A maior tragédia natural da história do Rio Grande do Sul deixou um rastro de destruição no Vale do Taquari. Foram milhares de famílias impactadas, 48 mortes e bilhões em prejuízos econômicos. A reconstrução nas cidades começa a sair do papel, mas exigirá resiliência e também uma vigilância constante sobre o que fora prometido por autoridades.
Imagens aéreas feitas pelo jornalista Fábio Kuhn, da página 365 vezes no vale, apontam que a recuperação dos municípios não será tão simples. Sobretudo naqueles onde a força do Rio Taquari devastou áreas urbanas quase que em sua totalidade, como é o caso de Muçum e Roca Sales, ambos na parte alta da região.
Mas cidades como Arroio do Meio, Bom Retiro do Sul, Colinas, Cruzeiro do Sul, Encantado, Estrela e Lajeado, Taquari e Venâncio Aires também terão uma tarefa árdua pela frente. Residências, prédios públicos, comércios, empresas, estradas e pontes foram danificados ou levados pelas águas.
Além da reconstrução, também se faz necessária a elaboração de um plano de prevenção contra enchentes mais abrangente e eficiente. A cheia histórica deste mês expôs uma série de falhas no sistema de monitoramento. No auge da situação mais crítica, a região ficou sem as informações necessárias sobre a medição do rio.
“Evoluímos pouco”
Professor do Departamento de Hidromecânica e Hidrologia da UFRGS e doutor em recursos hídricos e saneamento ambiental, Walter Collischonn avalia que a região pouco avançou em relação à enchente de 2020, quando o nível do Rio Taquari chegou a 27,39 metros. Em entrevista ao programa Frente e Verso dessa sexta-feira, 15, pontua que a criação de um Sala de Situação foi uma das principais medidas tomadas desde aquele episódio.
“Só que as previsões tem sido baseadas em previsões meteorológicas. Isso deve ser feito com antecedência de alguns dias, para que possa ser emitido um sinal de atenção, um pré-alerta. Que é quando algum evento potencialmente perigoso está a caminho. Mas é necessário um monitoramento para permitir a elaboração de previsões baseadas em dados medidos”, frisa.
Collischonn entende que, desde o primeiro momento, era possível constatar que a cheia atingiria níveis históricos. “Apresentava sinais de que seria um evento extraordinário com antecedência. Utilizamos Serafina Corrêa como exemplo. Às 17h de segunda-feira (dia 4) já havia chovido algo em torno de 280 milímetros em 24 horas. Tanta chuva em um curto tempo resulta numa cheia grande”.
O especialista lembra que o Serviço Geológico do Brasil (CPRM) utiliza apenas dados medidos pela companhia e que, em momentos cruciais, não funcionou. “Tem que garantir que essas estações tenham confiabilidade muito alta e consigam medir corretamente”.
Soluções imediatas
Para Collischonn, é preciso evoluir com um mapeamento mais preciso em todas as bacias hidrográficas do RS com potencial perigo de inundação, não apenas na Bacia do Taquari/Antas. Cita que é um trabalho que deve ser feito numa escala estadual ou regional para que não fique sob responsabilidade apenas dos municípios.
“Uma coisa é saber o nível de água. Outra coisa é saber: minha casa vai ser inundada? Isso deveria aparecer com maior rapidez, de uma forma mais transparente. E essas pessoas precisam saber o que fazer numa iminência de inundação”, observa.
Outro ponto é a melhoria na capacidade de previsão e alerta, com uma comunicação mais efetiva com a sociedade para as respostas. “É preciso ampliar o sistema de monitoramento com instrumentos confiáveis. Seja o CPRM ou outro órgão. Precisa de técnicos qualificados, instrumentos para fazer essa medição, equipes que possam fazer a substituição de equipamentos nos diferentes locais, de forma extremamente rápida e eficaz”.