Vítimas da espécie humana, animais contribuem para educar as novas gerações

fauna e flora

Vítimas da espécie humana, animais contribuem para educar as novas gerações

Zoológico da UCS abriga animais silvestres resgatados sem condições de voltar à natureza

Vítimas da espécie humana, animais contribuem para educar as novas gerações
Bugio-ruivo é um dos resgatados. Espécie tem status de vulnerabilidade. (Fotos Bruno Zulian/divulgação)

“Nosso zoológico não comemora nenhum animal que tenha que ficar fora do seu habitat, mas da oportunidade para que tenham uma segunda chance e boa qualidade de vida. Nós gostaríamos que todos estivessem livres, na natureza. A grande marioria dos 88 animais do nosso plantel têm alguma história de impacto negativo com a espécie humana, seja cativeiro ilegal, caça, atropelamento, maus-tratos.”

A fala do coordenador do Zoológico da Universidade de Caxias do Sul e docente do curso de Medicina Veterinária da UCS, professor Leandro do Monte Ribas, justifica a importância não só de acolher os animais que não têm como serem reintegrados na natureza, mas de promover a educação ambiental. Atualmente, 49 espécies, em sua maioria nativas da Mata Atlântica, formam o plantel.

Resgates

De acordo com Ribas, entre as espécies resgatadas pelos órgãos públicos ambientais destacam-se gambás e ouriços, bugio, tucanos, papagaios, veados, graxains e lagartos. “O gato maracajá é um felino que está em vulnerabilidade quanto ao risco de extinção e que também chega com frequência.” Eventualmente, tamanduá, jacaré, cobras, entre outros.

Os animais resgatados são provenientes de acidentes, caça ou cativeiro ilegal, contrabando.Há casos de animais atropelados e vítimas de maus-tratos que chegam com bastante debilidade física, o que dificulta muito a recuperação. “O trabalho da equipe de médicos veterinários e biólogos com suas equipes é muito complexo com animais silvestres, até porque a literatura traz pouca informação médica diante da grande biodiversidade.”

Os maus-tratos se dá muita publicidade nos pets, nos cavalos, conta. “Nos silvestres, são criadores ilegais e aí os maus-tratos já começam ali, na captura. Mesmo que não apresentem danos físicos, o cativeiro causa dano psicológico.”

“Tratar um animal silvestre é um grande desafio”

Recursos materiais e humanos permitem atendimentos como o da cobra sucuri amarela, que passou por uma tomografia computatorizada

O coordenador do Zoológico da UCS, Leandro do Monte Ribas, observa que é sempre um desafio muito grande para equipe de profissionais quando chega animal silvestre. “Eu sou apenas o coordenador do Zoo, mas acompanho a complexidade dos atendimentos pela equipe. Precisam ser manejados, eles são selvagens, não entendem que a equipe está fazendo um manejo para o bem deles.” O próprio atendimento, conta, estressa e pode ser um fator de óbito pra eles. Segundo Ribas, é complexa a situação dos animais que chegam ao zoo quando em situação de emergência, machucados, como em casos de atropelamento.
Os que chegam de apreensões de cativeiro, de venda ilegal, geralmente não costumam chegar muito debilitados ou machucados. Só com traumas psicológicos, mas necessitam cuidados complexos.”

Entre os casos mais emblemáticos, o professor do curso de Veterinária destaca o de um Jacaré recolhido na serra gaúcha. O réptil chegou com um projétil – tinha levado um tiro – no crânio. “Esse animal passou por nosso cuidado, fez raio-x, exames complementares, acompanhamento, teve uma vida um pouco mais prolongada”, lembra Ribas. Meses depois acabou tendo óbito por conta das sequelas deste projétil alojado no crânio. “É um caso emblemático, porque é um animal grande, foi dado todo o cuidado como se fosse dado para um cachorro, dentro das condições de tecnologia na universidade. Somos muito bem equipados, tanto de recursos materiais quanto de recursos humanos.”

