seleções.
Para Janaína Schneider, da Univates, um processo seletivo bem estruturado evita que o treino específico para entrevistas defina uma contratação. “Adotamos essa prática de um ano para cá, com a criação da direção de desenvolvimento de pessoas.”
Dentro dessa reformulação, afirma, foram adotadas novas práticas de recrutamento e seleção. “Uma entrevista de 30 minutos não é o suficiente para conhecer o candidato e identificar se ele está sendo sincero e mostrando sua essência.”
Conforme Janaína, cada processo de seleção na universidade é personalizado e inclui práticas de acordo com o perfil profissional buscado. “Temos duas psicólogas e a formação em Psicologia ajuda a nos dar uma base para a questão comportamental.”
Entre os métodos utilizados para desvendar a essência dos candidatos, está perceber pequenos detalhes na forma como ele se comunica, nas atitudes em grupo e na interação fora dos períodos formais do processo, como nos intervalos para café.
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De acordo com Leonardo Taufer, a rede Imec também adapta os processos de contratação de forma a encontrar os profissionais apropriados para cada posição, mas ressalta que não existe fórmula pronta para isso.
Segundo ele, se no passado a empresa delegava somente ao Setor de RH a responsabilidade pelos recrutamentos, hoje a participação do gestor é regra. “A essência do recrutamento está dentro das competências da liderança.”
Índices de rotatividade
Conforme Taufer, as novas práticas adotadas pela companhia asseguraram uma redução nos índices de rotatividade. Em 2015, lembra, o turnover chegava a 10% do quadro funcional todos os meses, o que significava a troca de 120% dos trabalhadores todos os anos.
“Em algumas funções operacionais, como atendimento na área de perecíveis e caixa, a rotatividade ainda era maior”, alega. Hoje, a rede tem índice de 3% a 4% ao mês, alcançando média de rotatividade de 40% a 50% ao ano.
“Essencialmente começamos a conscientizar nossos gerentes de loja que deixe de passar para a área de recrutamento uma função que deveria ser dele”, relata. Cita como exemplo as seleções para líder de açougue e padaria, em que participa das últimas etapas de recrutamento.
“Faço questão de entrevistar essas pessoas. Certamente não tenho competência técnica para ensinar o padeiro a produzir o pão, mas tenho que perceber nele quais são os valores que o identificam com a empresa.”
Entre os temas abordados na entrevista, estão como o candidato conduz a vida dele fora da empresa e de que forma ele tem tomado decisões, sejam elas quais foram. Porém ressalta que essa não é uma tarefa fácil e que a empresa ainda tem uma rotatividade acima da desejada.
“Trocamos metade do nosso quadro uma vez por ano em funções que são extremamente repetitivas, cujo nível de criação e inovação é pequeno, e onde é preciso cumprir processos”, relata. Segundo ele, hoje o principal desafio da Imec é entregar para o cliente um atendimento padronizado em todas as unidades.
Tempo x necessidade
Mediador do evento, Adair Weiss falou sobre sua experiência de 15 anos como líder de empresa, portanto, gestor de outras pessoas. Segundo Weiss, se no início todas as contratações passavam por ele, com o tempo, outras pessoas foram entrando no negócio e ocupando essas funções.
“Em um determinado período, eu imaginava que não podia mais falar com as pessoas que contratávamos, pois me diziam que era perder tempo”, lembra. Essa política foi alterada faz cerca de dois anos, e hoje, mesmo com 80 colaboradores na equipe, a última entrevista passa pelo diretor- geral do A Hora.
Ele questionou os presentes sobre como equacionar essa falta de tempo dos gestores com a necessidade de conhecer a equipe em empresas ainda maiores.
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Conforme Janaína, a Univates passa por uma mudança de cultura nesse sentido. Segundo ela, antes, quando os gestores procuravam o setor de recrutamento para preencher vagas, a primeira pergunta era sempre se realmente precisava passar por todas as etapas determinadas.
“A gente dizia para fazer o processo completo e depois avaliar se deu certo ou não. Depois de duas, três vezes, eles percebem que é importante”, ressalta. Quando se fala em comportamento, aponta, é algo muito particular de cada um, e por mais que se possa indicar pontos a melhorar, é praticamente impossível mudar a essência de um indivíduo.
