Empresas da região com prejuízos comprovados na inundação de maio estão excluídas das linhas de crédito de R$ 15 bilhões pelo fundo social do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Há dois motivos centrais: falha no sistema de georreferenciamento e o critério de liberação dos financiamentos para aplicar na cidade sede do CNPJ. São pelo menos meia dúzia de negócios nos municípios de Estrela, Lajeado, Venâncio Aires e Encantado que estão neste limbo.
“A água passou dos 7 metros dentro do pavilhão e o governo diz que estamos fora da mancha de inundação”, critica o proprietário da DS Sul, de Estrela, Daniel Sulzbach. A fábrica de rações no bairro das Indústrias foi devastada.
“Estamos desde o início de maio sem trabalhar. Temos o projeto para recomeçarmos em outro local, mas dependemos do acesso a esse financiamento”, diz o empresário. Na sexta-feira passada, foram informados pela gerência do banco no qual buscaram o crédito. Com a negativa, ingressaram com a reclamação na ouvidoria. “Disseram que vão nos dar a resposta em 30 dias. Até lá, não vai ter mais dinheiro”, lamenta Sulzbach.
Outra empresa nesta situação é a Haas Madeiras. Conforme o proprietário, José Carlos Haas Junior, a filial em Mariante, interior de Venâncio Aires, ficou submersa. “Buscamos capital de giro e tivemos o recurso negado por estar fora do enquadramento. Nos disseram que estamos fora da área de inundação.
Mostramos fotos, vídeos, e disseram que foi a restrição do BNDES por causa desse mapa de inundação.”
O empresário complementa: “nem sabemos a quem recorrer. Estamos de mãos amarradas”. Enquanto isso, diz Haas, o prejuízo é corrente. “Tivemos cerca de dois milhões em infraestrutura e maquinários. Junto disso, o lucro cessante, pois estamos com a operação parada há dois meses.”
Até o início da tarde da sexta-feira passada, dos R$ 15 bilhões com juros de 0,6% até 0,8% ao mês, já haviam sido autorizados os depósitos de R$ 8 bilhões. O Ministério da Reconstrução encaminhou um ofício ao Tesouro Nacional reivindicando mais aporte financeiro às empresas gaúchas.
Reunião com os governos
O presidente da Câmara da Indústria e Comércio da região (CIC-VT), Angelo Fontana, destaca a dificuldade que as empresas estão passando para acessar as três linhas de financiamentos com juros reduzidos. “Falta informação. Os empresários não sabem para quem recorrer e como mudar essas análises erradas.”
Em reunião na tarde de ontem com dirigentes de bancos, representantes do governo federal e estadual, foi detalhado uma atuação por etapas. As instituições financeiras operam por etapa. Primeiro com a linha voltada para capital de giro.
O montante previsto acabou em menos de 48 horas. As outras duas, para reconstrução e compra de maquinários estão reservadas para os próximos dias. O secretário executivo do Ministério da Reconstrução, Maneco Hassen, reconhece que o sistema apresentou distorções. Em cima disso, foram direcionadas cobranças para a empresa contratada pelo governo para corrigir o mapa das empresas atingidas pela água.
Aplicar na cidade
A restrição imposta pelo governo federal, das liberações apenas para projetos dentro do município sede, fazem com que negócios da região sejam impedidos de acessar os créditos.
Na análise de líderes regionais, é preciso diferenciar o Vale dos municípios maiores, como Canoas ou Porto Alegre. “É preciso uma regra para investir no Estado”, cobra Fontana. Para o presidente da CIC-VT, faltam áreas e isso obriga uma movimentação interna. “Não há como reconstruir no mesmo lugar. Então as empresas tiveram de sair para não quebrar.”
Oferta por linhas comerciais
Além das dificuldades em acessar devido a erro no cadastro e no critério, os bancos também apresentam créditos com as linhas comerciais por temerem prejuízos devido aos juros baixos.
Essa foi a resposta de uma instituição para o proprietário da Lopes Papeis. O proprietário, Maurício Lopes, tenta acessar verbas para reconstrução e compra de maquinários desde a apresentação do modelo via fundo social.
Com a liberação na quarta-feira passada, ampliou os esforços para acessar esse recurso. A resposta chegou na tarde de ontem. “Nos apresentaram simulações que não são das linhas anunciadas. De acordo com a gerência, o banco não quer se expor ao risco do juros baixo.”
Os pavilhões da empresa ficavam na rua Bento Rosa, em Lajeado. Mais de 4 mil metros quadrados foram destruídos pela força da água. Foi preciso alugar um pavilhão bem menor para retomada de 40% da capacidade produtiva.
“Estamos negociando a compra de uma área no bairro São Bento. Para construir, precisamos desse empréstimo com melhores condições.”
Entre os pedidos de líderes empresariais está a criação de um modelo com Fundo Garantidor de Operações (FGO), pois as restrições dos bancos é para empresas que estão sem poder de endividamento ou sem imóveis ou propriedades para penhora em caso de não pagamento.
Saiba mais
Problema com Linha de Crédito do BNDES
- Georreferenciamento falho: o sistema do governo federal excluiu endereços afetados pela inundação de maio.
- Critério de localização: financiamentos só são liberados para investimentos na cidade sede do CNPJ.
- Recurso no fim: dos R$ 15 bilhões disponíveis pelo menos R$ 8 bilhões já foram autorizados.
- Mais verbas: o Ministério da Reconstrução solicita ao Tesouro Nacional mais recursos para oferecer às empresas gaúchas.
- Oferta por linhas comerciais: empresários dizem que bancos apresentam restrições mesmo para empresas com prejuízos comprovados.