Outro caso marcante, que ganhou grande repercussão da mídia, foi de uma cobra sucuri amarela, de dois metros de comprimento e 8kg, capturada às marges do Rio Uruguai, em São Borja. “O Ibama nos trouxe para fazer uma tomografia computadorizada.”

Ribas é médico veterinário, mas não atende os animais. Trabalha na área administração e na coordenação, mesmo assim, garante: “Tem casos que nos cativam bastante.”

Reabilitação

Além da área aberta à visitação, o Zoológico da UCS mantém uma estrutura, sem acesso ao público. Apenas a equipe interna trabalha no local de reabilitação dos animais e preparação para soltura, quando possível. O processo conta com profissionais das equipes da UCS e autoridades ambientais, sempre em cumprimento à legislação vigente.

Dia letivo no zoo foca a educação ambiental

Com estudantes do Ensino Fundamental são trabalhados os conteúdos da grade curricular

O papel do Zoológico da UCS é conscientizar, principalmente as crianças, que aqueles animais não deveriam estar ali. “É bonito ver, eles se encantam. Observar uma cobra, um tucano, um puma, macacos. Mas os nossos monitores, estudantes de graduação das áreas agrárias e biológicas, têm o desafio de falar os motivos de estarem estão ali e o porquê precisamos mudar isso”, explica Leandro Ribas.

Para o professor Ribas, preservar a fauna é muito importante para manutenção dos ecossistemas e tem que ser feita de forma integral. “As crianças enxergam ali o problema e trabalham ali como ter a solução, que é não cometer crimes, que é preservar. As crianças da Educação Infantil, segundo ele, entendem isso muito bem. E depois as professoras trabalham em sala de aula.

Com os estudantes do Ensino Fundamental são trabalhamos conteúdos da grade curricular, como a importância dos animais no seu ecossistema. “O bugio, por exemplo, eles estudam no livro, nos slides, e ali eles têm oportunidade de enxergar, observar o comportamento desse animal, que não é o natural por completo, e ver que precisa preservar a partir de toda a conversa com os monitores.”

Para Ribas, o trabalho mais impactante é a conscientização ambiental que a equipe consegue desde os pequenos aos maiozinhos. “É formar um cidadão que tenha consciência ambiental. A equipe do professor Ribas costuma chamar zoológico de laboratório vivo para o ensino. “Ele permite uma imersão, uma inserção dentro de uma fatia da Mata Atlântica, da fauna que está ali dentro, porque 90% dos nossos animais são da Mata Atlântica, alguns em risco de extinção.”

Sobre o zoo

O Zoológico da UCS tem uma trajetória de 28 anos. Foi criado em 1997 para acolher animais silvestres recolhidos na região, que até então não tinham para onde ser encaminhados. Somente órgãos públicos credenciados, como Patram, Corpo de Bombeiros e secretarias estadual e municipais de Meio Ambiente, podem acessar o zoo. Estes órgãos atendem à ocorrência e acionam o Zoo UCS. É feita triagem e o acompanhamento clínico. A equipe estabelece se é possível o retorno ao ambiente, se permanecem no zoo ou se são encaminhados para outros locais apropriados.

Em 2022, a UCS inaugurou o Instituto Hospitalar Veterinário (IHVET), um dos maiores complexos de saúde animal do Rio Grande do Sul. O centro de referência agregou ao trabalho realizado no zoológico, potencializando diagnósticos e tratamentos e consolidou o Complexo de Saúde Animal da UCS, formado ainda pelo Museu de Ciências Naturais da UCS.

Seja um padrinho

O coordenador Ribas destaca que o centro de atendimento emergencial de animais silvestres e a estrutura maior para fazer a soltura são 100% custeados pela Universidade de Caxias do Sul. “Buscamos parcerias com o setor público e privado para manutenção deste serviço. A despesa mensal é de R$ 55 mil.”

Para tanto, há o Programa de Apadrinhamento. As empresas podem apadrinhar um dos 28 recintos que abrigam os animais e ter sua marca no local. A comunidade pode colaborar com qualquer valor por meio do QR Code e/ou chave PIX, disponíveis no portal da UCS www.ucs.br.

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