“A questão técnica você ensina, mas o comportamental não e a participação do gestor é fundamental nesse sentido”, afirma. Na política adotada pela Univates, o gestor se envolve desde o princípio, sendo responsável por autorizar a vaga na pró-reitoria e estabelecer o perfil desejado junto com o RH.
Segundo ela, a depender do tipo de vaga e da quantidade de candidatos, não há a necessidade de tantas etapas, mas em posições de menor complexidade, em que os currículos são muito parecidos, é preciso dar oportunidade para que as pessoas se apresentem na instituição.
No caso da Univates, Janaína ressalta ser um pouco diferente das demais empresas, pois, além da grande quantidade de profissionais, os candidatos em geral são jovens qualificados e muitos ex-alunos ou ainda alunos da instituição.
Pequenos negócios
Se a definição e contratação da pessoa com o perfil ideal é um desafio para as grandes empresas, em organizações menores, com poucos funcionários e onde os donos também exercem funções operacionais, o processo se torna ainda mais difícil e importante.
Conforme Fabiana, independente do tamanho do negócio, o primeiro passo para uma boa contratação é a definição do perfil. Lembra que hoje 90% das empresas não têm descrição de cargos ou atividade.
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A primeira etapa, reforça, é definir o tipo de profissional desejado. De acordo com Fabiana, o trabalhador adequado é aquele que se identifica com os valores e princípios da empresa e o tipo de pessoa que o gestor quer trabalhando ao lado dele. “Quem eu quero abrindo minha loja, conversando com as pessoas e atendendo meus clientes?”
Se isso ainda não faz parte da cultura da empresa, aponta, é fundamental definir qual a imagem que o dono quer que a companhia deixe como marca na sociedade e, a partir daí, procurar pessoas que acreditem nisso. “As organizações têm que parar e se redefinir como empresa.”
Demissões e líderes
Quando um profissional já contratado não se encaixa mais no perfil exigido pela empresa, a demissão acaba se tornando necessária. Para Taufer, neste momento, é importante adotar o feedback como prática, de forma a assegurar que o profissional compreenda por que está sendo desligado.
“Antes de uma demissão, é importante proporcionar feedbacks constantes para que a pessoa possa se desenvolver e melhorar”, relata. Segundo ele, o desligamento é um processo dolorido resultante de um recrutamento malfeito.
“Uma vez que errei na contratação, dei feedbacks constantes e a pessoa não responde, o segundo erro é mantê-la na empresa”, aponta. Para Taufer, quanto mais rigoroso o recrutamento, a demissão se torna menos necessária.
Na plateia, o contador Rui Mallmann afirmou que as empresas buscam cada vez mais um perfil de profissional que não seja apenas operador e cumpridor de tarefas, mas sim líder pró-ativo capaz de se portar como se também fosse donos de uma organização. Ele questiona se é possível criar esse perfil de líder em um trabalhador ou se essa característica é particular de cada um.
Conforme Janaína, criar um líder é mais difícil, mas é possível descobrir um líder dentro da equipe. Para isso, afirma, é necessário dar oportunidades. “O funcionário precisa perceber que, mostrando as habilidades que ele tem, ele pode se beneficiar e construir a sua carreira dentro da empresa.”
Cristiane Pozzebon – Como evitar o assédio do mercado a talentos que recrutamos e investimos no desenvolvimento?
Leonardo Taufer – Temos alguns programas que visam minimizar esse impacto. Estatisticamente temos perdido muito pouco para a concorrência. Nossa rotatividade nas posições de liderança é muito baixa. Mas sempre é uma preocupação porque passamos por um período, nos últimos seis anos, tentando impactar a forma como as pessoas enxergam o Imec. Trabalhamos para ter pessoas conosco que acreditem nos propósitos e nas crenças da empresa. Quando identificamos talentos dentro desse perfil, dificilmente eles saem da empresa porque o aspecto da remuneração passa a não ser determinante. Essa pessoa percebe um conjunto de fatores pelos quais vale a pena permanecer. Temos um programa de trainee interno para coordenador de loja. Fazemos com que a pessoa experimente todas as áreas dentro de um período um pouco menor de um ano. Dá uma visão 360 graus da empresa para poder despertar nela os fundamentos que façam sentido para ela e para a empresa. Neste ano introduzimos o programa de trainee externo, com perto de 400 candidatos em que conseguimos aprovar quatro. O rigor é grande para buscar competências técnicas e comportamentais, mas é frustrante conseguir apenas quatro. A intenção de ambos programas é identificar e reter talentos.