De duras lembranças à evolução em 200 anos

IMIGRAÇÃO ALEMÃ

De duras lembranças à evolução em 200 anos

RS celebra nesta quinta-feira, o bicentenário da imigração alemã no RS. Data marca os desafios da colonização e destaca as heranças de um povo que ajudou a construir o estado e a região

De duras lembranças à evolução em 200 anos
O historiador Waldemar Richter preserva a história da imigração e se dedica a estudar o tema ao longo dos anos. (FOTOS: BIBIANA FALEIRO)
Vale do Taquari

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Em uma viagem que levou 120 dias pelo oceano Atlântico, as primeiras famílias vindas da Alemanha chegaram ao Brasil. Motivados por melhores condições de vida e incentivados pelo Império Brasileiro, chegaram em províncias de diferentes regiões do país. Mas foi a colônia gaúcha a que mais prosperou. Hoje, o estado e a região comemoram 200 anos dessa história que ainda preserva heranças, seja na educação, na cultura, na culinária ou na arquitetura.

No Rio Grande do Sul, a imigração é marcada pelo dia 25 de julho, quando os colonos desembarcaram em São Leopoldo, em 1824. Foi lá que abriram as primeiras picadas e construíram as primeiras civilizações. Com famílias numerosas, a região do Vale dos Sinos e do Vale do Caí ficou pequena para a população que crescia e os filhos de imigrantes passaram a procurar novas terras para também constituírem famílias.

Em maioria, foi a segunda ou terceira geração de imigrantes que povoou o Vale do Taquari, a partir do fim da década de 1850. Na região, abriram estradas, construíram escolas e desenvolveram um dialeto próprio que, ainda hoje, é conhecido e utilizado por moradores de localidades rurais.

Dança e música são heranças da colonização alemã

Arquitetura enxaimel

No interior do bairro Conventos, em Lajeado, uma casa centenária conta essa história. Na família Rosenbach e Hammes por mais de 100 anos, a estrutura em enxaimel não deixa dúvidas de que naquela região viveram famílias de imigrantes.

A estrutura ainda pertence aos filhos de Francisca e Aloísio Hammes, e mantém as características originais. Duas das filhas, Noélia e Leoni Hammes, moram na casa e lembram das histórias contadas pela mãe.
Construído por August Beuren, o prédio, no início, era coberto por tábuas que, mais tarde, foram

substituídas por zinco. Antônio Rosenbach e Maria Engster, pais de Francisca, adquiriram a propriedade em 1921 e lá criaram os filhos e netos. Noélia conta que a casa possuía um típico porão onde o avô guardava vinhos feitos pela família.

“Não temos precisão da data em que foi construída, mas quando meus avós vieram, a casa já tinha entre 30 e 50 anos”, conta Noélia.

Ela e os irmãos estudavam em uma pequena escola a cerca de 1,5 km da casa. “Comecei a estudar com 6 anos, onde hoje é a Escola São José. A dificuldade era que em casa nós só falávamos alemão e eu tinha uma professora que só falava português”, comenta.

Outra recordação está na culinária. Foi com a mãe que Noélia aprendeu a cozinhar. Entre os pratos que a família mais gostava, estava a galinhada, além de um doce feito à base de ovos e leite.

Força na educação

Por mais de 70 anos, a navegação era o principal meio de transporte da região

O historiador Wolfgang Collischonn destaca a educação como um legado da colonização alemã na região. Ele conta que quando os primeiros alemães chegaram à região, não havia escolas. Como alternativa, imigrantes alfabetizados ainda na Alemanha se propuseram a ensinar os mais jovens. Mais tarde, as escolas portuguesas foram construídas e o ensino em alemão passou a ser proibido pelo Império.

Os imigrantes também construíram hospitais e deixam como herança, a navegação. “Por 75 anos, esse era o transporte que se tinha”, destaca Collischonn.

Na culinária, a introdução da batata inglesa na mesa brasileira também é resquício da colonização. Por outro lado, aqueles que chegaram ao Brasil vinham de regiões pobres da Alemanha e não tinham pratos sofisticados. Muitos dos alimentos encontrados aqui, inclusive, não eram conhecidos. “Faziam milagres com as coisas que encontraram aqui, como o aipim e o feijão, isso não conheciam”.

Diversidade

Coordenador do Memorial de Estrela, Airton Engster

Assim como Lajeado, Estrela está entre as cidades do Vale com fortes características da colonização alemã. No município, a cultura é preservada pelas danças, pela gastronomia e pelos cantos.

Historiador e coordenador do Memorial de Estrela, Airton Engster afirma que no censo agropecuário de 1920, havia, nas colônias de Estrela e Teutônia, 2,8 mil famílias residindo nas propriedades rurais. Todas de origem alemã.

No contexto da vinda dos primeiros imigrantes, eram encontrados no estado, indígenas, portuguese e negros que vieram ao Brasil escravizados. Depois na colonização alemã, ainda vieram os italianos que também povoaram os territórios. Hoje, toda essa herança cultural se mistura.

