Produtores limpam as terras e buscam alternativas ao recomeço

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Produtores limpam as terras e buscam alternativas ao recomeço

Com propriedades atingidas pelas cheias de setembro de 2023 e maio de 2024, o agronegócio exige adaptações e clama por auxílio para a recuperação

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Produtores limpam as terras e buscam alternativas ao recomeço
Com perdas estruturais e de animais, Jorge Dienstmann, produtor de Estrela, passa a investir na plantação de grãos. (Foto: Bibiana Faleiro)
Vale do Taquari

Dificuldade de acesso às lavouras, solos degradados e falta de alimentação aos animais são alguns dos desafios que o agronegócio enfrenta após as cheias. Entidades buscam alternativas para recuperar o setor representa cerca de 80% da economia da região. Para tanto, agricultores mantêm dedicação diária na restauração das propriedades para voltarem a produzir.

Em Linha Chá da Índia, em Estrela, a propriedade de Jorge Dienstmann, 52, foi uma das mais afetadas pelas cheias. Dos 16,3 hectares onde ele plantava, criava vacas para a produção de leite e milhares de frangos, sobraram cerca de 25 animais, parte dos galpões e nenhuma plantação. Apesar das perdas, desistir não está nos planos do estrelense que, agora, investe em uma nova forma de negócio para recuperar a produção.

Sem silagem ou ração para alimentar os animais, a ideia de Dienstmann é vender as vacas e limpar a propriedade. Muito entulho, assim como madeiras dos galpões destruídos ainda estão no terreno e precisam de um destino. O próximo passo é cuidar do solo e tentar torná-lo fértil para a plantação de soja e outros grãos.

O processo de recuperação é lento e o produtor acredita que antes do fim do ano não terá condições de iniciar o plantio. Enquanto isso, agradece o auxílio de voluntários e empresas que enviam insumos aos agricultores, mas também aguarda auxílio dos governos para limpar as terras e viabilizar o trabalho no campo.

Dienstmann foi atingido já nas enchentes de setembro e novembro de 2023, quando perdeu grande parte dos animais. Desta vez, os maiores prejuízos foram estruturais. Ele estima mais de R$ 4 milhões em perdas. “Nós tínhamos aqui 105 cabeças de gado e vaca leiteira e de 55 a 60 mil frangos por lote. A gente produzia 1,2 mil litros de leite por dia. Depois de setembro, passamos para 450 litros”. O produtor ainda tenta recuperar equipamentos, como motores, para vender e diminuir parte dos prejuízos.

Para recomeçar

Com propriedade em Arroio do Ouro, em Estrela, Airton Dieter se dedica a recuperar suas terras para voltar ao cultivo e garantir renda à família

Realidade semelhante é vivida por outro produtor de Estrela, em Arroio do Ouro. Apesar de ainda enfrentar as dificuldades da destruição dos terrenos onde costumava plantar, criar gado, porcos e búfalos, além da perda dos animais, Airton Dieter, 55, recebe ajuda dos amigos Atair José Martins e Paulo José Chaye, também atingidos pelas cheias, para recuperar o terreno.

No momento, se dedicam a refazer parte das cercas para colocar alguns animais na propriedade, que vão servir só para consumo próprio. A ideia é voltar a plantar soja, mas Dieter entende que o caminho é longo e de muito trabalho.

“Esse ano não sei se vou conseguir plantar, tem a terra para arrumar, e vamos precisar de ajuda”, reforça. O sentimento de perda também está ligado à família de Dieter que vive nos terrenos desde 1978. O trabalho para reconstruir o local é diário.

Auxílio aos produtores

Os prejuízos provocados pelas enchentes ao agronegócio gaúcho ainda não foram concluídos. Dados da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul) apontam que cada produtor rural do estado perdeu, em média, R$ 1,4 milhão durante o mês de maio, o que totaliza mais de R$ 3 bilhões em perdas iniciais.

Entre as entidades que trabalham para este recomeço, está a Emater, que faz a análise dos solos degradados, a fim de verificar a fertilidade e os impactos nas propriedades.

O trabalho é feito por meio de um projeto do Estado em parceria com as prefeituras. Os recursos foram disponibilizados já depois das cheias de 2023, para aquisição de adubos e outros insumos para a recuperação das terras.

Na região, cidades como Cruzeiro do Sul, Muçum, Arroio do Meio, Bom Retiro do Sul, Estrela, Taquari, Lajeado, Roca Sales, Encantado, Vespasiano Corrêa e Colinas participam do projeto.

Entrevista
Alano Thiago Tonin • Engenheiro Agrônomo da Emater, Escritório Regional de Lajeado

“Acreditamos que esses produtores vão conseguir replantar, adequar esse solo”

Quais os principais prejuízos das cheias em termos de solos?

Pensando na bovinocultura de leite aqui na região, que é mais significativa para nós, isso implica em atraso da semeadura e até a não semeadura de algumas pastagens que estavam previstas para este período de inverno, pela dificuldade, principalmente, de entrar nas lavouras. A maioria dos produtores acreditamos que vai conseguir replantar, adequar esse solo agora durante o inverno e a partir do dia 1º de agosto, que é quando inicia o zoneamento para milho na maioria dos municípios, ter condições de fazer a semeadura. O problema é que muitos agricultores perderam a alimentação, principalmente a silagem e áreas de pastagens nessa última enchente. Nós temos praticamente meio ano que vai perdurar essa dificuldade.

Como é possível iniciar uma recuperação?

Tem áreas que foram extremamente degradadas, que se perdeu praticamente toda a camada fértil do solo, vai ter que ser feito um trabalho de recuperação muito mais profundo e intenso nessas propriedades e vai levar 5, 6 anos. Os produtores não vão deixar de cultivar essas áreas, mas vão ter que usar mais fertilizantes para suprimir aquilo que foi perdido.

Em quanto tempo projetam essa recuperação?

É relativo, a gente já tem visto produtores que estão retomando, prepararam solo, alguns já conseguiram plantar alguma coisa agora de espécies de inverno, outros estão preparando para assim que possível plantar o milho. Para outros, vai demorar um pouco mais pelo estrago, alguns ainda estão definindo o sistema produtivo como um todo. O ideal é que a gente pudesse transformar tudo em área de preservação permanente de novo, e que os agricultores pudessem ser remunerados por serviços ambientais.

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