Cenário é desolador

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Cenário é desolador

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Por volta das 15h de segunda-feira, com a chuva caindo de forma torrencial e ininterrupta, Elza Schmidt esperava pelo pior. Dezoito dias antes teve de deixar sua casa, na rua Décio Martins Costa, centro de Lajeado, às pressas. A velocidade com a qual a água invadiu terrenos e vias públicas impediu que ela salvasse boa parte de seus pertences.

Desta vez o medo foi maior. Antes mes­mo do sol se pôr, ela removeu móveis, eletrodomésticos, roupas e material de trabalho. Alguns itens não podiam ser retirados, pois foram deteriorados devi­do à enchente passada. Outros estavam abandonados ao lado da residência, cujo IPTU está pago.

enchenteA água mal havia se acumulado nos cantos da rua, mas a pressa em retirar os pertences tinha uma justificativa. “Depois que aterraram terrenos vizi­nhos, a água chega mais depressa e in­vade tudo.”

O trabalho de remoção durou toda ma­drugada de terça-feira. A ajuda coube apenas a parentes e amigos. Pela ma­nhã, seu parceiro João Cunha seguia na função. “Ela não aguentou e precisou dormir.”

A água agora está a menos de um me­tro da porta de casa, quando um vizinho lhe lembra do fogão a lenha. Ele corre para dentro de casa. “Se eu esqueço, ela me mata.” Menos de 30 minutos depois sua casa era atingida, e em duas horas o Rio Taquari atingiu 24,6 metros e a água chegou ao segundo piso.

Experiência ajuda a conter prejuízos

Próximo dali, nos fundos de uma revenda de veículos, mora Waldemar Viana. São 34 anos enfrentando enchentes. A experiência faz com que seus prejuízos sejam mínimos.

Pela manhã, seus móveis es­tavam protegidos por uma lona na parte alta da rua Rodolfo He­xsel, e ele ajudava os vizinhos a esvaziarem suas casas. “Posso até te dizer onde esta água che­garia”, diz ele apontando para o telhado de sua casa. A noite foi em claro. “Nosso sono é de quero-quero. Dorme uma hora, e fica duas acordado (sic).” Uma hora depois, a enchente atingiu o telhado.

Seu vizinho, Nelson Ivanor de Souza, reclama da falta de atenção. Diz que ninguém foi avisado e, não fosse pelas no­tícias transmitidas pelo rádio, teria perdido boa parte dos móveis. “Estou desde as 5h pu­xando tudo para fora na unha e com ajuda dos amigos. Não veio caminhão algum para me ajudar.”

O dono de uma metalúrgica endossa a reclamação. “Tive de pagar R$ 100 de frete para retirar o material da loja. Mais meia hora e estaria tudo debai­xo d´água.”

Flagelados e acidente fatal

De acordo com o coordenador regional da Defesa Civil, major Vi­nícius Renner, a chuva que acumulou 130 milímetros em dois dias obrigou 225 famílias a deixarem suas casas no Vale do Taquari. A cidade mais atingida foi Arroio do Meio, onde 65 foram encaminha­das para ginásios municipais. O retorno deverá iniciar na manhã de hoje em alguns pon­tos.

Na localidade de Li­nha Geraldo, três pes­soas morreram após o carro em que estavam cair de um pontilhão que estava quase sub­merso pela água do Ar­roio Geraldo, na tarde de segunda-feira. Para a Defesa Civil, Reimar Rahmeier, 63, Alfre­do Horst, 76, e Nadir Horst, 75, moradores de Imigrante, são con­sideradas vítimas da enchente.

Enchente apresenta seus heróis

Há três semanas, o jovem Alex Diego dos Santos, 20, comoveu leitores ao res­gatar pais, dois irmãos, namorada e ca­chorros da enchente no bairro Lago Azul, em Encantado. Jornais do estado e país (capa do A Hora) publicaram a cena re­gistrada pelo fotógrafo Juremir Verset­ti no momento em que o jovem salvava seus três cães.

Sustentado por uma porta de frigorífico e um pedaço de madeira, improvisado de remo, Alex navegou entre os telhados das casas submersas. “Começo a tremer só de pensar naqueles momentos”, re­lembra o jovem.

Alex está orgulhoso. “Me senti um he­rói”. Ao mesmo tempo, desolado quando olha ao redor da sua casa e vê a água invadindo outra vez as residências. As paredes não tiveram tempo de secar e foram tomadas pela água. “Isso é um in­ferno.”

Ele e a namorada, Susan Pereira, se mudaram para o bairro Planalto há duas semanas, onde a casa também foi atingi­da pela enchente desta terça-feira. Desta vez, ele foi mais rápido e conseguiu reti­rar os poucos móveis e roupas compra­dos há poucos dias.

Alex estudou até a 7ª série, e do traba­lho de desossa no frigorífico de uma coo­perativa ele consegue garantir o sustento de sua nova família. Depois de uma vida marcada pelas chuvas, ele tem apenas um sonho: ter uma casa onde esteja a salvo das enchentes.

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