“Não posso me entregar”, diz morador de Lajeado que perdeu esposa na cheia

SUPERAÇÃO

“Não posso me entregar”, diz morador de Lajeado que perdeu esposa na cheia

Milton Alves da Silva viralizou no Instragram ao contar sua história em publicação do Grupo A Hora. Ele teve casa inundada pela terceira vez em oito meses

“Não posso me entregar”, diz morador de Lajeado que perdeu esposa na cheia
Milton Alves da Silva, sobrevivente da enchente. (Foto: Pedro Rodrigues).
Lajeado

Morador há 30 anos do bairro Carneiros, em Lajeado, Milton Alves da Silva, seu Presença, como é conhecido, é natural de Encantado. Ele perdeu a esposa Maria da Conceição, na enchente de setembro de 2023.

Ao longo dos 30 anos, enfrentou várias enchentes, mas nunca havia saído de casa. Água chegava até o porão, de onde não avançava. As últimas quatro enchentes, passaram deste limite. Para ele, a enchente de setembro considera ter sido a pior.

Milton relembra que no dia 4 de setembro de 2023, estava em casa com a esposa. Já haviam programado viajar para Bragança, no Pará, cidade natal da esposa. Na segunda, dia em que começaram as fortes chuvas, ela saiu para fazer compras e na volta, chegando em casa, ele deu a ideia de pegarem o carro e ir para um hotel em Lajeado, pois a previsão era de enchente, mas ela preferiu ficar.

O resgate e a dor da perda

Um dia que ficará na memória de seu Milton. Ele descreve o que passou naquela noite. Quando a água começou a subir, por volta da meia-noite, a situação de agravava. “Desde às 20h ela mandava mensagens pedindo socorro até a energia ser desligada, ficamos no escuro. Às 6h da manhã, fiz um chimarrão e olhei a água entrando na porta da parte de cima da casa. A água foi subindo lentamente foi aí que coloquei minha esposa sentada em cima da mesa e eu caminhando dentro da água, os vasos virando e comecei a me apavorar, mas não demonstrava, pois naquele momento, precisava ser forte. Coloquei ela no telhado e subi na mesa, a água alcançou minha cintura, mas ela já apavorada e, devido ao nervosismo, começou a passar mal”.

As lanchas passavam e um helicóptero chegou para o resgate. Maria da Conceição iria de helicóptero enquanto Milton aguardaria uma lancha. Sem saber que o pior ainda estava por vir, Milton ajudou a colocar a esposa para subir e recorda que falou para ela: “Meu amor, abrace esse rapaz do mesmo jeito que me abraçou no nosso casamento. Ela abraçou, ajudei a amarrar ela, pegou a bíblia, colocou debaixo do braço e a levantaram. Cinco metros adiante, ela começou a rodar, baixaram até perto da água e continuou girando e ali estourou o cabo de aço. Os dois caíram na água e, infelizmente, minha esposa estava sem colete salva-vidas e o sargento estava de colete. Ele sobreviveu. Vi ela nadando até ficar submersa e se afundou. O helicóptero baixou, puxou o sargento e depois ela, colocaram no cesto e a levaram para Colinas numa roça, tentaram reanimá-la e trouxeram de volta. Levaram no Lajeadense e me chamaram para dizer que ela estava morta”.

Ali, percebeu a necessidade de recomeçar, reconstruir, que não poderia ficar de braços cruzados. “Percebi naquele momento da notícia da morte da minha esposa, um olhar de indiferença de pessoas, autoridades, policiais e isso me tocou, foi como uma faca sendo fincada no peito. Agradeci a Deus e pedi que cuidasse bem dela e que todos os seus pecados eu pudesse pagar aqui na terra, pois a amava muito”.

O recomeço

Após enchente de setembro, voltou para casa, limpou, arrumou e por lá ficou. “Pensei comigo, qual será o meu propósito? Em novembro, acabou tudo, tive que fugir de carro. Saí antes e esperei baixar a água, voltei com a pá, com o lava-jato e reconstruí. Ficou tudo lindo, plantei verduras, hortaliças e mais uma vez, veio a água e me deu um tapa seguro, mas vi que sobrou a metade da casa. Percebi que não precisava muito para viver. Vou cobrir a cozinha, o quarto ficou parte do forro, pintar e ficar aqui. Preciso ir à luta, não posso me entregar. A vizinhança está me ajudando muito devido às limitações de saúde”.

Com um astral incomparável e carismático, Milton aprendeu de verdade o valor do ser humano, após a perda da esposa. “Não adianta reclamar, faça. Se trouxer um problema, traga a solução também mesmo que não seja acatada. Foi o que fiz na casa, não vou reclamar que perdi tudo, vou reconstruir. Uma pecinha de cada vez até terminar.

Na vizinhança, muitos perderam tudo. “Em 5 de setembro fui perdedor, agora, perdemos alguma coisinha, mas vamos reconstruir. A água vai baixar, a estrutura da casa vai levantar e a limpeza será feita. A perda humana não pode existir, tem que ser preservada”.

A busca por um novo lar

Milton não pretende voltar a morar no Carneiros. Está em busca de um novo local para se instalar onde possa plantar seus pés de alface, a salsinha e descansar. “Mas a caminhada continua. Não tenho condições financeiras, mas tenho a palavra para ajudar”.

Em suas redes sociais @presençasilva, seu Milton grava vídeos transmitindo energia positiva e fazendo valer cada dia de vida. Além disso, busca recursos para conseguir comprar uma nova moradia.

“Nessa enchente tivemos apenas perdas materiais. Isso não é nada, pois somos um povo forte. Quando se perde o bem material, a gente reconstrói. A pessoa humana a gente não reconstrói. Não tenha medo, não reclame, trabalhe e quando olhar para trás verás tudo que conseguiu fazer até aqui”.

Acompanhe a entrevista na íntegra

 

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