“Não havia exemplo mais forte do que a lembrança da tragédia do ano passado”

Abre Aspas

“Não havia exemplo mais forte do que a lembrança da tragédia do ano passado”

Peterson Haas, de 23 anos, natural de Lajeado, foi escolhido como orador da turma na cerimônia de formatura da Universidade de Richmond, nos Estados Unidos. Formado em Economia e Bioquímica, ele conquistou o público com um discurso emocionante, que teve como tema central a devastadora enchente que atingiu o Rio Grande do Sul. A fala do jovem viralizou nas redes sociais e comoveu internautas ao redor do mundo

“Não havia exemplo mais forte do que a lembrança da tragédia do ano passado”
Foto: acervo pessoal

O que te motivou a buscar uma formação acadêmica nos Estados Unidos?

O sonho de estudar fora surgiu em 2012 (na época eu tinha 10 anos), enquanto assistia ao programa Soletrando do Luciano Huck e o assunto foi abordado. O que mais me encantou nesse dia foi saber que o processo para estudar fora englobava mais do que notas. Era um conjunto de fatores que buscavam avaliar o estudante num contexto holístico. Esse sonho foi, aos poucos, se tornando um objetivo mais concreto conforme eu me envolvia em atividades extracurriculares como olimpíadas e feiras científicas.

Quais os maiores aprendizados pessoais que essa mudança te proporcionou?

Meu maior aprendizado foi entender que, antes de você tentar abraçar o mundo, precisa abraçar a si mesmo. Entrei na faculdade com a vontade de aproveitar ao máximo cada oportunidade, como se tivesse uma cobrança interna constante, consciente do quanto foi difícil chegar ali e do privilégio que é estar nesse espaço. Com o tempo, entendi que essa pressa em dizer sim para tudo me afastava de mim mesmo, e que cuidar da minha saúde mental, celebrar pequenos momentos, cultivar relacionamentos e tempos de lazer também era um investimento e não “perda de tempo”.

Como foi receber o convite para ser o orador da turma na cerimônia de formatura?

Sempre vi esse momento como uma oportunidade de transmitir uma mensagem pessoal e, ao mesmo tempo, universal — algo que tocasse não só os formandos, mas todos os presentes. Apesar do nervosismo, a vontade de comunicar algo significativo prevaleceu. O processo de seleção exigia a submissão do discurso por escrito. Fui um dos dez finalistas a apresentá-lo ao vivo para um comitê ligado à presidência da faculdade. A reação deles foi marcante: alguns choravam, outros consolavam — uma cena emocionante e até um pouco engraçada.

O que te motivou a incluir em seu discurso a situação do Vale do Taquari e as enchentes de maio de 2024?

Para mim, um tema que realmente atravessa a experiência de qualquer estudante de graduação é a resiliência. Esse é um período desafiador não apenas no aspecto acadêmico, mas também por marcar o início da vida adulta, com todas as incertezas e transformações que ele traz. Para ilustrar essa ideia, recorri a uma imagem muito próxima da minha realidade: como gaúcho e morador de uma região marcada por enchentes, não havia exemplo mais forte do que a lembrança da tragédia do ano passado. O que presenciei ao chegar na minha cidade foi profundamente marcante. Ver o esforço dos voluntários e a união da comunidade foi inspirador. Ainda assim, não imaginei que o discurso teria tanta repercussão, especialmente o trecho em que falo sobre as cheias.

Qual foi a reação do público ao ouvir sobre a tragédia em sua cidade natal durante a formatura?

Durante e logo após o discurso, senti que tinha cumprido o que eu queria, mas ainda não sabia ao certo como ele tinha sido recebido; afinal, a cerimônia continuava e meu discurso foi logo no início. Só ao final percebi o impacto, quando fui calorosamente abordado por colegas, familiares, professores, funcionários e até pelo presidente da universidade. Nunca tinha falado para tanta gente (cerca de 8 mil pessoas) e muito menos em outra língua. Ainda assim, meu desejo era apenas viver aquele momento também. De nada adiantaria ter escrito algo tão verdadeiro para mim se eu não conseguisse senti-lo e transmiti-lo. E, pelas vezes que precisei segurar o choro, acredito que emoção não faltou!

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