O contraponto para o discurso hegemônico

Opinião

Filipe Faleiro

Filipe Faleiro

Jornalista

O contraponto para o discurso hegemônico

Ter um meio termo entre ajuda e obrigação. Esse é um dos preceitos inclusive de políticas afirmativas como o Bolsa Família. Desde o fim de 2024 e começo deste ano, os programas sociais do governo federal são alvo de críticas que mais confundem do que esclarecem.

A história se repete: narrativas que colocam o Bolsa Família como o vilão das contas públicas ganham força, enquanto o verdadeiro peso fiscal do Brasil continua escondido atrás de cifras imensas destinadas a setores econômicos, e que por vezes, não apresentam contrapartida do quando retornam à população em termos de geração de emprego.

Vamos aos números. O Bolsa Família custa R$ 167,2 bilhões ao ano. Parece muito? Talvez, até você olhar para os R$ 546 bilhões em incentivos fiscais concedidos a grandes empresas, muitas delas multinacionais que já têm lucros expressivos. Enquanto a Braskem recebe R$ 2,27 bilhões em incentivos, a Syngenta, R$ 1,77 bilhão, e a Azul Linhas Aéreas, R$ 1,04 bilhão, o programa social que ajuda milhões de famílias brasileiras a sobreviver é criticado por, supostamente, “desequilibrar” o orçamento.

E isso é só a ponta do iceberg. As aposentadorias de juízes e oficiais das Forças Armadas somam R$ 15,5 bilhões anuais — quase o triplo do custo do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) e do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) juntos.

Foto: divulgação

O papel das mulheres e a crise do cuidado

No Brasil, 83,4% dos benefícios do Bolsa Família estão no nome de mulheres. Isso não é por acaso. Elas estão na linha de frente do cuidado: criam filhos, muitas vezes sozinhas, cuidam de familiares doentes. No mercado de trabalho, quantas conseguem perenidade se os horários de levar ou buscar as crianças na escola interfere no expediente? Criticar esses programas sem entender esse contexto é, no mínimo, irresponsabilidade.

Sim, há críticas válidas, como a falta de pessoas no mercado formal de trabalho. Mas será que o problema está no Bolsa Família ou na ausência de políticas públicas que incentivem a transição dessas pessoas para empregos formais?

O dinheiro do benefício social vai para o consumo, movimenta o comércio, ajuda na economia local. O problema não é o Bolsa Família; é a falta de estratégias para qualificar essa mão de obra e abrir portas reais no mercado.

O governo federal paga. A responsabilidade por fazer a transição é dos municípios. Importante que se diga. São os Centros de Referência em Assistência Social que organizam os cursos de qualificação.

Com todo o respeito, mas oferecer cursos de crochê e de biscuit como “capacitação” é, no mínimo, desconexo da realidade. É urgente criar parcerias entre o setor público e privado para oferecer treinamentos alinhados às demandas regionais. Se o mercado precisa de operários, técnicos ou especialistas em tecnologia, que tal formar para essas pessoas sejam direcionadas neste sentido.

“Não querem trabalhar pois estão no informal”

Há uma hipocrisia gritante em criminalizar as famílias em situação de vulnerabilidade enquanto aceitamos de maneira passiva os privilégios do alto clero do funcionalismo público e as isenções fiscais a grandes corporações. O mercado informal, tão criticado, é muitas vezes a única alternativa para quem não tem qualificação suficiente e precisa sobreviver.

A narrativa de que o Bolsa Família “desestimula o trabalho” ignora uma questão básica: as pessoas buscam a informalidade porque ganham mais do que o salário mínimo. E isso não é culpa delas, mas de um mercado que remunera mal e de um sistema que não oferece incentivos reais para a formalização das pessoas com menos escolaridade.

Um terço

O custo da máquina pública reflete a antiga visão de um terço, expressão que remonta ao período colonial, quando as colônias eram obrigadas a enviar 33,3% do que produziam à coroa.

Hoje, a estimativa é que são cinco meses para pagar todos os impostos. É demais. Sim, você trabalhador, você empresário, nós, cidadãos. Pagamos por isso tudo isso. Agora, o que prefere: ajudar quem precisa ou enriquecer quem já está com a vida feita? Eu tenho a minha resposta.

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