Os temporais sobre a capital paulista e a demora para restabelecer a energia remontam lembranças sobre o Vale do Taquari. Em São Paulo, maior cidade da América Latina, tudo é superlativo. Foram mais de 1,5 milhão de domicílios sem luz.
Em alguns pontos, oito dias de demora para a volta da energia. Os apagões, cada vez mais comuns, inclusive viraram o ponto central do debate no segundo turno das eleições. O atual prefeito, candidato à reeleição, Ricardo Nunes, transfere a responsabilidade para a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Já o rival à prefeitura de SP, Guilherme Boulos, critica a passividade da gestão municipal.
O que fica escancarado à população nacional é a fragilidade dos programas de concessões para serviços básicos. O que São Paulo vive neste momento, o RS e, em específico o Vale do Taquari, também enfrentam faz anos.
A concessionária Enel descumpre o contrato sobre restabelecimento da luz, desrespeita decisões judiciais (como no caso das contratações, pois reduziu em 50% o número das equipes de manutenção), e não investe em melhorias na rede.
Assim como aqui nos pagos, a agência reguladora “passa o pano”. As organizações criadas para defender o interesse dos consumidores adota uma posição oposta. Justifica que não poderia abrir um processo para caducidade do contrato pois traria insegurança para os programas de concessão.
Enquanto isso, a empresa privada fica com os lucros e a população aguarda mais de uma semana para ter energia, afinal de contas, as pessoas não têm opção. Não tem como ir no mercado e trocar de empresa. A sociedade fica presa a um serviço precário.
Tenho uma visão pragmática sobre concessões e privatizações. Caso sejam bem elaborados, haja uma fiscalização presente e com dispositivos de encerramento caso os parâmetros não sejam atendidos, os contratos podem garantir melhorias à população.
O que me assusta é a narrativa de privatizar a qualquer custo. Veja no caso da energia. O poder público fez grandes investimentos para universalizar a distribuição. De uma hora para outra, abre mão. Importante que se diga: assim como a Enel em São Paulo, a RGE tem participação governamental, da State Grid Corporation of China.
… E a concessão das rodovias?
Conversei por mais de meia hora com o secretário Pedro Capeluppi na tarde de ontem. Um resumo está na notícia da página 3 (aviso para o caso de você ser aquele leitor que começa o jornal de trás para frente).
Na semana passada, escrevi sobre a minha descrença de que a concessão das rodovias saia do papel nos próximos dois anos. Uma ideia rechaçada pelo secretário. Inclusive brincou: “não aposte sua água mineral na continuidade da EGR.”
Pelo plano do Estado, se tudo der certo, o contrato será assinado no primeiro trimestre de 2026. Ali estaria decretada a saída da autarquia das rodovias estaduais.
Há um debate muito longo pela frente. Aqui antecipo algumas preocupações:
O estudo das obras e de viabilidade precisa ter sido refeito de verdade. Não pode acontecer como em 2022, quando foi feito um “requentado de ontem” das obras previstas na criação da EGR.
Infraestrutura resiliente. É preciso um olhar muito atento aos trechos com quedas de barreira e de inundação. O traçado da ERS-130, por exemplo, duplicar no mesmo formato é colocar dinheiro fora.
Tarifa versus obras. A previsão anterior era de R$ 0,23 a R$ 0,26 por km rodado. Com obras mais complexas, se aumentar mais de dez centavos, fica inviável à população. É preciso haver um rateio. Obras estruturantes não poderão ser apenas feitas com o bolso da população.