“Sem a polinização de abelhas, a humanidade tende à extinção.” A afirmação de David Vicenço, presidente da Federação Apícola do Rio Grande do Sul (Fargs), pode parecer alarmante, mas reflete a realidade da crise ambiental que o mundo enfrenta. A exemplo, as enchentes de maio devastaram 10% dos enxames da região, causando um impacto que vai muito além da produção de mel: ameaça a agricultura, compromete a segurança alimentar e coloca em risco a sobrevivência da humanidade. No entanto, no interior de Taquari, uma iniciativa surge como esperança para encontrar soluções que possam restaurar o equilíbrio ecológico.
É no Parque Apícola de Taquari, antigo Centro de Pesquisas Emílio Schenk, que especialistas e pesquisadores estão empenhados em reativar a atividade das abelhas na região. Por meio da produção e distribuição de rainhas, princesas e cúpulas, eles visam apoiar os apicultores que perderam suas colmeias e melhorar a polinização, atividade crucial para a recuperação das lavouras e a manutenção da biodiversidade.
Segundo Vicenço, o objetivo da Fargs é desenvolver a apicultura e a meliponicultura do estado. Mas o principal interesse está em promover a polinização, de abelhas com e sem ferrão, para produção de alimentos. “Vamos trabalhar para atender os quatro cantos do Rio Grande do Sul, com o desenvolvimento de tecnologias e apicultura padronizada”, explica o presidente. “A polinização é responsável por, no mínimo, 3% do aumento de grãos e frutas. Então, temos que capacitar as pessoas e criar ambientes para trabalhar com as abelhas”.
Além disso, a iniciativa também auxiliará na produção de mel e seus subprodutos, como cera, própolis e geleia real. Hoje, o Brasil possui o título de excelência em qualidade e produtividade de mel, uma vez que é detentor, por seis vezes consecutivas, do prêmio de melhor mel do mundo.
Essenciais à vida
O zootecnista da Emater/RS-Ascar, João Sampaio, ressalta que compreender o impacto da polinização é reconhecer que cerca de 80% dos alimentos consumidos pela humanidade dependem diretamente da atuação dos insetos. “As abelhas são, entre esses insetos, os maiores polinizadores. A quantidade de flores que elas visitam supera em muito a de qualquer outro polinizador”, afirma.
Além deste papel vital, as abelhas produzem subprodutos com propriedades medicinais, como o mel, que são amplamente utilizados na fabricação de medicamentos. “Existe toda uma importância nessa espécie, que não podemos ignorar. Elas sustentam uma cadeia de benefícios essenciais para a nossa saúde e alimentação”, conclui Sampaio.
Projeto de reconstrução
Para a reconstrução das colmeias e enxames, a Federação e entidades envolvidas no projeto auxiliam os apicultores com a distribuição de rainhas e cúpulas. Para tanto, o parque é utilizado como um centro vital para a multiplicação e distribuição desta cadeia.
A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e a Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul) contribuíram com a distribuição de açúcar e proteína, vindos de outros estados do país, para alimentar as abelhas. O material foi distribuído entre apicultores da região. Além disso, um grupo do Paraná doou mil colmeias para ajudar na reposição das perdas, complementando os esforços de recuperação na região.
O Parque Apícola
O Parque Apícola de Taquari está localizado na Linha Arroio Fonte Grande e possui 465 hectares. O espaço abriga construções centenárias que testemunham o trabalho do professor Emílio Schenk, imigrante alemão que chegou ao Brasil em 1895 e implementou novas técnicas apícolas no país. Ele foi responsável pela instalação do primeiro apiário didático, que impulsionou a atividade com as abelhas no sul do Brasil.
A Estação Experimental do Parque Apícola foi fundada em 1929 e atualmente é considerada a maior referência de pesquisa em Apicultura da América Latina. No local há 11 casas centenárias, que foram construídas à época da fundação para abrigar a administração, casa do mel, laboratório de pesquisa genética de rainhas e almoxarifado. Hoje estão ativos somente os laboratórios de apicultura e o de citrus.
Desde dezembro de 2023, um acordo de cooperação assinado entre o Governo do Estado, o Parque Apícola e a Fargs, une esforços para impulsionar o desenvolvimento de tecnologias voltadas à apicultura e meliponicultura. A parceria inclui o uso compartilhado de parte da área para atividades agrícolas e criação de abelhas, além de promover pesquisas voltadas às necessidades dos apicultores de todo o Estado. Entre os temas abordados, destacam-se o combate à mortandade de abelhas causada por contaminantes e estudos sobre a polinização em lavouras de campo aberto.
Entenda mais:
- Apiário: conjunto de colmeias utilizadas para criação de abelhas, para a colheita de mel ou a polinização de culturas agrícolas
- Abelha rainha: responsável por comandar a colônia e por os ovos. A líder também controla a produção de novas abelhas de cada sexo ou casta, de acordo com a necessidade da colônia.
- Cúpulas: dispositivos utilizados por apicultores para facilitar o processo de criação de novas rainhas em colmeias de abelhas, por meio de ambiente controlado e protegido.
- Princesa: é toda rainha virgem, ou seja, que ainda não foi fecundada.