Um rio em Fúria

Opinião

Fernando Weiss

Fernando Weiss

Diretor editorial e de produtos

Coluna aborda política e cotidiano sob um olhar crítico e abrangente

Um rio em Fúria

Era perto das 20h de segunda-feira, dia 4 de agosto, quando Diogo Fedrizzi informava pelos microfones da rádio A Hora de que o rio Taquari subia incríveis três metros por hora em Santa Tereza. Me bateu um medo. Uma sensação muito ruim. Meu medo aumentou uma hora depois, quando o mesmo Diogo dizia que em Muçum e Encantado o mesmo rio crescia dois metros por hora.

Àquela altura, a gente já assistia cenas de devastação nas cidades das cabeceiras do Rio Taquari. Pontes históricas em Nova Roma do Sul, em Passo Fundo e Veranópolis desabando em imagens que pareciam filmes de ficção. Mas só pareciam. Eram tão verdadeiras que só prenunciaram a tragédia que 48 horas depois estaria nos maiores jornais do Brasil e do mundo, anunciada como maior catástrofe natural da história gaúcha.

Estávamos, portanto, diante de um rio em fúria. Impotentes, perplexos e, por fim, destruídos. A temida cota de 29 metros fora alcançada – e superada – mais uma vez, 82 anos depois. Quem imaginaria. De setembro a setembro, Muçum e Roca Sales nunca mais serão as mesmas depois de 2023. Uma devastação que impacta o mundo e provoca uma reação comovente de solidariedade.

Mas não é só a destruição. Tem as mortes. Muitas mortes. Famílias que se aniquilam com as cidades. Já são perto de 30 óbitos confirmados na região (maioria em Roca e Muçum), além das centenas e centenas de pessoas que seguem desaparecidas e devem fazer o número de mortes aumentar, infelizmente.

Foi uma enchente tão impressionante, diferente e agressiva, que provocou um efeito cascata. Destruiu Muçum e Roca Sales. Inundou Encantado, Arroio do Meio, Colinas, Estrela, Lajeado, Cruzeiro do Sul e foi indo. Avançou para Bom Retiro do Sul e Taquari até deixar o distrito de Mariante em Venâncio Aires quase submerso.

Na quarta-feira pela manhã, quando Muçum e Roca Sales acordavam em meio aos escombros, Mariante corria contra o tempo para retirar as pessoas de cima dos telhados.

Todos estamos perplexos. Atônitos. Mexidos e tristes. Meio tontos. Sofremos com cada morte e choramos com cada manifestação de dor e desespero. E quanto desespero.

É hora de reagir. E agir. As comoventes iniciativas de solidariedade que se espalham região e Brasil afora servem para devolver o básico para quem perdeu quase tudo, mas ficou com o essencial: a vida. A reconstrução das nossas cidades será árdua e cansativa. Muçum e Roca Sales terão de renascer dos escombros e buscar forças onde não parecem existir. Mas existem. E não faltará ajuda. Nas demais cidades, as águas baixam e a vida, cedo ou tarde, voltará ao seu prumo, ainda que essa enchente tenha deixado rastros inéditos de destruição.

A mesma região que se abria para o mundo a partir do turismo, hoje chora com cartões postais aniquilados. A belíssima ponte Brochado da Rocha, em Muçum, que o diga. O abalo é imenso, mas só não é maior do que a solidariedade que emana da região, é comovente ver as filas e mais filas de pessoas dispostos a doar mantimentos ou emprestar força de trabalho.

Não resta dúvidas que sairemos mais fortes deste episódio. E, como na vida nada é por acaso, que possamos tirar as lições e aprendizados necessários disso tudo que aconteceu, para, logo depois, atrair os olhares do mundo pelo nosso vigor econômico e desenvolvimentista. Só chegaremos lá com trabalho. Muito trabalho.
E as mortes? Bem, são a única coisa que não conseguiremos reconstruir. Nos resta estender a mão aos familiares, alcançar o ombro para chorar e torcer para que a agonia pelos centenas de desaparecidos possa terminar logo, com o melhor dos desfechos. #SOSValedoTaquari.

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