Com um notebook e internet, o escritório de trabalho pode ser montado em qualquer lugar do mundo. Impulsionado pelas tecnologias e motivado pelo desejo de liberdade e autonomia, o trabalho remoto ganha força na região e possibilita um estilo de vida que equilibra carreira, viagens e lazer: o nomadismo digital.
No estado, as cidades que mais adotam esse modelo de trabalho são Porto Alegre, Caxias do Sul, Pelotas e Gramado. Já no Vale do Taquari, mesmo sendo uma região mais tradicional, com custo de vida acessível e qualidade de vida, o trabalho remoto também é realidade, conforme afirma a psicóloga e consultora organizacional, Denise Cyrne.
Segundo a profissional, embora ainda existam desafios, como a disponibilidade de espaços de coworking e a qualidade da internet em algumas áreas mais afastadas, a região tem grande potencial para atrair profissionais remotos que buscam um estilo de vida mais tranquilo, acessível e em sintonia com a cultura local.
Denise observa que o trabalho remoto é possível nas empresas que adotam um modelo em que o resultado é medido por meio das entregas, com metas e prazos estabelecidos. Em geral, ligados a áreas como tecnologia, marketing, design, redação e e-commerce.
“É uma tendência entre as novas gerações que possuem um olhar diferenciado quanto à destinação do tempo às coisas da vida, e que buscam um equilíbrio maior entre trabalho e vida pessoal.”
Desafios
Alguns desafios enfrentados pelos nômades digitais incluem a infraestrutura limitada. De acordo com Denise, embora as cidades maiores estejam cada vez mais conectadas, em áreas mais rurais ou distantes da cidade, pode haver dificuldades em garantir uma conexão estável e veloz. Outro desafio pode ser o isolamento social.
Por outro lado, o nomadismo digital oferece benefícios para quem busca mais liberdade, flexibilidade e qualidade de vida e, na maior parte dos casos, as vantagens superam as dificuldades. “Entendo que este modelo de trabalho é uma opção, não uma obrigação, e que depende do segmento de atuação da empresa, pois existem algumas empresas em que o trabalho presencial é indispensável.”
Ela defende caber a cada empresa avaliar as suas necessidades e possibilidades. Mas não acredita que a não adoção deste modelo por alguma empresa, a coloque numa condição de desvantagem frente àquelas que adotam.
Transição de carreira
Trabalhar de forma remota também era um objetivo para a carreira e a vida do empresário de Cruzeiro do Sul, Rodrigo Kronbauer que, em 2022, se mudou para Portugal. Para ter a liberdade que queria, focou em estudar tecnologia, e passou por uma transição de carreira, já que, antes disso, tinha uma empresa, mas com operação física, em Porto Alegre.
“Eu mapeei o mercado e fui vendo possibilidades. Foi uma transição de carreira planejada, em que o objetivo principal era justamente buscar a liberdade do trabalho remoto”. Rodrigo, hoje sócio da empresa Criação.cc e morador de Florianópolis, destaca os desafios encontrados no modelo. Ele cita a falta de interação com a equipe, já que todos os profissionais que atuam na empresa também trabalham de forma remota, no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Minas Gerais, Ceará e Sergipe. Além da dificuldade de manter todos os colaboradores motivados. “A questão da saúde mental, sem dúvida, é uma das principais preocupações que a gente tem.”
Para suprir essa falta, os funcionários incentivam, entre a equipe, o cuidado com a saúde, a prática de exercícios físicos e, anualmente, promovem um encontro de fechamento da empresa, também com planejamento para o próximo ano. Segundo ele, a disciplina é outro ponto essencial para quem trabalha de forma remota e uma das alternativas é ter rotinas consistentes e reuniões diárias para alinhar os objetivos da empresa.
Liberdade para conhecer o mundo
A autonomia e liberdade ao invés da segurança de um emprego tradicional. Esse sempre foi o desejo de Eduardo Thomas, 38, e Victoria Thomas, 27, mesmo antes de se conhecerem. O encontro aconteceu quando Victoria estava terminando a faculdade de psicologia e Eduardo já era dono de uma empresa de software, em um escritório físico. “Logo percebemos que compartilhávamos valores e planos de vida, o que nos levou a traçar uma estratégia conjunta para alcançar a máxima liberdade possível”, descreve Victoria.
Assim que se formou, a psicóloga começou a atender os pacientes de forma online, enquanto Eduardo já havia estruturado a empresa para trabalhar em qualquer lugar do mundo.
Depois de anos de planejamento e organização, o casal decidiu sair do Brasil por um período. Segundo o casal, esse estilo de vida não nasceu de uma vontade de ser nômade, mas do desejo dos dois por liberdade. Viajar era um sonho antigo que, inicialmente, se limitava a conhecer algumas culturas e países. A decisão de seguir viajando surgiu como a vontade de explorar o mundo ainda mais.
Hoje, Victoria é escritora e terapeuta de casais, com livros publicados em 13 países e atendimentos em mais de dez. Eduardo continua à frente da empresa de software que fundou aos 18 anos, agora global, atendendo clientes em mais de 30 países.
Os dois trabalham todos os dias e os horários são adaptados ao fuso horário do local onde estão. “Trabalhamos à noite e de madrugada, reservando as tardes para explorar os locais e nos divertir”, afirma Victoria.
Desapegar dos bens materiais foi um dos aprendizados desse processo. “Tudo o que possuímos cabe em uma mala de bordo e uma mochila. Se compramos uma peça de roupa, outra precisa sair. Temos apenas um par de tênis e um par de chinelos cada”.
O trabalho presencial já não faz parte dos planos de Victoria e Eduardo. Os dois fazem visitas anuais de três meses ao Brasil para rever amigos e familiares. Mas voltar definitivamente não é mais um desejo atual. Hoje, exploram o Japão e já preparam a nova aventura.
Vida nômade
Mesmo antes do desejo de viajar o mundo, Bruna Mattos Dias, 28, e Jonas Sebastiany Alves, 34, já adotavam o trabalho remoto como estilo de vida. Ele, publicitário, e natural de Estrela, e ela, advogada, natural de Tramandaí, já organizavam uma rotina online em Porto Alegre, desde o início da trajetória profissional.
Para Jonas, o caminho foi natural, já que a área em que atua permite essa dinâmica. Já para Bruna, foi preciso certa adaptação, porque o Direito tende a exigir modelos de trabalho mais tradicionais. “Precisei me posicionar para o mercado. Hoje, trabalho de forma autônoma, tenho a minha carteira de clientes e presto serviços para um escritório em Porto Alegre, tudo isso de forma remota”, destaca a advogada.
Para o casal, não fazia sentido passar o dia em um escritório, se havia a possibilidade de trabalharem de casa. “Posso estar em qualquer lugar do mundo, desde que eu tenha meu notebook e internet, eu sei que consigo entregar um bom trabalho”, afirma Bruna.
Junto com esse modelo de negócio, que se encaixou na vida deles, ainda em Porto Alegre, havia o sonho de conhecer novas culturas e viver em outros países. A forma que encontraram de fazer isso acontecer foi colocando o trabalho na mochila e ir viajar.
Hoje, estão em Istambul, na Turquia, onde pretendem passar dois meses. Mas desde outubro de 2024, já passaram períodos em Portugal, em Porto e Lisboa, foram para Manchester, no Reino Unido, e seguiram para Paris, na França, e Berlim, na Alemanha. A ideia é sempre alugar um espaço para que possam trabalhar e seguir conhecendo cada país.