Tradição mantida entre as famílias cristãs, o presépio montado debaixo da árvore de Natal traduz o verdadeiro significado da data para os religiosos. Costume de gerações, a montagem envolve diferentes materiais e, na figura do nascimento de Cristo, significa a vida nova.
É assim que Heidi Collischonn Biehl, 62, vê o pequeno arranjo de personagens bíblicos que ela coleciona. Com 16 tipos diferentes de presépios, a professora de história aposentada montou uma exposição, que pode ser conferida no Sítio das Camélias, em Linha Boa Esperança, interior de Cruzeiro do Sul.
As peças ficam espalhadas pelos cômodos da casa dela, herança da família há quase 132 anos. Hoje, a estrutura vem sendo restaurada para receber hóspedes, mas sem perder as características originais do Enxaimel. A exposição fica aberta ao público até o dia 31, com agendamento pelo número (51) 99516-4424.
Incentivo na família
Heidi lembra que quando tinha cerca de 6 anos, a mãe ganhou um presépio, que ela ajudava a montar em cada Natal. Com seis filhos e os afazeres da casa, com o passar dos anos, a mãe incentivou Heidi, a filha mais velha, a se responsabilizar pelo presépio. “Aos poucos, fui assumindo e os meus irmãos ajudavam. Então essa paixão veio”.
O primeiro presépio próprio que ela teve foi de papel, com figuras recortadas. Depois, ganhou um conjunto de palha de milho que estragou com o tempo, até que a filha de uma prima, que é artesã, consertou e começou a fazer presépios também. A cada novo modelo criado por ela, um era presente para Heidi.
Outros presépios expostos são de fibra de bananeira, de bucha vegetal, de madeira, entre outros. Ainda, há um calendário de advento com a imagem do presépio, como uma tradição da Alemanha para contar os dias até o Natal. Além de presépios andinos e coroas de advento.
Antigamente, as crianças não ganhavam presentes, eles ganhavam um prato com aquelas bochas pintadas, com algum doce, e aí cada criança da casa tinha o seu prato”
Heidi Collischonn Biehl, professora aposentada
Ela também guardou itens da própria infância. “Antigamente, as crianças não ganhavam presentes, eles ganhavam um prato com aquelas bolachas pintadas, com algum doce, e aí cada criança da casa tinha o seu prato. Eu achei os seis pratos de papelão”, conta.
Para Heidi, mais do que um hobby e de uma expressão artística, os presépios colecionados são o verdadeiro significado do Natal. “Eu tenho uma fé muito grande, eu creio muito. Senti o poder de Deus em algumas ocasiões muito difíceis na minha vida”.
Memórias da infância
A religiosidade também está presente na casa de Ana Eunice Becker Petter, 62, que vê no presépio o maior sentido do Natal. As peças com as figuras bíblicas que ela monta hoje, junto ao pinheiro com galhos naturais, eram da mãe e estão há décadas na família.
Ana Eunice lembra que quando ela e os três irmãos eram crianças, a mãe esvaziava a sala para montar o presépio, no primeiro dia do Advento. “Ela ficava semanas antes colhendo musgos das pedras, plantas e galhos secos no chão. Ela colhia tudo nos potreiros e depois passava um dia montando. Era grande”, recorda.
Sem pisca-pisca na época, o que iluminava eram pequenas velas. Então, uma vez por semana, a família se reunia ao redor da montagem para rezar e cantar. “Eram ligadas só as luzes de velas, era bonito, uma vivência. Hoje em dia as pessoas vão perdendo esse costume”.
Ana Eunice herdou o presépio da mãe quando casou e os filhos dela cresceram com o mesmo conjunto de peças. Agora já é a vez dos netos. Para ela, além do simbolismo religioso, o presépio carrega memórias afetivas e a faz lembrar dos Natais que passou com os pais.
Hoje, ela tenta reproduzir os costumes da mãe. Só não faz as bolachas pintadas. Mas lembra de fazer biscoitos quando criança e colocar em uma lata em frente à casa. Durante a noite, os pais pintavam e devolviam ao pote, dizendo que o papai noel tinha passado por ali. Para Ana Eunice, a simplicidade é a maior virtude do Natal. “A manjedoura é nosso coração hoje, que a gente oferece para Jesus nascer e é para a gente refletir, será temos tudo, se não falta palha para o menino deitar”.
ENTREVISTA
Dom Aloísio Alberto Dilli, bispo da diocese de Santa Cruz do Sul
“Deus vem habitar entre nós e isso nos faz celebrar”
Como iniciou essa tradição de montar os presépios?
O presépio está completando 800 anos de história, exatamente nesse ano. O primeiro presépio foi realizado por São Francisco de Assis, num lugar da Itália chamado Greggio, é um lugar montanhoso onde tem uma rocha bem grande e uma gruta. Então no ano de 1223, São Francisco quis celebrar o Natal de uma forma parecida com a que aconteceu na gruta de Belém. Ele pede a um senhor chamado João para que arrumasse a gruta, trouxesse feno, manjedoura, um boi e um burro vivos. Homens e mulheres vêm de noite com tachas e iluminam o lugar. Ali se celebra a missa. A partir daquele presépio, novas oportunidades surgiram para fazer o presépio, e se tem sempre toda a criativa.
O que o Natal significa para as famílias?
São famílias que celebram o nascimento de Jesus Cristo e querem representar isso nas suas casas, para dizer ‘nós acolhemos esse menino de Belém, também queremos ser como Maria, José, os pastores, queremos participar desse mistério da vinda de Deus entre nós para ser nosso salvador’. Isso é muito bom e temos que recuperar cada vez mais o presépio. Algumas famílias esquecem e perdem o sentido cristão, mas quem tem o presépio tem esse sentido. Não tem sentido fazer a festa, os presentes, sem ter o motivo, que é o nascimento. Deus vem habitar entre nós e isso nos faz celebrar.