Engster diz que das comunidades alemãs, fica o exemplo de determinação, superação e resiliência, de um povo que veio ao Brasil com promessas que nem sempre foram cumpridas. No país, enfrentaram dificuldades, em uma realidade em que a mata nativa tomava conta e as colônias tinham que ser construídas do zero. Por outro lado, as marcas deixasas também são de conquistas e desenvolvimento.

Preservação

Professor e historiador, Waldemar Richter também é um dos estudiosos sobre a colonização alemã no Vale do Taquari. Morador de Forquetinha, ele guarda memórias da própria família, sendo autor de diversos livros sobre o tema.

Richter também foi um dos fundadores do Parque Histórico de Lajeado, que guarda dezenas de casas no estilo enxaimel, características das comunidades alemãs, que contam a história dos imigrantes na região. Na residência dele, uma miniatura do parque foi construída e ele é um dos responsáveis por compartilhar parte dessa cultura com as novas gerações.

Programação especial

Para celebrar a data, a Rádio A Hora tem programação especial nesta quinta-feira, 24. A partir das 8h10min, o programa Frente e Verso entrevista José Paulo Rischter, CEO na Richter Gruppe, Waldemar Richter, professor e historiador e o também professor e pesquisador Lucildo Ahrlet, tendo como cenário o Urban Center, em Conventos.

O tema é o Bicentenário da Imigração Alemã. O historiador Jéferson Luís Schaeffer e o diretor do Colégio Sinodal de Conventos, Rui Griesang também serão entrevistados.

Além disso, o programa O Vale em Pauta será transmitido da Praça Menna Barreto, em Estrela, onde fica um monumento em homenagem à imigração alemã. Entre os entrevistados, estão o pesquisador Airton Engster, o instrutor dos Grupo Folclóricos de Estrela, Andréas Hamester, os dançarinos Anelise e Enio Schwingel, e o professor de história, Joel Mallmann.

Da Alemanha ao Vale

  • INÍCIO DO SÉCULO XIX
    Superpopulação nos reinos germânicos e empobrecimento motiva emigração da Europa
  • 1822
    Brasil proclama independência e incentiva vinda de imigrantes ao país
  • 1824
    Chega o primeiro navio de alemães em São Leopoldo no dia 25 de julho
  • 1830
    Falta de recursos para trazer os imigrantes, junto à eclosão da Guerra dos Farrapos, freia a imigração ao RS até 1845
  • 1850
    A Lei de Terras é instituída no Brasil e o Império permite que empresas privadas loteiem terrenos e vendam aos imigrantes, antes o lote era concedido pelo governo aos colonos
  • 1860
    Nessa década, a escassez de terras nas colônias mais antigas, no Vale do Sinos, motiva a busca por novos territórios, atraindo imigrantes para o Vale do Taquari
  • 1871
    A Alemanha se torna um país unificado e o governo passa a incentivar a imigração italiana em detrimento da alemã

Contextos da imigração alemã

NA ALEMANHA

No início do século XIX, a Alemanha não existia como um país unificado e era composta por diversos reinos. Com o início da industrialização, a antiga estrutura feudal germânica se dissolveu, motivando a ida de camponeses para as cidades. Essas se tornaram superpopulosas e as fábricas não conseguiram absorver toda a mão de obra, tornando a emigração para novas terras uma alternativa aos mais pobres.

 

NO BRASIL

O Império Brasileiro recém tinha sido instituído, em 1822, e havia o desejo pelo branqueamento da população, então formada em maioria por portugueses, negros escravizados e indígenas. Também havia interesse em povoar as partes mais meridionais do território e garantir a soberania sobre o sul. Além disso, como a imperatriz Dona Leopoldina era de origem germânica, incentivou a vinda de imigrantes alemães para o país.

 

 

NO RS

O dia 25 de julho de 1824 marca a data do primeiro navio de alemães que chegou a São Leopoldo. Antes disso, outras colônias tinham sido estabelecidas na Bahia e no Rio de Janeiro, mas foi a do Rio Grande do Sul que prosperou. Para atrair os imigrantes, o governo brasileiro prometeu terras e insumos para iniciarem uma nova vida na América. Depois de meses em navios transatlânticos em condições precárias, chegaram ao Brasil e encontraram uma realidade muito diferente da prometida. A ajuda do governo foi quase nula e os imigrantes tiveram de abrir as colônias em matas fechadas.

NO VALE DO TAQUARI

A colonização do Vale do Taquari se deu a partir da décadas de 1850. Isso porque de 1824 até então, as novas gerações de teuto-brasileiros já tinham nascido nas colônias de São Leopoldo e novos imigrantes também chegavam ao Estado. As terras no Vale do Rio dos Sinos começaram a ficar escassas e motivaram o desbravamento de novas colônias, seguindo os cursos hídricos. Assim, as terras do Vale do Taquari, na época sob posse de senhores de origem portuguesa, foram sendo loteadas e vendidas aos colonos. Em Lajeado, os primeiros imigrantes se instalaram no atual bairro Conventos. Em Estrela, a comunidade de Novo Paraíso é uma das mais antigas.

 

 

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