O abandono da leitura analógica

Opinião

Aline Ferreira

Aline Ferreira

O abandono da leitura analógica

Nascida no início dos anos de 80, tinha um desejo muito comum entre as crianças daquela época: aprender a ler. Aprender a ler é um marco na vida de qualquer indivíduo. Aos que não tiveram esta oportunidade, um pesar e um entrave no desenvolvimento sociocognitivo.

É claro que as crianças ‘nascidas digitais’ mantém vivo este desejo. A alfabetização ainda é uma das maiores ambições da infância. Entretanto, o desejo de ler o mundo tem sua atenção dividida entre outras ofertas que muitas vezes são muito mais atraentes. Digo ainda que os desejos são alinhados e ou fomentados pelas circunstâncias.

Se a criança vive intensamente o universo da alfabetização, mesmo quando está fora do espaço físico escolar, por óbvio ela estabelece uma conexão mais sólida com o letramento. Ou seja, além de aprender a decodificar os códigos da língua escrita, ela aprende a interpretar o que lê com familiaridade. A criança se torna mais íntima das razões pelas quais a leitura é importante, e entende que isso é na verdade uma ponte para desbravar o mundo.

O letramento e a alfabetização são dois conceitos diferentes e importantes no desenvolvimento da linguagem, e fazem parte da formação dos estudantes, relacionando-se principalmente à leitura e escrita. Enquanto a alfabetização está relacionada à aprendizagem da escrita alfabética, o letramento trata a língua como uma ferramenta ou produto social. Dentro destes dois conceitos está o desenvolvimento de diferentes habilidades.

Quando falamos do desenvolvimento destas diferentes habilidades, em ambos os casos digo que o excesso do digital, somado à ausência do analógico, prejudica o desenvolvimento do pensar.

Quando lemos no papel, vivemos uma experiência sensorial capaz de influenciar nos resultados da nossa compreensão do texto. Temos a capacidade de concentração aumentada, por conseguinte, significativa memorização da leitura. Apreensão de conhecimentos ou fatos lidos. Por proporcionar uma leitura mais compenetrada ou aprofundada, há maiores chances de que passemos por diferentes estágios de consciência morfológica, metalinguística, fonológica, e consciência global em níveis de leitura e letramento. Ou seja, uma influente e oportuna capacitação cognitiva que, via de regra, não pode ser alcançada na leitura digital.

Além disso, o mundo digital está associado a uma velocidade muito maior de informações ofertadas ao mesmo tempo. Tanto pela disposição de links complementares a uma leitura principal, como pelo recebimento de notificações a qualquer tempo. Estas distrações interferem tanto quando de fato acontecem, como também quando não estão efetivamente acontecendo geram uma certa ansiedade pois o cérebro já tem percepções desta experiência.

As atividades mediante as telas digitais, podem ativar a liberação de dopamina, o que pode aumentar nossa dificuldade de concentração na leitura. Além disso, ou da mesma forma, o hábito excessivo de tão somente viver a leitura digital, acostuma o cérebro a este esquema de prazer e recompensa proporcionado por sua dinâmica de alertas, notificações, brilho, links para vídeos, e afins. Quando na ausência de todos estes estímulos, a leitura no papel pode ser percebida como monótona ou enfadonha.

Essa diferença abissal que há entre estes dois universos de leitura precisam urgentemente serem observados, comparados e equilibrados. Estamos correndo o risco de perdemos definitivamente a capacidade de uma leitura paramentada na virtude do silêncio, da concentração profunda e imaginativa, que acontece majoritariamente no impresso. A possibilidade de ler uma história inventada ou fundamentada, mas que por vezes vem despida de ilustrações e vídeos complementares, é uma grande oportunidade de desenvolvimento cognitivo a partir da imaginação, que é uma função complexa do cérebro, capaz de formar redes em diferentes regiões do cérebro.

A leitura em um livro altera, fortalece e estimula a formação de novas sinapses do pensamento. Abrir um livro pode ser o primeiro passo para sair da inércia, salvar apatia do pensar.

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