Uma ameaça à liberdade de imprensa

Editorial

Uma ameaça à liberdade de imprensa

A divulgação de áudios da conversa entre o ex-blogueiro da revista Veja, Reinaldo Azevedo, com Andréa Neves, irmã do senador afastado Aécio Neves, vai contra os preceitos legais para a atividade jornalística. Não se trata de um inquérito, o jornalista…

A divulgação de áudios da conversa entre o ex-blogueiro da revista Veja, Reinaldo Azevedo, com Andréa Neves, irmã do senador afastado Aécio Neves, vai contra os preceitos legais para a atividade jornalística. Não se trata de um inquérito, o jornalista não é investigado, nem denunciado por qualquer ilícito envolvendo a investigação da Lava-Jato. Trata-se de uma conversa entre profissional e possível fonte de informação, sem qualquer relevância jurídica.
Pode-se discordar ou concordar com as opiniões de Azevedo, mas expô-lo pelo simples fato de conversar com uma pessoa alvo da investigação é incorrer em um erro, pois os profissionais de imprensa têm garantido em lei o sigilo de fonte. Como avaliou o professor em Direito Processual Penal, Guilherme Madeira Dezem, em publicação no blog “Justificando”: “a interceptação não era voltada para Reinaldo Azevedo, mas sim para Andréa Neves. Dentre as ligações interceptadas, ocorreu de cair uma conversa que envolve sigilo de fonte e liberdade de imprensa. Seria a mesma coisa se caísse uma conversa dela com um advogado, por exemplo. Tanto no caso do advogado quanto no caso do jornalista, a conversa não pode ser utilizada.”
Pela lei de interceptação, a gravação que não possa ser usada como prova deve ser inutilizada por decisão judicial. A partir disso, cabe ao Ministério Público ou à pessoa investigada requerer a destruição do material. Na Alemanha, a legislação obriga que em casos como esse se pare de gravar.
Os áudios integram um lote com mais de duas mil gravações entregues à imprensa após o ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato, decretar o fim do sigilo do caso. Na liberação do magistrado, não menciona a existência de conversas com jornalistas, nem o direito ao sigilo de fonte.
Esse fato traz um componente muito sério: se a gravação entre o jornalista e a fonte (ou amiga) não tem relação com qualquer crime, qual a justificativa para ela ter se tornada pública? O monitoramento e grampos em qualquer conversa exigem cuidados para que não se invada a privacidade das pessoas. Outro aspecto: a divulgação das ligações deve ser feita quando houver uma justificativa que denote interesse público. Não é o caso. Azevedo foi exposto em uma conversa em que critica o veículo no qual trabalhava. Uma informação sem relevância para o processo, ou mesmo para o público.
Neste momento de desatino na vida política nacional, é preciso defender os direitos das pessoas, independente do ponto de vista, das suas opiniões ou preferências. Ignorar esse ataque à privacidade e à liberdade de imprensa é tornar possível a propagação de grampos e divulgação dos conteúdos tendo como único interesse denegrir ou prejudicar o outro.

Acompanhe
nossas
redes sociais