Nenhum plano de prevenção às cheias e desastres naturais vai funcionar a pleno se a população não compreender a importância da evacuação. É isso. A Defesa Civil e os demais órgãos de segurança pública não têm poderes suficientes para retirar à força os moradores de suas casas. Talvez até existam normas ou trechos de legislações que permitam tal ação. Mas uma coisa é o que está no papel timbrado e assinado por um agente público que vive dentro de um gabinete. E outra coisa bem diferente é a realidade nua e crua de quem está no front. No caso, os agentes da Defesa Civil, do Corpo de Bombeiros, e também os não menos corajosos voluntários que, ano após ano, se arriscam para salvar amigos, vizinhos e até mesmo desconhecidos. Quem está na ponta dessa complexa missão sabe a dificuldade de convencer uma pessoa a deixar a própria casa e se refugiar em um ginásio. Afinal, a evacuação costuma ser provocada muito antes da água chegar próxima à residência, em um momento de suposta tranquilidade. Portanto, é preciso trabalhar de forma intensa na construção de planos robustos de prevenção, mas a conscientização coletiva será a grande virada de chave. Sem essa consciência, o tabu persiste e nem o melhor dos planos evitará as mortes.
Uma enxurrada de descasos
A tragédia causada pela elevação dos níveis do Rio Taquari e seus afluentes causou dezenas de mortes, bilhões em prejuízos financeiros e estruturais, e vai deixar uma eterna cicatriz na alma e no coração dos moradores do Vale do Taquari. E mais. A segunda maior enchente da nossa história também desnudou o descaso do Estado com diversas instituições públicas. Escolas, promotorias, fóruns e outras sedes de serviços básicos à população ficaram submersos e sofreram com alguns danos e perdas irreparáveis. Mas eu gostaria de salientar as condições de trabalho das forças de segurança. Além da Delegacia Regional, em Lajeado, os prédios da Polícia Civil de Roca Sales e de Arroio do Meio também foram inundados e parcialmente destruídos. Assim como a sede do 40º Batalhão da Polícia Militar, em Estrela. E agora todos sabem dessa vergonhosa realidade.
Os vídeos e fotografias dessas estruturas inundadas são indigestas. Nas imagens, é possível verificar documentos, computadores e outros materiais oficiais de trabalho das corporações literalmente boiando nas águas sujas da enchente. As perdas são imensuráveis, reforço. É humilhante para a dignidade dos gaúchos verificar as condições de trabalho dessas instituições tão fundamentais para a segurança de todos. É um descaso criminoso por parte dos governantes e órgãos fiscalizadores. Não é admissível que, por tantos anos, as estruturas da Polícia Civil estejam instaladas em áreas de risco ou alagáveis. É vergonhoso. É deprimente. É o retrato de um Estado que, historicamente, negligenciou os necessários investimentos em melhores estruturas de trabalho e permitiu o sucateamento das forças policiais em detrimento às inúmeras superficialidades eleitoreiras.
Que a cheia histórica da semana passada sirva como um divisor de águas para tanto descaso e negligência. A sociedade gaúcha merece mais. E os servidores públicos também, é claro!
Tapa-buraco insuficiente
O Daer realizou, em julho passado, uma operação tapa-buracos na Rodovia Aleixo Rocha, a principal via de acesso para a cidade de Taquari. O serviço foi necessário diante do acúmulo de buracos gerados pelas fortes chuvas daquele período. Pois bem. Passados dois meses da conclusão daquelas “obras”, e diante de mais uma sequência de chuvas intensas sobre o frágil asfalto da estrada estadual, a buraqueira voltou. E, de acordo com as imagens captadas nas proximidades da Fazenda Girassol, a impressão é de que o serviço realizado em julho foi pra lá de insuficiente.
Tiro Curto
O “aluguel social” é a uma das principais apostas para mitigar os problemas habitacionais gerados pela enchente. Mas, e de acordo com os valores propostos pelos governos municipais, será preciso convencer muitos proprietários de imóveis a arcarem com eventuais prejuízos. E isso não é simples. Mas vamos torcer pela solidariedade e acreditar que tudo vai ocorrer de acordo com o esperado.
– Sirenes, alto-falantes, réguas em diversos pontos alagáveis da cidade são alguns dispositivos que os governos municipais precisam instalar de forma urgente nas áreas de maior risco. Não há desculpa para seguir negligenciando a funcionalidade dessas ferramentas. Chega de omissão.
– A próxima reunião-almoço da Acil de Lajeado – em parceria com a CIC/VT – receberá o Diretor de Relações Institucionais da AEGEA Saneamento, Fabiano Dallazen. Em debate, os desafios do saneamento básico. O evento ocorre no dia 26 de setembro.
– O Ministério Público do Rio Grande do Sul denunciou o ex-deputado federal Jean Wyllis por crime de injúria contra o governador Eduardo Leite. Na peça, a promotora de justiça Cláudia Lenz Rosa ressalta que Wyllis ofendeu a dignidade de Leite “em razão de sua orientação sexual”.
– Só o Hospital Bruno Born já registrou 94 atendimentos relacionados à enchente. Além dos casos iniciais, especialmente de hipotermia, foram muitas lesões geradas durante os serviços de limpeza, e muitos sintomas de mal-estar após contato com a água suja.
– A inflação nos preços de alguns produtos, registrada após os eventos climáticos da semana passada, será devidamente avaliada pelo Procon/RS. Aliás, já são diversas as denúncias e investigações em andamento. O “olho gordo” de uma infeliz minoria não vai passar em branco.
– Os prefeitos começam a anunciar diversos planos de recuperação. São milhões a serem injetados na economia local, sem contar os bilhões anunciados pelos governos estadual e federal. É um alento e tanto para quem, a poucos dias atrás, não enxergava qualquer luz no fim do túnel. Desde que os recursos efetivamente cheguem até as pontas mais vulneráveis. Caso contrário…